quarta-feira, 14 de maio de 2025

Apresentação no Cle

"Política do Conceito e Política do Sujeito" (Alain Touraine, sociólogo francês) Enfim aposentado depois de 60 anos de trabalho, agora no desfrute frugal na retomada das leituras que havia deixado para depois, entrego-me ao tema "Política do Conceito versus Política do Sujeito", na expressão do sociólogo francês Alain Touraine (1925-2023), com que ele caractariza o "paradigma da modernidade". Dediquei-me ao tema com afinco nos últimos cinco anos, e o que apresento aqui, à espera de observações críticas, é o esboço de um projeto que poderia, quem sabe, convertê-lo em livro, desde que consiga versá-lo em linguagem comum aos mortais, um desafio que persegui com obsessão como jornalista com pendores especulativos, de voo à meia altitude, sem resultado digno de nota. É gênio somente quem sabe fazer-se entender por uma criança. Eis o texto: "Política do conceito vers Política do Sujeito - Esses são os termos antitéticos do debate recorrente desde que o Ocidente filtrou seletivamente os seus fundamentos do legado compreensivo da Grécia Clássica. Ele dá-se em torno da controvérsia na interpretação do significado de logos (palavra, discurso articulado, em grego), ideia central na mitologia e na sabedoria grega. Em um polo, está a acepção do logos como razão, ou racionalidade, entendida como faculdade soberana (Galileu, Descartes, Newton, Kant, Comte, dualistas); em outro polo, está a acepoção do logos como expressão do conjunto das faculdades humanas, a saber, além da razão, a intuição, e ética, a estética e os sentimentos, faculdades consideradas como distintas, porém, não separáveis, e de equivalente valor axiológico (Pascal, Espinosa, Hegel, Marx, Nietzsche, monistas). Vou ater-me na interface epistemológica e axiológica desse debate. Como interface, por definição léxica, o termo encontra-se associado em interação com as demais interfaces, compondo o todo da realidade cultural. Refiro-me a INTERAÇÃO (intersubjetividade), e não a RELAÇÃO, termo emprestado da mecânica de Newton, de caráter unívoco, linear, enquanto a interação é de caráter complexo, no sentido de complexidade qualitativa, e não no sentido da complexidade quantitativa, como formulada pela cibernética por Norbert Wiener (1985). O objetivo deste trabalho é contribuir para o entendimento, sempre mais plausivel na atualidade, de que a atribuição de soberania à razão iluminista (dualista) seria responsável tanto pelo progresso da pesquisa científica, em sua dimensão abstrata, como pelos seus empecilhos de igual monta, no concreto da realidade, como ação, ou comportamento (monista); empecilhos que, na literatura crítica ao Iluminismo, se atribuem a essa suposta soberania, um desperdício dos recursos interpretativos à disposição da vocação humana, jamais ocorrido na história da humanidade. Nesse sentido, dir-se-ia uma jabuticaba (termo de origem tupi-guarani). Essa renúncia ou rejeição ao reconhecimento de novas janelas para a apreensão da realidade, sugere tratar-se de uma ocorrência originária de solo europeu, supostamente responsável pela crise cultural ou civilizacional do Ocidente, de arrogante pretensão universalista. Na interface da epistemologia, ou também da antropologia filosófica, como se queira, apresenta-se com evidência palmar a insuficiência de modelos da pesquisa científica de caráter FUNCIONALISTA, que prescindem do sujeito, sob o pretexto paradoxal de objetividade, universalidade, eliminação do risco e da incerteza. Intenta-se, desse modo, refazer a desventura de Ícaro, na mitologia grega, que se frustra na tentativa de conquistar os céus com as suas asas de cera. Não estranha que os mais afoitos se sintam medrosos na iminência de serem conduzidos pelos algoritmo da Inteligência Artificial (as novas asas de cera da modernidade), por suposto efeito virtual da expropriação de sua liberdade de decidir. O tema não é novo. O que se propõe como contribuição ao debate é aduzir alguns elementos para a sua elucidação. Com esse propósito evocam-se algumas achegas sobre o modo como a razão veio a desgarrar-se no logos de sua equivalência às demais faculdades humanas, para se converter em faculdade soberana no Iluminismo, na sua vertente liberal kantiana, da razão excludente, em contraste com a vertente do Iluminismo espinosista, das faculdades inclusivas. A vertente kantiana ainda hegemônica na atualidade (260 milhões de acessos no google em minha consulta de 2023) é considerada como responsável pela reiteração da ideologia universalista, origem e produto da visão de mundo do Iluminismo, taxada na sua flexão semântica depreciativa como eurocentrismo. Sobre o pano de fundo projeta-se, em contraste, a emergência histórica da razão na sabedoria da Grécia Clássica, como uma faculdade de valor axiológico não mais importante nem menos importante que o conjunto das faculdades humanas, segundo a sua expressão cultural manifesta no logos. Na epistemologia do Ocidente iluminista, o logos é reduzido a uma sintaxe da realidade, de regras fixas infensas ao tempo e ao espaço, uma abstração, esvaziando-se, dessa maneira, de conteúdo e valor a semântica. Desde já, ao arrepio dos passos sequenciais da lógica analítica, assume-se aqui a precedência discursiva da semântica sobre a sintaxe no contexto do comportamento, da ação,ou pragmática, sob o postulado que as regras não presidem à realidade antes de o ser humano responder ao desafio posto à sua intencioonalidade, como sujeito e objeto ao mesmo tempo (ou sensivel e sensiente, como inseparáveis nos termos do De Anima, de Aristóteles), ao assumir a realidade como necessariamente humana, na diversidade contextual das gramáticas culturais. É o que dá a entender o napolitano Giambattista Vico (1668 - 1744), na esteira de Ibn Kaldum (1332 - 1404), seu predecessor na filosofia antropológica. A metodologia utilizada é o recurso à literatura conceitual atinente à questão, conexa a um rol de evidências empíricas. Argumenta-se no desdobramento da hipótese que o conhecimento como poder, aventado de modo pioneiro por Francis Bacon, migra da política do conceito para a política do sujeito. Como conclusão, evidencia-se que essa migração tende a consolidar um novo campo do saber tão mais vasto e promissor quanto mais incorpore na reformulação de seu quadro de categorias e referências a contribuição do saber ancestral. Esse saber caracteriza-se por assumir, como equivalente ao logos na sua inteireza, todas as faculdades humanas, distintas, porém, inseparáveis. É o que ocorre como ubuntu na África, bem-viver dos ameríndios, dos aborígenes na Oceania, dos polinésios, dos indianos, dos árabes, dos persas, da vida boa na Grécia Clássica, da harmonia na China, dentre outras referências últimas do existir, dentre as quais se destaca, para nós embebidos na cultura europeia, a contrapelo do Iluminismo kantiano, o desejo prazeroso de permanecer no que se é, diferentemente, na proposta do judeu português Espinosa. Um limita-se a exaltar a racionalidade fria e soberana de sua ciência, que levaria a espécie humana à parusia; o outro, visa à complacência numa existência bem vivida, sem desatenção para com o saber, ao contrário, e para o reconhecimento de outrem, como um outro de si mesmo. Seria como retornar à própria casa, ao se remover os filtros reducionistas que nos bloqueiam, a nós ocidentais, o acesso à herança do logos na sua integridade. Esstaria aberto, assim, o caminho que nos convida à realização, a partir do aqui e agora, da condição humana em sua plenitude, uma vez liberta dos mitos do Olimpo e da razão soberana". Nivaldo Manazano

METAFÍSICA SUAREZ CORNFORD ETC BBB

https://www.theoria.com.br/edicao0410/francisco_suarez_a_metafisica_na_aurora_da_modernidade.pdf CORNFORD CORNFORD, F. M. Principium Sapientiae: as origens do pensamento filosófico grego. Trad. Maria Manuela Rocheta dos Santos. 3. ed. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian, 1989. Resenha de João Mattar. É o último livro de Cornford, em que ele revisita questões que discutiu em seus livros anteriores, principalmente From Religion to Philosophy. O final da segunda parte é inacabado. Cornord escreve muito bem, é realmente um deleite ler seus textos. A ciência dos filósofos e a experimentação não se davam no nosso nível. Tratou-se mais de observação. Hipócrates, p.ex., teria criticado a aplicação da filosofia natural, com postulados a priori, à medicina empírica. A medicina explorava a natureza do homem de baixo para cima, ao contrário da filosofia natural: “Todos os testemunhos conduzem à conclusão de que a teoria empírica do conhecimento foi uma teoria médica, formulada pela primeira vez por Alcméon. Surgiu naturalmente da reflexão sobre a maneira como o médico de facto procedia e data do período em que os médicos mais inteligentes começaram a sentir o desejo de libertar a sua arte dos seus antecedentes mágicos. Este mesmo desejo no sentido do racionalismo tinha já levado os filósofos de Mileto a libertar a cosmogonia do seu aparato mitológico. Mas enquanto o filósofo recorreu a postulados abstractos sobre o estado originário das coisas, o médico, com a sua atenção constantemente fixada em casos individuais que era preciso resolver na prática, seguiu o caminho oposto, partindo da observação do particular para a generalização.” (p. 67). Os primeiros filósofos não faziam experiências nem ciência como as fazemos hoje. O interesse de Platão pela matemática (por conceitos, não pela realidade empírica) tem origem pitagórica. Daí a importância da teoria da anamnesis ou reminiscências: recordamos o que já sabíamos. Essas teorias têm ligação com a imaginação do poeta e do vidente, mais do que do médico-empirista. Há portanto uma natural aproximação entre poetas, videntes, sábios e filósofos: “[...] nem a teoria de Demócrito nem a de Platão constituiriam uma invenção, pois as 3 figuras que eles associam – o profeta, o poeta e o sábio – estavam originariamente reunidas numa figura só.” (p. 140). O xamã, no Oriente, reunia as figuras do profeta, poeta e sábio, num paralelo com os pitagóricos. Os filósofos teriam consciência de sua herança dos xamãs, com a religião e moral misturadas com matemática, astronomia e música. Em certo momento, começa na Grécia um conflito entre o vidente e o filósofo, uma separação entre o vidente (que prevê o futuro) e o poeta (que canta o passado), entre o vidente e o filósofo. As objeções dos racionalistas ao antropomorfismo dos mitos gera também a separação entre a filosofia e a poesia, quando o sobrenatural converte-se em metafísica. Na segunda parte do livro, Cornford estuda Anaximandro e os elementos míticos das cosmogonias, que não são um raciocínio livre sobre a realidade. O hino a Zeus em Hesíodo tem origem em ritos. É também explorada a história da vida de Zeus. No Oriente, o mito cosmogônico é uma coisa contada, enquanto o ritual é a coisa feita. O mito, quando racionalizado, perde partes do rito e, portanto, torna-se ininteligível em outras culturas. Cornford explora o paralelismo entre Marduk e Zeus, além de mitos cananeus e rituais palestinos. Os filósofos naturais gregos oferecem explicações sem a utilização de deuses, num retorno dos universais míticos sem vestes antropomórficas. O livro termina com um Apêndice, em que W. K. C. Guthrie, que também escreveu o Prefácio da obra, procura resumir o que provavelmente seria a conclusão do livro de Cornford, valendo-se para isso de anotações do próprio autor. O Apêndice termina assim: “O perigo de terminar com este sumário insatisfatório está em poder transmitir a impressão errada de que os primeiros filósofos gregos (e dos povos antigos foi só entre os Gregos que se realizou esta transição do mito para a filosofia) nada mais fizeram do que repetir as lições do mito numa terminologia modificada. Torna-se assim talvez necessário lembrar, primeiro, que, pelo que toca aos Iônios, este ponto é tratado no princípio do capítulo X e, segundo, que (como se salienta no capítulo I) a especulação milesiana não representa de modo algum a totalidade do empreendimento levado a cabo pelo pensamento científico grego primitivo. Há ainda a tradição médica, prática quanto à sua finalidade, experimental nos seus métodos, que pouco a pouco constituiu um corpo de conhecimentos sistemáticos, baseados na observação repetida dos factos e abertamente hostil às afirmações mais dogmáticas dos filósofos.” (p. 425) FRANCISCO SUÁREZ: A METAFÍSICA NA AURORA DA MODERNIDADE Juliano de Almeida Oliveira1 RESUMO O presente trabalho quer apresentar, ainda que em grandes linhas, a contribuição de Suárez para a metafísica,sobretudo a novidade metodológica na apresentação de seu pensamento e a mudança de orientação quanto aoobjeto desta área filosófica, o que lhe garantiu notoriedade. A partir desses pontos, buscar-se-á também mapear a recepção e as repercussões de sua obra. https://www.theoria.com.br/edicao0410/francisco_suarez_a_metafisica_na_aurora_da_modernidade.pdf