sábado, 29 de junho de 2024

Carlo Ginzburg vários - sobre o que está fora do texto bbb

Relações de força:história, retorica, prova https://periodicos.uem.br/ojs/index.php/rbhe/article/view/38677/20206 mostrar que o que está fora do texto está também dentro dele,“abrigado entre as suas dobras” (p. 42). Nesse caso, a retórica base-ada na prova tem a função de descobrir no texto o histórico e fazê-lofalar. Aí consiste a relação de força. Ao citar a exortação de WalterBenjamin2, que afirmava a necessidade de “escovar a história aocontrário”, o autor confirma que “é preciso aprender a ler os teste-munhos às avessas, contra as intenções de quem os produziu. Sódessa maneira será possível levar em conta tanto as relações de forçacomo aquilo que é redutível a elas” (p. 43).O trabalho do historiador consiste em problematizar (ou analisar,como trata Ginzburg) as fontes. É nesse exercício que o esforço decompreensão das relações de força se fará presente, pois o“conhecimento possível” (p. 45) será apreendido no trabalho deconstrução de uma retórica baseada na prova. Uma retórica que se“move no âmbito do provável, não no da verdade científica (como aconcebida pelo positivismo) e numa perspectiva delimitada, longedo etnocentrismo inocente”. Para Ginzburg, a análise construtivadas fontes requer um tratamento que as concebam não como “janelasescancaradas, como acreditam os positivistas”, nem como “murosque obstruem a visão, como pensam os céticos” (p. 44), mas como“espelhos deformantes” que exigem interdições e possibilidades comvistas à construção histórica.A sua tese que vincula retórica e prova, marco do seu distancia-mento da visão pós-moderna da historiografia, será baseada em trêsexemplos que irão possibilitar alcançar o objetivo da defesa de “que,no passado, a prova era considerada parte integrante da retórica” eque hoje deixada de lado por alguns, “implica uma concepção domodo de proceder dos historiadores” (p. 13). Uma questão que pas-2Walter Benjamin, Concetto di storia, Torino, 1997. .... Aristóteles observa: “Dorieu venceu os jogos olímpicos”. Nessapassagem, dentro da realidade grega, não estava a preocupação com aquilo que se encontrava em jogo na competição, a coroa de louros,pois todo mundo já sabia, era óbvio. A observação pressupõe umsaber compartilhado e não declarado que na sua forma oculta revelaum saber tácito evocado, o que levará Lorenzo Valla a compreenderque a retórica de Aristóteles se move no âmbito do provável. Umhistoriador distanciado dessa realidade precisará fazer a leitura doque não foi dito, que para ele não é óbvio, não está no texto, está fora dele, num espaço em branco que precisa ser decifrado. É como um dito que está na voz do outro e não é compreendido por aquele que está ouvindo, uma voz estranha, “que provém de um lugar situadofora do texto”. Na leitura de um trecho famoso da Educação sentimental, deFlaubert, Ginzburg constrói o seu capítulo “Decifrando um espaçoem branco”. Nesse capítulo, irá tratar da retórica visual, tipográfica,pois será no espaço em branco deixado pelo autor na divisão doscapítulos da Educação sentimental que Ginzburg criticará o traba-lho historiográfico que valoriza os modelos narrativos que intervêm“apenas no final, para organizar o material coletado”(p. 44). Para ele,ao contrário, deve-se considerar, ou melhor, deslocar a atenção doproduto final do documento acabado para as questões presentes no

conhcimento racional - no curriculo escolar

https://www.seer.ufal.br/index.php/debateseducacao/article/view/10567 O presente artigo tem como objetivo inicial resgatar noções clássicas da filosofia antiga no campo do currículo. Entre essas noções destacamos as concepções de: ética, comunidade, humanismo e natureza. Desse modo, consideramos que tais noções só fazem sentido quando pensadas no ideal da Paidéia grega (JAEGER, 1994). Por isso, resgatamos passagens da Republica de Platão e da Ética de Aristóteles. Por meio dessas passagens, valendo-se de analise comparativa, compreendemos a diferença entre o saber-fazer do primeiro em detrimento ao saber-agir do segundo. Nesse sentido, a ética, com Aristóteles, recebe um componente pedagógico, a virtude intelectual conhecida por phronesis (prudência). Assim, com prudência e clareza da condição ética política, podemos superar a moralização contemporânea. Adorno. A teoria crítica desse autor constrói-se em diálogo com o pensamento iluminista de Kant, com a filosofia marxista, mas também com a psicanálise de Freud, sem que, no entanto, a filosofia adorniana possa ser compreendida em estrita consonância com qualquer um desses referenciais. ..... a educação moderna instituída, na medida em que não é capaz de enxergar os aspectos ressaltados anteriormente, mostra-se limitada ou mesmo impedida de elevar os entes humanos do seu “estado de menoridade” a uma situação de autêntica emancipação, aumentando, assim, a probabilidade de recaída na barbárie, como a que se constatou na Segunda Guerra Mundial, nos emblemáticos casos do campo de concentração de Auschwitz e do massacre nuclear das cidades de Hiroshima e Nagasaki. Embora seja possível evocar a regressão aos instintos e o irracionalismo como motivadores de ações cruéis, desumanas e destrutivas, a organização sistemática e tecnológica de tais atos indica a presença de um determinado tipo de racionalidade que atua como meio eficaz na execução dessas ações. Há, portanto, um tipo de aliança entre forças instintivas e racionalidade que não se presta a produzir autonomia e emancipação, mas adaptação. Nota-se, portanto, a existência de um tipo de práxis produtiva negadora das forças emancipatórias e humanizadoras. Tal modalidade de racionalidade imiscui-se, por vezes, em diversos domínios da existência, inclusive no âmbito educacional. Daí a ponderação adorniana, segundo a qual: A necessidade de tal adaptação, da identificação com o existente, com o dado, com o poder enquanto tal, gera o potencial totalitário. Este é reforçado pela insatisfação e pelo ódio, produzidos e reproduzidos pela própria imposição à adaptação justamente porque a realidade não cumpre a promessa de autonomia. (ADORNO, 1995, p. 43-44). O pensamento emancipador não despreza a realidade material, produtiva e corporal. Contudo, não se subordina ao cálculo, à busca da melhor performance, à adaptação às regras como fim mesmo do viver e, por consequência, não renuncia à atitude crítica e às preocupações ético-políticas que devem orientar a dimensão prática da existência. A emancipação dos sujeitos é um projeto histórico que não ganha sentido tão somente em situações extremas de ameaça à liberdade e à humanização. Por isso, o combate à barbárie deve ser um esforço constante e continuado, pois ela pode imiscuir-se insidiosamente nas relações humanas mais cotidianas que orientam a formação dos indivíduos. Subjetividades adaptáveis, educadas para aderir às normas e determinações das instituições sociais, que se colocam em face do mundo constituído como se esse fosse uma coisa dada, perdem a capacidade de questionar, de se revoltar, de contestar a ordem estabelecida, fechando-se aos projetos utópicos que se esforçam para construir criativamente um mundo mais humano. Referências ARISTÓTELES. Ética a Nicômaco. Tradução Edson Bini. Bauru, SP: EDIPRO, 2002. DELEUZE, Gilles; GUATTARI, Félix. O que é a filosofia? Tradução Bento Prado Jr. E Alberto Alonso Muñoz. Rio de Janeiro: Ed. 34, 1992. GOERGEN, Pedro. Pós-modernidade, ética e educação. 2 ed. Campinas, SP: Autores Associados, 2005. JAEGER, Werner. Paidéia: a formação do homem grego. Tradução Artur M. Parreira. 3ed. São Paulo: Martins Fontes, 1994. PAVIANI, Jayme. As origens da ética em Platão. Petrópolis, RJ: Vozes, 2013. PLATÃO. A República. Tradução Pietro Nassetti. São Paulo: Martin Claret, 2001. SILVA, Tomaz Tadeu da. 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conhecimento racional - Estado, Política, indivíduo liberal bb

https://www.scielo.br/j/rsocp/a/YkZsZbDQpz94zmpNdrRWwyt/?lang=pt Este artigo trata de problemas na teoria e na prática democráticas. No século XX novas teorias econômicas e sociológicas da racionalidade dominaram a Ciência Social, enfraquecendo os antigos ideais da democracia representativa. Por algum tempo, o paradigma burocrático pareceu oferecer uma solução, mas na década de 1980 a burocracia era criticada como ineficiente e irresponsável. Como se poderia lidar com os problemas resultantes da governança democrática? Atores políticos responderam a essa pergunta aferrando-se ao antigo ideal da democracia representativa apoiada por formas de conhecimento técnico baseadas nas novas teorias da racionalidade. Assim, uma nova governança de mercados e redes difundiu-se pelo mundo. Com isso, os governos representativos ainda lutam para dirigir o processo político, ao mesmo tempo que um conhecimento técnico ilusório entulha a participação democrática. A democracia contemporânea sofre tanto com os limites borrados da accountability quanto com a legitimidade declinante. O artigo conclui sugerindo que a renovação democrática pode depender de estilos mais interpretativos de conhecimento técnico, de formas dialógicas de elaboração de políticas públicas e de diversas vias de participação pública. governança; democracia; accountability; modernismo; idéias políticas; políticas públicas conceito econômico de racionalidade encontrado na economia neoclássica e na teoria da escolha racional. Ele inspira uma erosão da democracia evidente em tentativas de restringir o escopo da tomada democrática de decisões a fim de lidar com as irracionalidades coletivas. Os assuntos públicos são transferidos para instituições não-majoritárias, incluindo bancos centrais independentes e juízes e cortes. Da mesma forma, decisões democráticas futuras são constrangidas por leis que requerem que a legislação, por exemplo, equilibre orçamentos ou respeito direitos jurídicos. Um segundo tipo de conhecimento técnico baseia-se no conceito sociológico de racionalidade encontrado no institucionalismo e em formas semelhantes de Ciência Social. Ele inspira um repensar da democracia que é evidente em novas ênfases na accountability horizontal e na inclusão social. As hierarquias burocráticas cedem espaço para redes joined-up. A segurança pública, a educação e outros serviços públicos crescentemente são baseados em parcerias que incluem organizações do setor privado e grupos comunitários. Hoje, os formuladores de pol í t icas regularmente evocam um admirável mundo novo de descentralização, envolvimento público e cessão de poder [empowerment]. Seria tolice desprezar essas falas. Os formuladores de políticas podem genuinamente acreditar que os mercados e as redes podem e devem promover ideais democráticos. No entanto, sua fé com freqüência deriva pelo menos implicitamente de afirmações de especialistas segundo as quais mercados e redes inclusivos podem apoiar uma governança eficiente que é percebida como legítima. Como tal, há uma possível tensão nesse admirável mundo novo. A participação e o diálogo são meios para a governança eficiente e a legitimidade percebida ou são meios para promover valores democráticos? O que acontecerá se o objetivo de promover a governança efetiva e a legitimidade percebida entrar em conflito com o de estender a inclusão social e a participação política? A nova governança substitui um tipo de modernismo por outro. Vão embora a narrativa burocrática, o conhecimento técnico neutro das profissões e a accountability prodecimental; entram os mercados e as redes, a teoria da escolha racional e o institucionalismo de redes e a accountability de desempenho. As mudanças são dramáticas. Ainda assim, a nova governança, tanto como teoria quanto como prática, continua sendo parte de um modernismo que desde há tempos luta para o fim da compreensão que o século XIX tinha do Estado. Quando historicizamos o modernismo - quando o mostramos como uma forma particular e contestável de conhecimento -, criamos a possibilidade de mover-nos além dele. A Tabela 3 ilustra essa possibilidade. Em vez das abordagens modernistas às racionalidades econômica e sociológica, poderíamos conceber a vida social em termos de formas mais contingentes de razão local. Em vez de mover-nos da accountability procedimental para a de desempenho, poderíamos encorajar a accountability procedimental, talvez a tornando menos relativa a decisões que já foram tomadas e mais relativa a cidadãos tornando pessoas fiscalizáveis durante os processos de tomadas de decisões. Em vez de apelar para a falácia do conhecimento técnico, poderíamos explorar a possibilidade de um envolvimento e de um controle mais diretos pelos cidadãos por meio da formação e da implementação de políticas públicas; poderíamos defender conceitos mais plurais e participativos de democracia. Thumbnail Recebido em 15 de novembro de 2010. Aprovado em 30 de novembro de 2010. Mark Bevir (mbevir@berkeley.edu) é Doutor em Teoria Política pela Universidade de Oxford (Inglaterra) e Professor do Departamento de Ciência Política na Universidade da Califórnia (Estados Unidos), campus de Berkeley. BEVIR, M. 2010. Democratic Governance Princeton: Princeton University. 1 O presente artigo é a tradução de "Democratic Governance: A Genealogy", apresentado no X Congresso Anual da Western Political Science Association, realizado de 31 de março a 3 de abril de 2010, em San Antonio (Estados Unidos). Tradução de Gustavo Biscaia de Lacerda e revisão da tradução de Ricardo V. Silva. 2 A "história whig" refere-se à historiografia desenvolvida por pensadores simpáticos ao partido Whig, que eram os liberais e os democratas britânicos, opostos ao partido Tory, conservador (nota do tradutor). 3 O New Public Management foi uma forma de pensar prevalecente nos Estados Unidos entre as décadas de 1980 e 2000 que afirmava serem necessárias reformas em direção ao mercado para o Estado melhorar seu desempenho; tais reformas incluíam a diminuição da estrutura estatal, assim como a concepção de que os cidadãos são consumidores (N. T.). 4 A Terceira Via foi um movimento político teorizado pelo sociólogo inglês Anthony Giddens em apoio às reformas liberalizantes do Primeiro-Ministro trabalhista Tony Blair (1997-2007). De acordo com eles, o Estado deveria diminuir sua atuação direta na economia e dar mais espaço para a iniciativa privada, mas sem abrir mão de seus mecanismos de controle e e direção sócio-econômica e de combate às desigualdades sociais (N. T.). 5 A expressão "joined-up" é de difícil tradução no presente contexto. O governo joined-up é uma proposta para que diferentes setores de um governo trabalhem em conjunto, delimitando metas e objetivos transversais a eles, buscando a coordenação e a sinergia dos esforços e dos resultados. Evidentemente, ele opõe-se às ações específicas – e por vezes contrapostas – de cada um dos setores envolvidos. O governo joined-up foi proposto pelo Primeiro-Ministro inglês Tony Blair ano longo dos anos 1990 (N. T.).