Artigos, ensaios, pesquisas de interesse geral - política, cultura, sociedade, economia, filosofia, epistemologia - que merecem registro
segunda-feira, 16 de setembro de 2024
Aristóteles comunidade sobre bbb
https://www.academia.edu/39195685/Aristotles_Conception_of_community?email_work_card=thumbnail
All state is a community of some kind, that is every state is a different communal society that
comes together though with different background, foundations, basis but with a common goal.
All community is founded and established with a view to some good, which means that their
focus and pertinent goal is aim at some end and this end centres on some good, reason being that
human beings are generally structured to aim at what is good, good in this context is however
wide. It is in the nature of every human being to aim at what is good because it will not serve
their interest to aim at what is bad. As a political animal, human beings tends to be politically
conscious and egoistic in nature, although there are some people that derives their goodness in
bad things, for example, a masochist (a person that derives pleasure from pain).
Good can be classified into categories as there are highest good. The state or political community
aims at good in a greater degree than any other, and at the highest good. The state or political
community is the highest good on the basis that every human being is a product of a political
community or state and as such they do not exist in isolation. Every good that will be aim at by
an individual in the political community will be affected by the totality and the superiority of
right of the state over the individual that lives within the state. The peak of the good that can be
attained will be the good of the community. For example, a person that shows interest in
becoming the governor of a state aim at some good but for this good to become a reality, he must
work hand-in-hand with the state or the political community. In other words, the good of the
community supersedes an individual good, which makes it possible for the good of the political
community or the state to be the highest good. The difference between individual good and the
community good is wide because a master that rules over a few is different from a master that
rules over more and also different from a manager of a household that rules over a larger number.
This difference is wide and pronounced because a great household is different from a small state.
However, the structure and the element of the state will determine the type of rule. For example,
a monarchical state is different from a federal state, while a presidential state is different from an
egalitarian state. Nevertheless, the wide gap and difference still centres on the good that they aim
to achieve.
The ways in which we view things that leads to clarity of purpose and reality is quite different.
Coming together of two opposing views could lead to a union. Mating of male and female
animals that b rings about offspring, a desire of both sexes though it is not always a deliberate
purpose, but with exposure and interactions with other animals within and outside their domains.
Nature really plays a role in what we see or foresee, it is the nature that gives us what our mind
picture to us and also by nature our body interprets it. By nature we could differentiate between a
master and a slave, though they have the same interest. A master and a slave still remain a person
as it does not lead to subordination, degradation or defamation of character as both are not less
person.
However, among Barbarians there is no distinction between a woman and a slave as nature does
not play major role amongst them. Whether slave or master, there should be what we call a
family, it is when a couple comes together as a family that it leads to birth of different species,
because if there is no birth to new babies there cannot be a slave or a master. (Like a Yoruba
adage that says that, there is no category in giving birth, the way a slave is born is also the way a
master is born).
Different association of families is what leads to a village, what they will be craving for will be
more than mere supply of daily needs; the first society that will be formed will be the village. It is
when this village is formed with different families that a ruler will be chosen. For example, in the
pre- colonial Igbo community, the elders played a prominent role in ruling and governing the
community
Circunstância Ortega y Gasset sobre
https://periodicos.ufsc.br/index.php/revistacfh/article/view/2178-4582.2009v43n2p331/12438
A noção de circunstância é essencial para o entendimento da ontologiaorteguiana e para perceber as diferenças em relação a filósofos importantes doseu tempo como Martin Heidegger e Edmund Husserl. Neste trabalho vamosexaminar o conceito de circunstância desenvolvido nos oito livros de El es-pectador (vol. II das Obras completas, 1998). Os ensaios reunidos em Elespectador foram publicados entre 1916 e 1934, eles fazem parte da transiçãopara a fase madura da meditação orteguiana. O texto tem o caráter de obraíntima de reflexão pessoal sobre diversos assuntos.O conceito circunstância foi amadurecido e ampliado nos ensaios de Elespectador. Ele aparece pela primeira vez na introdução de Meditações doQuixote (1914). Naquele livro o conceito representa o entorno do corpo, coe-rente com a descoberta da ciência biológica que no seu tempo estuda o orga-nismo num meio particular. Desde que publicou as Meditações do QuixoteOrtega y Gasset entende circunstância como parte da realidade pessoal. Noslivros de El espectador amadurece o conceito de circunstância que usará nosúltimos trabalhos das décadas de quarenta e cinquenta. A mudança significa aampliação do sentido para além das sugestões da Biologia. O conceito alargadonos livros de El espectador inclui o entorno ao eu, isto é, o meio exterior e ascaracterísticas do organismo: tanto físicas quanto psicológicas que envolvem oeu. Circunstância passa a ser tudo o que rodeia o eu: a realidade cósmica, acorporalidade, a vida psíquica, a cultura em que se vive, nela incluída tambémas experiências acumuladas no tempo3. Ortega y Gasset denominará habita-ção a circunstância que o eu reconhece como seu ambiente familiar. EdmundHusserl já denominara Uexküll a este entorno reconhecido pelo eu, mas parao alemão o entorno tinha um caráter restrito ao temporal. Apesar de próximodo proposto por Husserl, o conceito orteguiano é mais amplo.O núcleo da metafísica orteguianaÉ importante entender o que significa circunstância para se chegar aoobjeto central da filosofia orteguiana: a vida. A vida é única e não se confundecom circunstância, pois ela não é pura recepção do que se passa em volta doeu, explica Ortega y Gasset em Temas de viaje (1922). A vida é o que cadapessoa faz com a circunstância como já comentamos (CARVALHO, 2002, p. 71)
“[...] mesmo que fossem iguais os elementos da habitação, não seriam iguais asvidas de dois gêmeos univitelinos que vivessem juntos no mesmo local”. Ditode outro modo, vida é realidade radical que aproxima eu e circunstância.A conhecida passagem orteguiana eu sou eu e minha circunstânciaencontrada nas Meditações do Quixote une o eu e a circunstância de modoinseparável. A realidade vital é a vida, eu estou aqui no meio de muitas coisas:sentimentos, ideias, valores, época, sociedade, com as quais permaneço em rela-ção enquanto vivo. Eu e circunstância interagem e se completam. A vida é oresultado desta relação, mas não se confunde com ela, eu e circunstância só sedeixam ver de verdade na vida que é a realidade concreta e real. O principalestudioso da filosofia orteguiana precisa este núcleo do seguinte modo:Encontro-me, pois, desde logo, na vida, encontro-me vivendo, na vida encontro as coisas e me en-contro a mim mesmo; isto é, a vida é o primário, éanterior as coisas e a mim, me é dada, sem suma, etanto o eu como as coisas são secundárias a ela,ingredientes seus, realidades derivadas, ou, se seprefere, realidades radicadas nela, que é, ao contrá-rio, a realidade radical (MARÍAS, 1991; p. 27).Considerar a vida como o núcleo da metafísica orteguiana exige que aconsideremos como algo maior do que um fenômeno biológico, exige enxergá-la como expressão de valores: “apontar a vida como o grande problema a serinvestigado não significa mergulhar numa forma de viver primitiva, anterior àestruturação da cultura e seus valores” (CARVALHO, 2004; p. 69). E diría-mos ainda mais. Segundo Ortega y Gasset a situação concreta, nuclear e vitaldo sujeito é o ponto de onde se parte para pensar toda a realidade: “o filósofoolha a vida como um princípio, e um princípio é de natureza racional, é umaforma de esclarecimento da razão” (idem, p. 69).Circunstância em “El espectador”, o entorno ao euPartimos do seguinte: circunstância é um conceito fundamental para se en-tender o raciovitalismo orteguiano. Não é um exagero o que escreveu uma estu-diosa de Ortega y Gasset (AMOEDO, 2002; p. 224/5): “circunstância – comtudo que ela implica – representa a intuição fundamental de Ortega, o que determinaa diferença específica de seu filosofar e a raiz que explica todas as suas atividades”.Nos diversos ensaios de El espectador o problema do que envolve o euaparece e é investigado. Em Verdad y Perspectiva (1916), o filósofo associaser espectador com buscar a verdade. Desde a Antiga Grécia os filósofosaceitaram o desafio de buscar a verdade e este é um problema para a multidãode pensadores que se inserem na tradição filosófic Espectador é o homem que contemplao mundo com o propósito de entendê-lo e o olha buscando compreender o queele é fundamentalmente? Em nosso tempo o tema que pede esclarecimento é avida. E o espectador a contempla como uma subjetividade singular, um eu con-creto e não como uma razão abstrata ou uma consciência universal. Esta con-clusão tem implicações importantes. Cada um é um eu particular, a verdade seapresenta para ele de modo singular como esclarece Ortega y Gasset: “cadahomem tem uma missão de verdade. Donde está minha pupila não está outra, oque da realidade vê minha pupila não o vê outra” (idem, p. 19). Portanto, averdade se apresenta a cada um segundo uma perspectiva.O olhar, ou melhor, os sentidos e a consciência do indivíduo se dirigempara o seu entorno imediato, não para algo distante e abstrato. Assim, é o olhardirigido à mulher que toma um bonde onde alguém está. O que contempla oobservador? A beleza dela. Seria a beleza expressão de uma forma pré-exis-tente ou uma ideia pura de beleza, como dizia Platão, com a qual comparamosaquela mulher concreta? Não, responde o filósofo em Estética em el tranvia(1916). “não há um modelo único e geral a que imitam as coisas reais” (p. 34).Cada mulher é única em sua beleza e, por sua vez, cada homem é capaz de vê-la de um modo distinto, igualmente singular. Esta atitude de olhar e avaliar abeleza à volta, num fenômeno que Ortega y Gasset chama de cálculo da belezafeminina, é atitude fundamental de avaliação do entorno. Esta atitude não seaplica só a esta situação, mas a todas nas quais o eu é desafiado a contemplare estimar. Ele esclarece: “o cálculo da beleza feminina uma vez realizado servede chave para todos os demais reinos de valorização” (idem, p. 38).O que o homem avalia? Tudo o que lhe aparece, tudo que está diantedele e lhe oferece resistência. Diz o filósofo no ensaio Tierras de Castilla(1911): “as coisas estão aí, diante de nós, oferecendo-se ou servindo-nos” (p. 43).A mesma atitude se espera quando a pessoa está diante de ideias e não defatos, complementa em O gênio da Guerra (1916). No caso são as ideias queestão aí diante de nós e que devem ser examinadas com objetividade, comoele diz: “não interessa desvirtuar as ideias alheias em proveito das próprias.
Ao contrário, o empenho é extrair - a maior quantidade possível de bom sentido”(p. 218). Portanto, em relação a fato ou ideia, o espectador da circunstânciabusca a verdade ou o bom sentido. Bom sentido é o que nasce da descriçãocuidadosa do entorno, da paisagem que envolve o eu enquanto se movimenta oudas ideias que estão diante dele. A paisagem surge numa mirada singular, elapode ser compartilhada e reconhecida pelos outros, embora seja única em suagênese. Trata-se de atividade que exige tempo e cuidado, explica Ortega y Gas-set no ensaio De Madrid e Asturia o los dos paisages (1915) que está noEspectador III: “Esse tempo e outro são insuficientes para conhecer o corpo e aalma de uma comarca, ainda que se dedicando por inteiro a seu estudo” (p. 251).Além da perspectiva distinta, a paisagem muda também com o tempo. A descri-ção da paisagem vista da janela do trem tem semelhança com outras situações denossa vida. O entorno se transforma à nossa volta, as coisas mudam, temoshistória. Desde a infância o que está a nossa volta se altera diz o filósofo: “Notempo que dizemos já vem, já vem, a esta paisagem, a esta amizade, a esteacontecimento temos que ir preparando os lábios para dizer já se vão, já se vão”(idem, p. 247). E este contorno do eu integra a vida de todos nós, somos um eu euma circunstância inseparáveis, e um eu histórico, envolvido numa circunstân-cia também histórica. No ensaio Elogio del Murciélago (1921), texto de Es-pectador IV, Ortega y Gasset fala que a paisagem que envolve o eu funcionacomo pano de fundo da vida do homem e se explica junto com ela. Este cenárionão se separa do eu e se torna, por tal vínculo, algo diverso do que ele é por elemesmo. Nas palavras do filósofo: “A paisagem tem o destino de ser fundo de algoque não é ele e servir de cenário a uma cena vital” (p. 338). O entorno só fazsentido associado a um eu e este reconhecimento de que não é possível separaro homem do mundo, ou o eu da circunstância que o envolve, explicita-se aindamais em Conversación em el Golf o la Idea del Dharma (1925), onde afirma:“Se não existe alguém que ateste a existência das demais coisas, esta seria comonula” (p. 405). Portanto, apesar das diferenças que indicaremos adiante, o racio-vitalismo incorpora o que há de essencial na fenomenologia.O conceito de circunstância contempla o entorno que não se resume àpaisagem representada pelo ambiente social ou o nós. Este ponto é marcanteno raciovitalismo, o entorno ao eu inclui a intimidade representada pelos meca-nismos fisiológicos da vida, das leis que regem a alma e pelas expressões dopensamento ou espírito, tudo isto histórico e escondido em cada homem. Diz ofilósofo em Sobre la expresión fenômeno cósmico (1925): “A diferença detodas as demais realidades do universo, a vida é constitutiva e irremediavel-mente uma realidade oculta, inespacial, um arcano, um segredo!” (p. 578).A intimidade ou o lado de dentro que representa a parcela oculta da vidatambém circunscreve o eu, como também o envolve a situação exterior, arealidade social, econômica, política, temporal, em resumo cultural onde vivemos.
Comunidade Simmel vários bbb
Simmel e o futebol: da comunidade de afeto à equivalência abstrata do dinheiro
FG Bitencourt - Revista de Ciências Humanas, 2009
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[PDF] ufsc.br
[PDF] Comunidade: a apropriação científica de um conceito tão antigo quanto a humanidade
BB Sawaía - Psicologia social comunitária: da solidariedade à …, 1996
Citar Citado por 234 Artigos relacionados Todas as 6 versões
[PDF] cliqueapostilas.com
[B] As sociologias de Georg Simmel
F Vandenberghe - 2019
Citar Citado por 159 Artigos relacionados Todas as 4 versões
Simmel e o futebol: da comunidade de afeto a equivalência abstrata do dinheiro
Autores
Fernando Gonçalves Bitencourt
https://periodicos.ufsc.br/index.php/revistacfh/article/view/2178-4582.2009v43n2p573
Objetiva-se refletir com Simmel alguns efeitos do neoliberalismo no futebol. A partir da Filosofia do Dinheiro e da Tragédia da Cultura, pretende-se compreender como a flexibilização das leis trabalhistas e o fim da lei do passe promoveram o princípio da circulação já apontado ao fim do séc XIX. Etnografando o sistema futebolístico, observando e ouvindo jogadores, treinadores e dirigentes, aponto como um sistema de pensamento, conectado a uma estrutura jurídico-econômico ancorada em leis e regulamentações, estimula e legitima a circulação dos jogadores, tornando incipiente a relação destes com os clubes. A lei Pelé, os empresários e os regulamentos das competições abrem as brechas para a contínua transferência dos atletas de clube para clube. O corolário deste reordenamento estrutural do futebol, comum a ordem econômica mundial, é um processo de ressignificação das relações estabelecidas na comunidade de afetos em torno do clube quando da imposição da equivalência abstrata do dinheiro
Tonnies comunidade e sociedade resenha bbb
https://fundaj.emnuvens.com.br/CAD/article/view/1039/759
ma obra, um pensamento, um livro permanecem válidos para além de suaépoca quando a questão que eles tratam continua a nos interrogar mesmo quando jánão partilhamos do mesmo contexto histórico-cultural em que eles foram produzi-dos. Tal é o caso, a nosso ver, da obra do sociólogo alemão Ferdinand Tünnies - ou,mais exatamente, do livro que consubstancia o essencial do seu pensamento e cujotítulo 6, precisamente, Comunidade e Socieda&(1) Tal obra, cronologicamentesituada entre os gigantes Marx e Weber, parece que não tem merecido, no Brasil,uma atenção que faça justiça à importância e à atualidade das questões que, a nossover, ela levanta. Tal importância decorre do fato de que os conceitos de comunida-de e sociedade, mesmo quando não formulados nesses termos, estão no centro demii debate fundamental - o qual atravessa dramaticamente todo o século XX - apropósito de que modelo de organização social seria melhor para o homem e suasaspirações. Tal debate é aquele que confronta, de um lado, o modelo liberal, de ou-tro, o modelo socialista. Como veremos, muitos dos elementos que informam orno-delo liberal estão também presentes no conceito de sociedade, da mesma forma que- e inversamente - o conceito de comunidade abriga vários elementos que infor-mamo modelo socialista.A atualidade desse debate é, no Brasil 'de hoje, uma realidade cuja evidênciasalta à vista. Tanto mais que, no nosso caso particular, um dos projetos existentes nosentido de uma organização social justa e igualitária - vale dizer, socialista - é aqueleque se tece em torno das Comunidades Eclesiais de Base, o que nos remete - nemque seja pela coincidência dos termos - à problemática contida no livro de Tõnnies.Isso não quer de forma alguma dizer, como teremos ocasião de ver, que seria legíti-mo fazer desse autor um precursor longínquo da teologia da libertação. O próprioT&mies, aliás, sempre se recusou a considerar sua obra um tratado ético ou político,e sua idéia de comunidade tem raízes claramente "materialistas", o que não é o casodas comunidades teorizadas pelos teólogos da libertação. Além do mais, a própriareferência empírica do conceito de comunidade em Tõnnies difere bastante da reali-Comunidade e Sociedade é como normalmente se traduz o título desse livro, no originalalemão Gemeinschaft und Cese!tschaft Que seja do nosso conhecimento, ele não estátraduzido no Brasil. Nesse talho nós nos valemos da tradução francesa, Communautóet Sociét Paris, PUF, 1944.NOTA: Todas as citações extraídas desse livro -e de outros igualmente escritos em francês -foram traduzidas pelo autor do pmsente texto.Cad. EstSoc.,Recife, v.4 n.J,p.lOS-118,jan./jun., 1988
Comunidade e sociedade são dois conceitos construídos de uma maneiraem tudo igual ao método weberiano de construção dos tipos-ideais, pois que não setrata, nem um nem outro, de correspondências rigorosas com a realidade empírica,mas de conceitos racionalmente e previamente concebidos com a ajuda dos quaisa realidade é, num momento posterior, percebida?) Evidentemente isso não quer di-zer que um e outro sejam destituídos de substância histórica; ao contrário, a históriada Europa ocidental desde a idade média até a era moderna constitui o pano de fun-do a partir do qual Tõnnies extrai os elementos que irão constituir os tipos-ideaiscom os quais trabalha. Mas, enquanto conceitos idealmente construídos, a comuni-dade e a sociedade se satisfazem em revelar determinados aspectos significativosda realidade. Eles não contêm toda a história nem nela se realizam integralmente - oque, aliás, vai permitir que eles sejam utilizados para iluminar outras realidades di-ferentes do contexto para o qual foram inicialmente pensados, como nós tentaremosfazer.Isto dito, comecemos por um esclarecimento terminológico. Tõnnies desig-na por comunidade uma forma especial de relações humanas cuja natureza se fun-da num conjunto de estados afetivos, hábitos e tradições, e que se contrapõe ao queele chama de sociedade, que vem a ser uma forma de relações cuja natureza, aocontrário, se funda no interesse individual, racional de cada um. Enquanto a pri-meira teria prevalecido na idade média, a segunda prevalece na era moderna. Ora,como lembra Robert Nisbet) a utilização do termo sociedade (tradução literal doalemão Gesellscbaft) para designar essa realidade moderna, não parece muito ade-quada, pois que seja em inglês (society), em francês (socidté) ou - acrescentamosnós - em português, o termo sociedade normalmente se refere a todo tipo de agru-pamento humano, recobrindo, assim, uma realidade bem mais vasta do que aquiloque Tünnies designa como tal. Nesse sentido poderíamos mesmo dizer que tambéma comunidade é uma espécie de sociedade... Mas, feliz ou não, a tradução de Cc-seHschaft por sociedadejá está consagrada pelo uso, não havendo assim nenhumarazão para mio utilizá-la.De que maneira estabelece Tõnnies seus dois conceitos polares? Curiosa-mente para uma obra que se pretende fundamentalmente de sociologia,(4).é num ele-mento psicológico, a vontade, que ele vai fundamentar os seus conceitos - o que tal-vez se explique pela época em que ele escreve (fins do século XIX), onde é comum2 Cf. Max Wcber, Essais surta théorie de Ia scicnce, Paris Plon, 1965, p. 1813 Cf. Robert A. Nisbe La Tndition Sociologique, Paris, P'UF,I 984 p. 1004 O sub-título do u livro é Categorias fundamentais da sociologia puraCad.Est. Soc., Recife, v.4 n.J, p. 105-118,jan-/Jun.. 1988
106dade histórica a que se refere o conceito de comunidade eclesial de base, como ve-remos. Essas diferenças, sem dúvida importantes, não impedem todavia que façamosuma leitura de Tõnnies visando colher em sua obra elementos que nos subsidiem noesclarecimento de um debate cujo fim não parece estar próximo. Isto dito, convémadiantar que este texto tem por finalidade principal realizar uma tal leitura, tarefaque ocupará boa parte das páginas que se seguem, com o que anunciamos que nãotemos de forma alguma a intenção de resolver os impasses de tal debate, mas apenasa de visualizá-lo em termos que, a nosso ver, não têm sido suficientemente levadosem conta.Comunidade e sociedade são dois conceitos construídos de uma maneiraem tudo igual ao método weberiano de construção dos tipos-ideais, pois que não setrata, nem um nem outro, de correspondências rigorosas com a realidade empírica,mas de conceitos racionalmente e previamente concebidos com a ajuda dos quaisa realidade é, num momento posterior, percebida?) Evidentemente isso não quer di-zer que um e outro sejam destituídos de substância histórica; ao contrário, a históriada Europa ocidental desde a idade média até a era moderna constitui o pano de fun-do a partir do qual Tõnnies extrai os elementos que irão constituir os tipos-ideaiscom os quais trabalha. Mas, enquanto conceitos idealmente construídos, a comuni-dade e a sociedade se satisfazem em revelar determinados aspectos significativosda realidade. Eles não contêm toda a história nem nela se realizam integralmente - oque, aliás, vai permitir que eles sejam utilizados para iluminar outras realidades di-ferentes do contexto para o qual foram inicialmente pensados, como nós tentaremosfazer.Isto dito, comecemos por um esclarecimento terminológico. Tõnnies desig-na por comunidade uma forma especial de relações humanas cuja natureza se fun-da num conjunto de estados afetivos, hábitos e tradições, e que se contrapõe ao queele chama de sociedade, que vem a ser uma forma de relações cuja natureza, aocontrário, se funda no interesse individual, racional de cada um. Enquanto a pri-meira teria prevalecido na idade média, a segunda prevalece na era moderna. Ora,como lembra Robert Nisbet) a utilização do termo sociedade (tradução literal doalemão Gesellscbaft) para designar essa realidade moderna, não parece muito ade-quada, pois que seja em inglês (society), em francês (socidté) ou - acrescentamosnós - em português, o termo sociedade normalmente se refere a todo tipo de agru-pamento humano, recobrindo, assim, uma realidade bem mais vasta do que aquiloque Tünnies designa como tal. Nesse sentido poderíamos mesmo dizer que tambéma comunidade é uma espécie de sociedade... Mas, feliz ou não, a tradução de Cc-seHschaft por sociedadejá está consagrada pelo uso, não havendo assim nenhumarazão para mio utilizá-la.De que maneira estabelece Tõnnies seus dois conceitos polares? Curiosa-mente para uma obra que se pretende fundamentalmente de sociologia,(4).é num ele-mento psicológico, a vontade, que ele vai fundamentar os seus conceitos - o que tal-vez se explique pela época em que ele escreve (fins do século XIX), onde é comum2 Cf. Max Wcber, Essais surta théorie de Ia scicnce, Paris Plon, 1965, p. 1813 Cf. Robert A. Nisbe La Tndition Sociologique, Paris, P'UF,I 984 p. 1004 O sub-título do u livro é Categorias fundamentais da sociologia puraCad.Est. Soc., Recife, v.4 n.J, p. 105-118,jan-/Jun.. 1988
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atribuir-se uma base psicológica na explicação de fenômenos sociais.51 Ora, o pontode pai-tida de flnnies é o de que toda manifestação da realidade social representaunia vontade, a qual para ele pode ser compreendida em dois sentidos: "eu distingo:a vontade na medida em que ela contém o pensameiito, e o pensamento na medidaem que ele contém a vontade. Cada uma apresenta um todo coerente onde os senti-mentos, as tendências e os desejos, por diversos que sejam, possuem uma unidade, aqual, entretanto, deve ser entendida no primeiro conceito como real ou natural, e nosegundo, com ideal ou artificial. A vontade humana, no primeiro sentido, eu a cha-mo de vontade orgânica, no segundo sentido, vontade refletida" (p81). Expli-cando essa polaridade, ele acrescenta: "A vontade orgânica é o equivalente psicoló-gico do corpo humano, ou à princípio da unidade da vida". Em oposição, "a vontaderefletida é um produto do pensamento em si mesmo, ao qual não corresponde umarealidade própria" (p.82).É verdade que uma e outra são impulsionadas pelos desejos e forças vitaisdo homem, mas com a diferença de que na vontade orgânica o homem realiza seusimpulsos de forma direta, não mediatizada, segundo hábitos imemoriais do grupo aque pertence, enquanto que na vontade refletida o homem faz de seus desejos abs-trações, projeta-os no futuro, estabelece hierarquia entre eles, e assim suas açõestornam-se simples meios para atingi-los. A primeira é a vontade autêntica e profun-da do ser, expressando a espontaneidade mesma da vida; a segunda, ao contrário,expressa uma vontade calculada, racional, capaz de produzir um mundo artificial.Com efeito, Tiinpjes dirá mesmo que "a vontade refletida não é uma realidade doser humano" (p. 111). Já se vê onde esse autor vai chegar: "Dessas consideraçõs de-corre que a vontade orgânica contém em si as condições da comunidade, e que avontade refletida produz a sociedade" (p. 152).Ora, ainda aqui a dómarche de Tõnnies nos parece anunciar a metodologiaweberiana avant Ia lettre, na medida em que o sentido da causalidade adotado (avontade orgânica é causa da comunidade; a vontade refletida é causa da socieda-de) é mais uma "escolha" prévia do analista do que uma lei empiricamente constata-da e que, como tal, não poderia admitir o sentido contrário como igualmente possí-vel. Notemos, para sustentas essa observação, que ao fim desse trecho Tónnies faz areflexão seguinte: 'Porque o tema deste livro decorre da psicologia individual, fal-ta-lhe a consideração paralela e oposta sobre a maneira pela qual a comunidade de-senvolve e forma a vontade orgânica" (p. 160) - reflexão que é também válida paraa maneira pela qual a sociedade, por seu turno, desenvolve e forma a vontade refle-tida.(6)Mas deixando de lado essa inesgotável discussão sobre quem surgiu pri-meiro - se o sujeito, se as estruturas -' abordemos inicialmente a questão da cominidade. Tünnies vislumbra três tipos desta última, segundo elas sejam formadaspelos laços do parentesco, da vizinhança ou da amizade. A primeira tem como localpróprio a casa familiar; a segunda, a aldeia; a terceira, i cidade - mas não a cidadeno sentido moderno do tempo. Deixemos falar o próprio Tbnnies, pois a linguagemquase idílica com a qual ele discorre sobre esses três tipos de comunidade mereceser retida: "O parentesco tem na casa o seu lugar e o seu corpo; aqui, é a vida co-mum sob um mesmo teto; é a posse e gozo comum dos bens, especialmente dos ali-mentos provenientes da mesma fonte e que são partilhados em tomo da mesma me-sa; aqui, os mortos são honrados como espíritos invisíveis sempre poderosos e quereinam como protetores sobre os seus, de sorte que o temor e a veneração comunsmantêm com maior segurança a vida pacífica e a atividade familiar. ( ... ) A vizinhan-ça é a característica geral da vida na aldeia, onde a proximidade dos habitantes, osmarcos que limitam os campos determinam numerosos contatos entre os homens,onde o hábito de viver juntos e o conhecimento mútuo e confiante necessitam o tra-balho, a ordem e a administração comuns, e dão lugar à imploração de favores e degraças junto aos deuses e aos espíritos tutelares da terra e da água que distribuem asbênçãos e conjuram o mal. ( ... ) A amizade se distingue do parentesco e da vizinhan-ça pela identidade das condições de trabalho e das maneiras de pensar que delas de-correm. Ela nasce de preferência da semelhança das profissões e das artes, mas umtal laço deve ser estreitado e mantido pelos contatos passageiros e freqUentes que sedão no interior de uma cidade" (pp. 15116).Vê-se assim que Tõnnies estabelece três tipos de comunidade, às quaiscorrespondem três tipos dominantes de atividades econômicas: à casa familiar, aeconomia doméstica; à aldeia, a agricultura de base comunista; à cidade - no sentidomedieval do termo -, as corporações de artes e ofícios artesanais. Nenhuma dessasatividades constitui um mundo à parte, desligado dos outros aspectos da vida sociale regido pelas leis do cálculo econômico. Ao contrário, todas elas estão envolvidaspor uma atmosfera onde os valores religiosos, morais e estéticos têm uma presençadeterminante. Mesmo quando L como acontece na economia comunitária das cida-des — pratica-se a troca, esta não é feita com a finalidade do lucro, pois o ofício ar-tesanal é uma arte praticada pela dignidade que lhe é própria, e não com o objetivode enriquecimento. Por fim, acrescentemos que o direito que prevalece na comuni-dade são os hábitos e costumes imemoriais, e que a religião detém um lugar muitoimportante. É bem o mundo da idade média que é aí descrito (ou talvez imagina-do,.,), mundo que a moderna sociedade vai quebrar e destruir.Com efeito, a organização social que historicamente se segue é em tudo oseu contrário. Segundo Tünnies, a sociedade "é um grupo de homens que, vivendoe permanecendo, como acontece na comunidade, de uma maneira pacífica uns ao la-do dos outros, mesmo assim não estão organicamente ligados, estão organicamenteseparados; (..) Aqui, cada um é por si e está num estado de tensão em relação a to-dos os demais ( ... ) Uma tal conduta negativa é normal, ela é o fundamento da posi-ção desses 'sujeitos-forças' uns em relação aos outros, e caracteriza a sociedade noestado de paz. Ninguém fará alguma coisa por um outro, ninguém de bom gradopermitirá ou dará o que quer que seja a outro, salvo se isso é feito em troca de umserviço ou de algo estimado pelo menos equivalente" (p. 39). Os locais onde essanova forma de organização social se realiza são: primeiro a grande cidade, depois opaís, depois o mundo inteiro ligado pelo mercado mundial. A vontade orgânica cedeo lugar à vontade refletida; a economia agrária e comunista, ao comércio e indústriaCad. Est. Soc., Recife, v.4 n.1, p. 105-118,jan./j14n., 1988
capitalistas, O direito costumeiro se retrai diante do direito racional dos contratos,como a religião se retrai diante da ciência. O trabalho, despido de toda alegria e detodo orgulho, toma-se uma mercadoria como não importa qual outra, sujeito àcompra e venda. Algumas formas mínimas de comunidade - como acontece com afamília, por exemplo - não são completamente ausentes desse mundo, mas elas ocu-pam uma posição marginal, se atrofiam e desaparecem pouco a pouco.Essas são as grandes linhas que atravessara obra de Tônnies, e que, nanossa opinião, correm em paralelo com muitas das questões cruciais que atravessamo mundo contemporâneo. Isso não significa que possammos considerar Comunida-de e Sociedade como um livro afinado com a sensibilidade moderna. Ao contrário,essa é uma obra que, sob vários aspectos, envelheceu bastante. Metodologicamente,por exemplo, poderíamos dizer que ela padece de um psicologismo hoje em dia con-siderado como insustentável. Tünnies é, efetivamente, um autor do século passado eo seu livro partilha de alguns preconceitos da época que hoje já não aceitamos. As-sim ocorre com a sua visão sobre as mulheres, que ele considera como seres "fracospor natureza" e que, em relação aos homens, seriam levadas mais pelo sentimento epela intuição do que pela reflexão e pelo conhecimento racional... Da mesma formapode-se criticar -mesmo se se considera que ele trabalha a partir de tipos-ideais - ofato de que Tõnnies idealiza exageradamente a comunidade medieval. Nesse sentidoé que ele chega a fazer o elogio da servidão como instituição integrante da comuni-dade familiar. Para ele, trata-se de "um preconceito tão tenaz quanto irrefletido"achar "que a servidão seja indigna nela mesma e por ela mesma porque contráriaà igualdade humana". Ora, diz Tõnnies, "o doméstico que partilha a alegria e a dorda família, que tem para com o seu senhor o respeito de um filho de idade madura,que goza de sua confiança a título de companheiro ou mesmo de conselheiro, é, aocontrário, moralmente, um homem livre, mesmo se não o é juridicamente" (p. 27).Não é fácil de acreditar que um tal idílio fosse realmente a nota dominante no mun-do medieval. A moderna historiografia fortemente apoiada em elementos empíricos,opõe sérias dóvidas a esse respeitoS7)De outro lado, mesmo as leituras elogiosas que são feitas de Comunidadee Sociedade - como a que faz J. Leif, que assina a Introdução desse livro na ver-são francesa - chegam a observar uma certa falta de originalidade no que diz res-peito às grandes linhas do raciocínio de Tõnnies. Assim a sua teoria das vontadesparece se inspirar largamente na filosofia de Schopenhauer, a vontade orgânicacorrespondendo ao "mundo como vontade", e a vontade refletida correspondendoao "mundo como representação". Sua teoria jurídica - segundo a qual a comunida-de produz um direito costumeiro, enquanto que a sociedade produz um direitocontratual - ele a deve ao inglês Maine, que havia antes dele feito uma análise daevolução jurídica que se deu na Europa do estatuto para o contrato, hoje consi-derada clássica. Essa dívida, aliás, é expressamente reconhecida pelo próprioTinnies, que no seu livro faz uma longa citação do autor inglês, à época ainda nãotraduzido na Alemanha. Enfim, a visão crítica que tem Tünnies sobre a sociedadepossui uma notável semelhança com a obra de Marx. Ainda aqui Tõnnies não dissi-mula suas fontes: num Anexo que ele acrescentou ao seu livro em 1911, ele diz ex pressamente que "o sistema marxista ( ... ) influenciou seu conteúdo". Essa influên-cia, com efeito, salta aos olhos. O livro de Tbnnies recepciona inúmeros elementostipicamente marxistas, sobretudo no que se refere aos aspectos propriamente eco-nômicos que caracterizam a sociedade. Assim ocorre com a teoria do valor comoqualidade objetiva que decorre da quantidade de trabalho socialmente necessária (p.41); com a força de trabalho como uma mercadoria que os operários são forçados avender por não terem nada além dela para sobreviver (p. 59); com o preço da forçade trabalho como correspondendo ao mínimo necessário para a manutenção e re-produção do trabalhador. (p. 72); e, enfim, como processo de mercantilização geralda vida como constituindo a estrutura essencial da sociedade (p. 78).Mesmo o catastrofismo marxista está presente em Tõnnies, que por váriasvezes exprime uma visão bastante pessimista em relação ao futuro da sociedade.Para ver isso, recordemos por exemplo o que dissera Marx sobre a chamada con-cepção burguesa dos direitos do homem: "Nenhum dos pretensos direitos do homemultrapassa o homem egoísta, o homem enquanto membro da sociedade burguesa,isto é, um indivíduo separado da comunidade, ensimesmado, preocupado apenascom o seu interesse pessoal, obedecendo unicamente á sua arbitrariedade priva-W.(8) Tônnies não faz por menos. Ao analisar a ordem social que sucede à comuni-dade, ele fala a linguagem de um irado profeta, fazendo eco ao que Marx já dissera:"Mas em verdade um direito racional, científico, livre, só era possível através daemancipação atual do indivíduo frente a todos os laços da família, da região e da ci-dade... ( ... ) E esta emancipação assinala, na aldeia como na cidade, o fim da econo-mia doméstica comunitária, ativa e prazeirosa, da comuna agrícola e da arte urbanabem cuidada, corporativa, religiosa e patriótica. Ela assinala o triunfo do egoísmo,do despudor, da mentira e do artifício, da avareza, da procura do lucro, da ambi-ção..." (p. 201).Essa realidade não é isenta de perigos. Para Tünnies a sociedade é, pornatureza, politicamente instável, visto o fato de que, aí, todos os indivíduos sãoconsiderados livres e iguais, donde se segue que as desigualdades sociais já não sãointegradas numa ordem natural, como era o caso antes. Na comunidade, dizTônnies, "os senhores na sua dominação, os domésticos na sua servidão ( ... ) crêemque devem agir assim e que está certo, porque sempre foi assim" (p. 208). Na so-ciedade, ao contrário, a massa de trabalhadores "só pode ser contida na sua buscade prazer e de acesso aos bens - comum e natural num mundo onde o interesse doscapitalistas e dos comerciantes prevê todas as necessidades ( ... ) - pela carência demeios para satisfazê-la" (p. 236). O precipício pode então ser pressentido: "Assim agrande cidade, o estado da sociedade em geral, representam a corrupção e a mortedo povo que tenta, pelo seu número, em vão tornar-se forte e que, segundo lhe pa-rece, só pode utilizar sua força para a revolta, se quer se livrar de sua desgraça" (p.236). É o tema da luta de classes- expressão aliás que ele utiliza - que também estápresente na obra de Tónnies.É nesse sentido que cabe indagar se o pensamento de Tônnies, alma), seriaalgo mais do que o de um simples epígono de Marx. Essa questão ronda sua obradesde o seu aparecimento, tanto que o próprio governo prussiano dessa época, des-confiado dessa filiação e nada contente com ela, recusou-se por várias vezes a ad-mitir seu autor como professor de filosofia na Universidade de Kiel. EntretaTõnnies não prega nunca a revolução. Como já mencionamos, ele sempre se recusoua politizar as conclusões de sua obra. Mas deixando de lado essa questão - que é afi-nal secundária -. o que parece marcar uma diferença fundamental entre Marx eTünnies é que, para o primeiro a utopia que ele persegue se realizará no futuro, noquadro de uma economia fortemente industrializada, enquanto que para o segundo,se podemos assim dizer, ela já se realizou no passado, no quadro de uma economiafortemente agrária. Quer dizer que Tünnies, contrariamente a Marx, não possui umprojeto político.Ele não seria então nada além de um melancólico espectador de uma tragé-dia sem remédio? Não teria ele nada a dizer sobre essa questão? Segundo algumasleituras de sua obra, não. J. Leif, por exemplo, na Introdução ao livro de Tõnnies,lembra que ele teria "pressentido o apelo que a 'Sociedade' lançaria um dia à 'Co-munidade" (p. VII)? Para apoiar sua interpretação, Leif remete-nos a um outroAnexo que Tônnies acrescentou ao seu livro em 1922, onde se lê que "depois dasagitações por que passou o sistema capitalista mundial ( ... ) o apelo à comunidade, talqual ela foi aqui exposta, tornou-se cada vez mais claro". E termina por exprimir aesperança de que "a sociedade saiba evitar ( ... ) tomar-se a exploração de um puronegócio" (p. 194). Mas ele não avança nessa linha prospectiva. Esse mesmo gênerode reflexão, generoso mas igualmente vago, surge aqui e ali no próprio texto origi-nal do livro. Assim ocorre no trecho onde Tõnnies, aproximando-se de Marx, prevêa revolta das massas, trecho que ele conclui da seguinte maneira: "Pode ser entãoque ( ... ) o ser e as idéias da comunidade sejam de novo reavivadas, e que uma novacultura desabroche discretamente no meio daquela que se apaga" (p. 236). Mas aquitambém Tünnies não investe nessa dimensão projetiva do seu pensamento. Onde re-sidiria então o valor próprio e a especificidade do seu pensamento em relação aMarx? - ou, como talvez seja mais apropriado dizer, em relação à tradição marxista?A essa questão acrescentamos uma outra, com a qual retomamos a nossa indagaçãoinicial: em que sentido a obra de Tõnnies ainda nos interroga na atualidade?2.O PERCURSOPara responder a essas questões, voltemo-nos primeiro para o curioso por-curso histórico por que passaram as idéias desse autor. Apesar do livro de Tõnniester sido inicialmente confundido com uma obra marxista, e mesmo a despeito dofato de que ela contém, efetivamente, inúmeros elementos extraídos da teoria deMarx, a verdade é que Comunidade e Sociedades pela sua idealização do passadomedieval, se insere de preferência na corrente do romantismo e do historicismoconservador alemão,(' O) ideologicamente situada num terreno oposto ao marxismo.Num e noutro caso, é verdade, a crítica ao mundo moderno está presente e convergesobre vários alvos comuns: a razão calculadora, o direito individualista, a mercantili-zação da vida, etc. Mas as semelhanças param aí, porque enquanto o marxismo vênesse mundo a última queda antes da redenção final (a futura sociedade comunista),a corrente onde Tõnnies se situa se volta para um passado onde o marxismo tradi-cionalmente também não vê nenhum encanto
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