entranço de vice-versa
Artigos, ensaios, pesquisas de interesse geral - política, cultura, sociedade, economia, filosofia, epistemologia - que merecem registro
domingo, 9 de março de 2025
CARTEIS
Há quase 50 ANOS, kurt Mirov, um suíço que vveu no Brasil e depois se fez eleger deputado em seu país, escreveu o clássico "A Ditadura dos Cartéis - Anatomia de um Subdesenvolvimento" (1978), a proposito do que vivenciou como empresário nestas terras. Desde então, se soube que a ditadura dos carteis só fez piorar, e muito, no Brasil, país cuja economia é controlada quase inteiramente por carteis em setores-chave da economia doméstica e nas exportações de produtos primários de caráter estratégico: alimentos, minérios e serviços de geração e distribuição de energia hidrelétrica e, agora, geração de energia verde, eólica e solar. Na contracorrente do que estão a fazer países da África, que se libertam do jugo neocolonial, o Brasil intensifica a sua dependência do antigo jugo COLONIAL, mediante, principalmente, as parcerias PPPs (parceiras público-privadas) apoiadas e em parte FINANCIADAS com dinheiro público via BNDES. Nivaldo Manzano
sábado, 8 de março de 2025
POR QUE A ÁFRICA ESTÁ FORA DO RADAR DO EXCEPCIONALISMO PLANETÁRIO DE DONALD TRUMP (EUA)?
Em uma retomada inexorável da ACUMULAÇÃO DO CAPITAL, na atualização do conceito de Marx por Rosa de Luxemburgo (1871-1919) - processo recorrente que foge à queda tendencial na taxa de lucro mediante fuga para a frente com a apropriação de mais recursos -Trump, em poucos dias, anunciou o que resta do Planeta a ser apropriado pelos EUA - Groenlândia, Canal do Panamá, Golfo do México, Lítio (Argentina, Bolívia e Chile), Palestina, Amazônia (países amazônicos, incluído Brasil de Lula e governos anteriores). Trump não menciona a Europa e a África. A Europa, sem mais recursos a explorar, nada significa praticamente; e a África, por saber que o Continente é o OUTRO DO OUTRO. O Outro, na visão de Trump, é a China, que precisaria ser eliminada do caminho da acumulação do Capital, e o OUTRO DO OUTRO é, como a mulher negra, o outro de sua discriminação, a mulher branca, ou seja, o outro DEPOIS DA CHINA. E como se deve eliminar o inimigo principal por vez, a África ficaria para depois. Eis por que deve ser mantida na penumbra, longe da visão imediata do mapa geopolítico e geoeconômico: a África, associada ao Brics (o Sul-Global) é a resposta definitiva às ambições inexoráveis da acumulação do Capital, ASSIM COMO encenada na atualidade por Trump. A seguir um apanhado do que é a África, colhido em sítios do youtube:
Ao contrário do que ocorre no resto do mundo, a população da África cresce exponencialmente. Esse gigantesco Continente, o terceiro em área territorial, com 30,330 milhões de km2, supera a Rússia (17, mi ki2), Europa (10,53 mi km2) e Estados Unidos (9,8 mi km2). O Continente Africano perde em área total apenas para a Ásia (44,58 mi km2) e Américas (42,50 mi km2).
As projeções indicam que a população da região vai dobrar até 2050, chegando a 2,5 bilhões de pessoas. Na prática, isso significa que em menos de 30 anos um quarto da humanidade poderia ser potencialmente africana.
O crescimento populacional da África ocorre duas vezes mais rápido que o do sul da Ásia e quase três vezes mais do que o da América Latina. O que impulsiona esse crescimento é uma característica peculiar dessa região: na maioria dos países africanos, pelo menos 70% dos habitantes têm menos de 30 anos. Isso contrasta fortemente com a situação no resto do mundo, onde a população envelhece rapidamente. A Europa precisaria repor a sua queda de natalidade com 2 milhões de imigrantes. América Latina e Caribe registram "o envelhecimento populacional mais célere do mundo".
A explosão demográfica da África levou a ONU a concluir que o Continente "vai desempenhar um papel CENTRAL na formação do tamanho e distribuição da população mundial nas próximas décadas"
É fácil entender a correlação positiva estreita entre população e desenvolvimento econômico e social, ao se olhar para a atualidade da China e da Índia. Nivaldo Manzano
sexta-feira, 7 de março de 2025
GUERRA CULTURAL
GUERRA CULTURAL
TEXTO DE Ivanisa Teitelroit Martins
que analisa em profundidade inédita a realidade que vivemos.
“As lógicas discursivas e a guerra cultural
vivo daquilo que o outro não sabe sobre mim. (Peter Handke, Nobel da literatura em 2019), vivo daquilo que nem eu mesmo sei de mim.
A cultura não é um elemento acessório na luta e nos conflitos políticos; ela é o campo onde se constroem as bases da hegemonia. Quem controla a cultura não apenas domina narrativas, mas define os limites do possível, orienta valores e molda a percepção da realidade. Enfrentar a guerra cultural, portanto, exige mais do que reação ou denúncia: é necessário um esforço estratégico e de longo prazo que trate a cultura como o principal território de disputa política. Apenas ao disputar a cultura de forma propositiva e estruturada será possível reverter a hegemonia conservadora e resgatar a capacidade de a cultura funcionar como uma ferramenta crítica, capaz de ampliar os horizontes do debate público e transformar a sociedade.
A guerra cultural não é um desvio da política real, mas uma de suas formas mais sofisticadas de disputa pelo poder. Ela opera no longo prazo, reconfigurando percepções, deslocando termos do debate público e redefinindo o que é socialmente aceitável ou inaceitável. Enquanto a direita utilizou esse mecanismo para consolidar sua influência, a esquerda demorou a reconhecer a cultura como um território central na luta política.
O resultado é um cenário onde o debate público foi capturado por discursos que naturalizam desigualdades, reforçam hierarquias e deslegitimam o pensamento crítico. A guerra cultural não se limita ao enfrentamento direto de ideias políticas; ela transforma valores e comportamentos em campos de batalha permanentes, onde o que está em disputa não é apenas a argumentação, mas os próprios limites do que pode ser imaginado, dito e aceito na sociedade.
Com isso, a política cede à administração de necessidades sociais que não podem modificar o quadro das relações socioeconômicas já existentes e que continuam perseverando.
O hipercapitalismo dissolve a existência humana em uma rede de relações comerciais. Hoje não há mais domínio da vida que não se despoje de um aproveitamento comercial. O hipercapitalismo faz com que todas as relações humanas se tornem relações comerciais. Toma da pessoa sua dignidade e a substitui por valor de mercado. Vivemos em uma sociedade orientada completamente pela produção, pela positividade. Ela suprime a negatividade do outro, do estrangeiro, para acelerar a circulação de produção e de consumo. O que se permite são apenas as diferenças consumíveis. O outro, a quem foi retirada a alteridade, não se pode amar, apenas consumir.
Na hipercomunicação digital tudo se mistura com tudo. Os limites entre o interno e o externo se tornaram cada vez mais permeáveis. Pessoas tornam-se interfaces de um mundo totalmente conectado. Essa desproteção digital é estimulada e explorada por um excesso do discurso do capital.
Um grau maior de informação não cria, sozinho, uma renovação ou modificação sistêmica. A busca pela transparência da “verdade digital” desencadeou um exercício de exame permanente entre o que é verdadeiro e o que é falso. A chamada “verdade digital” constantemente manipulada é um fator que estabiliza o sistema conservador ao invés de questioná-lo. Falta à transparência a negatividade que coloca em questão o sistema político-econômico preexistente, o status quo.
A sociedade da transparência é uma sociedade do positivo. Há transparência quando as coisas ficam transparentes quando se despojam de toda e qualquer negatividade, quando se tornam lisas, niveladas, quando se inserem sem resistência na corrente lisa do capital, da comunicação e da informação. As ações se tornam transparentes quando se subordinam ao processo contável, governável e controlável. As coisas se tornam transparentes quando perdem suas particularidades e se expressam apenas por seu preço. As imagens se tornam transparentes ao se alijarem de toda e qualquer profundidade hermenêutica chegando à perda de sentido.
Há uma fenda aberta no eu que impede que o sistema psíquico concorde e coincida consigo mesmo. Essa fenda se situa no lugar da não transparência e faz com que a transparência do eu seja impossível. Também entre as pessoas há uma fenda aberta. O isso que fica oculto ao eu passa pela fenda psíquica. A iluminação total, a transparência total leva a um tipo de esgotamento do sujeito. O ser humano precisa de esferas em que possa estar em si mesmo sem se preocupar com a opinião dos outros. Apenas a máquina é inteiramente transparente. O psiquismo não é uma máquina. A interioridade, a espontaneidade e a capacidade de gerar acontecimentos são opostas à transparência. O outro é que me questiona, que me arranca de minha interioridade narcísica. Temos a capacidade de ver o outro em sua alteridade se não estivermos inundados pela nossa intimidade. Por outro lado devemos preservar nossa intimidade da sociedade da transparência.
Temos que lidar hoje com uma técnica do poder, o poder smart, que não nega ou oprime nossa liberdade, mas que a esgota. É nisso que consiste a crise atual da liberdade. A avaliação algorítmica de uma pessoa contradiz a ideia da dignidade humana. Nenhuma pessoa deveria ser degradada a um objeto de avaliação. Por outro lado, se forem mantidos mistérios, segredos, estranheza ou outridade serão criados obstáculos que venham a subverter uma comunicação ilimitada, uma hipercomunicação, seus excessos e seus efeitos sobre o sujeito.
A cultura institui o sujeito como humano. Sem o aparato do campo social o sujeito não sobrevive. O sujeito é constituído a partir do campo da linguagem, do simbólico. O sujeito só́ é possível porque entra na ordem social. A constituição do sujeito está atrelada ao campo social o que é uma condição para sua existência.
Para Dessal, psicanalista argentino, o indivíduo pós-moderno é aquele que se vê obrigado a buscar soluções biográficas para problemas sistêmicos. O recurso à biografia torna-se insuficiente diante de uma lógica e de um discurso que hegemonizam uma cultura no contexto nacional e que se mostra em franca expansão no contexto internacional. O recurso à biografia se torna paliativo, sem conseguir se opor à força e a penetração do discurso do capital através da hipercomunicação, tendo como força paradoxalmente solidária o que há de mais temível e que nos espreita dentro de nós mesmos, a pulsão de morte.
Giorgio Agamben, filósofo italiano, ao longo dos anos, adverte que o estado de exceção tende cada vez mais a se tornar o paradigma predominante dos governos na política contemporânea.
Para Bauman que retoma os escritos de Freud o domínio da massa por uma minoria como a imposição coercitiva do trabalho cultural tem sido adotada pela tecnologia cumprindo o papel de neutralizar e anular o pensamento crítico.
Aparelha-se pela coação por transparência que não é um imperativo ético ou político, mas econômico. A superexposição de uma pessoa maximiza a eficiência econômica. Big Data sugere e induz um conhecimento absoluto. Na realidade coincide com o não saber absoluto. É impossível se orientar no Big Data. Uma falha na comunicação nos parece insuportável. Manifesta um vazio que deve ser contornado que compele à compulsividade por mais comunicação, mais informação.
Para a psicanálise, se isso tem efeito sobre o sujeito é devido a não admissão da falta em que o contorno somente poderá ser bordeado pela palavra singular de cada um, permitindo que se retome o pensamento crítico de um a um e coletivamente. A política enquanto esfera da coletividade e da democracia deve recuperar os princípios da solidariedade, justiça e dignidade humana e repelir a hegemonia do capital.
Para Michael Foessel, filósofo francês, a história nos convida a superar os atalhos político-midiáticos que opõem, por exemplo, o liberalismo e o fascismo. A história nos convida a uma leitura mais acurada de nossa época, frequentemente deformada por slogans. A história nos estimula a prestar atenção às diferentes lógicas discursivas.
Deste ponto de vista a força da extrema-direita traduz a gramática da insegurança cultural que causa sofrimentos cuja origem é econômica e social. É urgente repolitizar a questão da extrema-direita no momento em que esta se beneficia ao máximo da ilusão de despolitização característica de uma época supostamente pós-ideológica. No momento em que um sentimento se torna ressentimento coletivo contra estrangeiros e enquanto política de governo americana. O efeito é o surgimento de uma hostilidade crescente a qualquer alteridade.
É importante ter ciência de que a extrema-direita dispõe de um corpo coerente de referências que se baseiam em um imaginário voltado para a desigualdade. A penetração do discurso da extrema-direita no espaço público intelectual e midiático se deve a um certo estágio de nossas economias, mas também a uma infraestrutura material que se apoia em novas tecnologias e no esquecimento da história.
É urgente reconhecer a técnica e a lógica do discurso da extrema-direita, analisar sua base ideológica para repolitizar o discurso, recuperar o protagonismo em defesa da estabilidade e do fortalecimento da democracia, voltar a reconhecer a origem da desigualdade socioeconômica e desenvolver políticas públicas que se voltem à igualdade e à equanimidade. Além de criar condições a todo e qualquer sujeito de viver a alteridade e a diferença no enlaçamento amoroso social contrário à pulsão de morte que inadvertidamente pode se associar à ilusão do discurso do capital, à compulsão à hipercomunicação e ao imperativo econômico da transparência absoluta.”
Ivanisa Teitelroit Martins em
17 de fevereiro de 2025
quinta-feira, 6 de março de 2025
Fernando Pessoa o guardador de rebanhos
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Creio no Mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar...
“O Guardador de Rebanhos”, de 08/03/1914, In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa.
DA COISA E DO PROCESSO
DA COISA E DO PROCESSO
Alvin Toffler (1928 - 2016) , estadunidense, escritor e doutor em letras e ciência, de pendores futuristas, maravilhava-se ante o progresso das ciências, cada vez mais analítica na dissecação da realidade em partes cada vez menores. Ao que a opinião contrária vê nisso um retrocesso, ao impulsionar a tendência da pesquisa científica a saber cada vez mais de cada vez menos. Essa visão de mundo de dividir a realidade em partes de um todo que não se estuda, na observação do Prêmio Nobel de Fisiologia, o francês François Jacob, opõe-se frontalmente à sabedoria da Grécia Clássica (e também da sabedoria oriental), que começa pelo todo, a partir do qual estudam-se os seus desdobramentos, não em partes estanques, mas na sua CONTINUIDADE e na sua DESCONTINUIDADE, ao mesmo tempo. É nesse curto circuito da lógica binária do sim x não, do certo x errado que os gregos antigos enxergavam o DEVIR do Cosmos. Ou seja, há uma continuidade descontínua nas manifestações do Cosmos, dos Titãs aos deuses do Olimpo, destes às divindades menores, aos semideuses, aos heróis míticos, aos homens, aos animais, às plantas e às pedras. De acordo com a mitologia grega, tais manifestações engendram-se umas às outras num ciclo recorrente do nascer e do perecer, assim como ocorre na metamorfose dos insetos de ciclo completo, o da borboleta, por exemplo. Da mitologia os gregos retiraram a inspiração de sua filosofia, segundo o historiador francês Jean-Pièrre Vernant, dentre outros. Tem-se, então, do lado dos gregos o PROCESSO e do lado de Alvin Toffler a COISA, na modernidade dos modelos usuais de pesquisa científica. Entendam-se como "coisa" também os conceitos, coisas mentais, abstrações, que se caracterizam por suas DELIMITAÇÕES distintivas, ao passo que o PROCESSO, sem começo nem fim, não se delimita em segmentos, reais ou conceituais. Assim, por exemplo, a criança, que não é uma coisa, não é divisível na sua transição para a adolescência, à diferença de um queijo, divisível em pedaços. É verdade que a arte macabra que tornou célebre Jack Estripador, o bandido londrino que esquartejava as suas vítimas, ao tratá-las como coisa, perde força nos modelos da pesquisa científica, cada vez mais inclinados a tratar a realidade como processo, ou seja, partindo da consideração do todo. Ao entrar em contato, por leitura, com um novo autor por mim desconhecido, intento saber, em primeiro lugar, como ele trata a realidade, se coisa ou se processo. Identifico, assim, um número pequeno, porém, crescente, de autores voltados à ideia de processo, mais consentânea com o modo como experimento minha existência, um desenrolar de mim mesmo rumo à incompletude, graças à qual entrevejo possibilidades de caráter exponencial de permanecer como sou, diferentemente, ao escandir as modalidades lúdicas de papeis que venha a desempenhar. COISA é com Alvin Toffler e seus amigos da dissecação anatômica da existência. Tudo isso para dizer que me é difícil compartilhar do entusiasmo avassalador pela Inteligência Artificial, uma COISA tecnológica, que assusta mais do que empolga. A IA capta fragmentos de minhas manifestações nas redes informáticas e me devolve na forma de um todo vicário, ajambrado estatisticamente, que pretende me convencer de que sou eu, convertido em COISA. Não seria esse o sentido profético da metáfora da barata em Kafka, ou em Clarice Linspector? Nivaldo Manzano
quarta-feira, 5 de março de 2025
TEMPO ZERO
QUIPROCÓ A PROPÓSITO DO TEMPO ZERO
Em uma postagem no facebook fui chamado à atenção por não precisar o tempo (a data, a época) em que ocorreu o fato. Assim procedi deliberadamente em consonância com o propósito que tinha em vista e, ao que parece, não me fiz entender. Desencadeou-se a partir daí um debate com o interlocutor, pois o que eu tinha em vista implicava associar dois eventos, distantes entre si no tempo LINEAR (tempo do relógio),é verdade, mas com outro intento. Eu me referia à MUDANÇA DE UM CONTEXTO PARA OUTRO CONTEXTO, correspondente aos dois eventos, mudança contextual que não implica DURAÇÃO, Por isso, por convenção, chama-se TEMPO ZERO, noção corrente na engenharia de software, retirada da VISÃO DE PROCESSO, OU CONTEXTUAL, que contrasta com a visão LINEAR da geodésia do tempo, que é o estudo da rotação da Terra, rotação que fundamenta a convenção cultural da medida do tempo linear pelo relógio.///
Há várias noções de tempo, e a disciplina que cuida disso é a ANTROPOLOGIA CULTURAL, que é o estudo da diversidade entre as culturas, e o tempo tem aí o seu papel de caráter DIFERENCIAL. Deixo de lado as várias noções culturais do tempo, para ir direto ao ponto: o TEMPO ZERO. Apenas menciono dois marcos na coleção cultural dos tempos: o tempo da teoria da relatividade de Einstein, que rompe com a visão clássica de um tempo único em todos os lugares; e o tempo do filósofo francês Henry Bergson, que propõe a existência de um tempo único mediante a ideia de DURAÇÃO, num sentido anti-einsteiniano. Tempo zero não tem duração, tampouco é único, embora também não seja diverso. TEMPO ZERO é tempo nenhum e isso não é um paradoxo.///
Para um indígena que jamais tenha sabido da existência de uma arma de fogo, ao vê-la em operação, irá associar por analogia a arma de fogo ao seu arco e flecha. Dar-se conta disso não implica transcurso de tempo algum. Do mesmo modo, praticamos o tempo zero no computador quando, ao toque de um dedo, mudamos de um aplicativo para outro, de um sistema operacional para outro etc. Por que outro? Porque cada aplicativo tem a sua sintaxe, ou seja, os seus componentes e as suas regras de operação, assim como o jogo de xadrez difere do jogo de damas: nesse caso, muda-se o tabuleiro, mudam-se as pedras e as regras que estabelecem o modo como cada uma pode deslocar-se frente às outras. Não transcorre tempo linear algum quando me vem a ideia de mudar do contexto da sala de visita para o contexto do quarto de dormir, ao improvisar o sofá como cama, para um cochilo. O sal é branco no contexto do olhar; amargo no contexto do paladar e cristal no contexto do tato. Isso é dizer que os OBJETOS, os EVENTOS, os FATOS mudam de contexto de acordo com a REFERÊNCIA assumida por mim. E ainda: posso reutilizar soluções anteriores, eventos anteriores, fatos anteriores, retidos na memória, que passam a ser escandidos sob novas referências, um novo contexto. Ou seja, TEMPO ZERO é o TEMPO DA MUDANÇA DE UM CONTEXTO PARA OUTRO CONETEXTO. Nivaldo Manzano
Agronegócio e china
ATÉ QUANDO VAI DURAR A BONANÇA DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL?
Um mil toneladas de produção de alimentos por habitante/ano. Essa é a convenção - e toda convenção é fungível - estabelecida por especialistas em segurança alimentar nos anos 1950. A China, segundo informa a Reuters (05.02.2025), elevou a sua previsão de produção para este ano para 700 milhões de toneladas métricas e anuncia a sua meta de elevar a sua produção de 50 milhões toneladas/ano. Isso significa dobrar em QUINZE ANOS o montante da produção prevista para 2025. Caso não ocorram obstáculos climáticos ou de outra natureza, a autossuficiência alimnentar visada pela China deverá ser alcançada dentro de 15 anos, quando, então, hipoteticamente, deverá não mais depender da importação de alimentos. A China tem como meta recuperar 6,7 milhões de hectares de áreas desérticas com pastagens e florestas, até 2025. O objetivo está dentro 14º Plano Quinquenal, que começou em 2021 e termina em 2025. O país tem a maior área desertificada do mundo, com 2,5737 milhões de km2 (quase 1/3 de seu território) e 1,6878 milhão de km2 de áreas de solo arenoso, segundo dados de 2019 da Administração Nacional de Florestas e Pastagens. /// A propósito, Burkina Faso, país da África Ocidental, que acaba de se livrar de meio século sob jugo neocolonial francês, anunciou hoje (05.03.2025) o lançamento de seu novo projeto de produção irrigada de 2 mil hectares, que se incorporam a áreas já em produção de arroz e frutos como tomate (50 t/dia de massa de tomate) e a criação de peixes no sistema tanque-rede (flutuante), com previsão de produção de 300 mil toneladas/ano, ou 830 toneladas/dia. Outros países da África Ocidental, como Mali e Niger, igualmente libertos do jugo francês, propõem-se a realizar projetos semelhantes, todos eles com vistas à autossuficiência alimentar em curto prazo (cinco/dez anos). Dinheiro AGORA não falta: são países ricos em minérios estratégicos, como ouro e urânio, atualmente sob controle nacional e é de sua exportação que obtêm divisas para aquisição de tecnologia. Burkina Faso produz 150 toneladas de ouro por ano e deverá concluir em 12 meses o projeto de sua refinaria./// O neocolonalismo francês deixou como herança nos países que explorou os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Continente. Uma revolução social associada a movimentos de libertação nacional agita uma vintena de países da África, uma revolução ignorada pela imprensa corporativa ocidental. Em iniciativa pioneira no Ocidente, pelo menos DEZ países africanos proíbem a exportação de matérias-primas vegetais e minerais em estado bruto, obrigando à sua agregação de valor in loco, diferentemente do que faz o Brasil, ainda preso ao esquema colonial. Nivaldo Manzano
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