domingo, 8 de julho de 2012

a crise atual do Capital, por David Harvey, com legenda PT

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O papel do Brasil na criação da Operação Condor


O papel do Brasil na criação da Operação Condor

Por arimateia
Nós sabemos, nós lembramos, nós contamos.
Impressionante e histórico depoimento de um jornalista que dedica sua vida a denunciar as ditaduras latino-americanas.
Seminário Internacional sobre a Operação Condor
Câmara dos Deputados – Brasília, Brasil – 5/julho/2012
As garras do Brasil na Condor
Luiz Cláudio Cunha *
A mais longa ditadura da maior nação do continente não poderia ficar de fora do clube mais sinistro dos regimes militares da América do Sul. O Brasil dos generais do regime de 1964 estava lá, de corpo e alma, na reunião secreta em Santiago do Chile, em novembro de 1975, que criou a Operação Condor.
Nascia a mais articulada e mais ampla manifestação de terrorismo de Estado na história mundial. Nunca houve uma coordenação tão extensa entre tantos países para um combate tão impiedoso e sangrento a grupos de dissensão política ou de luta armada, confrontados à margem das leis por técnicas consagradas no submundo do crime.
Tempos depois, em 1991, as democracias renascidas da região construíram um difícil pacto de integração política e econômica batizado de Mercosul. Dezesseis anos antes, contudo, os generais das seis ditaduras do Cone Sul — Chile, Argentina, Brasil, Uruguai, Paraguai e Bolívia — tinham conseguido realizar, a ferro e fogo, uma proeza ainda mais improvável: um secreto entendimento pela desintegração física, política e psicológica de milhares de pessoas.
A Operação Condor trouxe para dentro do Estado ilegítimo das ditaduras as práticas ilegais da violência de bandos paramilitares, transformando agentes da lei em executores ou cúmplices encapuzados de uma dissimulada política oficial de extermínio.
O envolvimento de efetivos regulares da segurança com as práticas bandoleiras de grupos assassinos explica, de alguma forma, a leniência e depois a conivência com o crime por parte de corporações historicamente fundadas na lei e na ordem. O Esquadrão da Morte, em países como Brasil, Argentina e Uruguai, contaminou o Exército. O Exército perdeu os limites com a obsessão da guerra antisubversiva. A luta contra a guerrilha transbordou as fronteiras da lei e exacerbou a violência. A virulência clandestina e sem controle do esquadrão empolgou o Exército. O Exército apodreceu com o Esquadrão da Morte. O esquadrão confundiu-se com o Exército, o Exército virou um esquadrão.
A Condor, enfim, reconheceu tudo isso e criminalizou os regimes militares do Cone Sul.
Dois policiais resumem este mergulho criminoso do poder no Brasil e no Uruguai. O americano Dan Mitrione era especialista em interrogatórios do Serviço de Segurança Pública (OPS, na sigla em inglês), uma agência americana de fachada da CIA extinta um ano antes do nascimento da Condor. Em 16 anos de vida, treinou um milhão de policiais no chamado Terceiro Mundo. Mitrione desembarcou no Rio de Janeiro um ano antes do golpe de 1964 e ao sair, três anos depois, a OPS tinha adestrado 100 mil agentes brasileiros, 1/6 da força policial do país. Mitrione assumiu a OPS do Uruguai em 1969, quatro anos antes do golpe de Bordaberry, com um lema que definia seus princípios: “A dor precisa, no lugar preciso, na quantidade precisa, para o efeito desejado”.
O brasileiro Sérgio Fleury, delegado do DOPS, era internacionalmente conhecido como líder do clandestino Esquadrão da Morte, de onde importou métodos de combate ao crime comum para uso na repressão política. Seis meses antes do golpe de junho de 1973, o embaixador americano em Montevidéu, Charles Wallace Adair Jr., avisou Washington que oficiais da alta hierarquia militar do Uruguai foram treinados no final de 1971 pelo Brasil para combater a insurgência. Um dos treinadores brasileiro levados aos aprendizes de Mitrione era o experiente Fleury.
O embaixador detalhou a ação de órgãos de segurança da Argentina (Secretaria de Inteligência do Estado, SIDE) e do Brasil (Serviço Nacional de Informações, SNI) no apoio a grupos uruguaios clandestinos: “Os brasileiros reconhecidamente aconselharam e treinaram oficiais militares e policiais uruguaios envolvidos em grupos contra-terroristas que se responsabilizaram por atentados a bomba, sequestros e até mesmo assassinatos de suspeitos de pertencerem à esquerda radical”. Na Argentina, o delegado-chefe da Polícia Federal em Buenos Aires era Alberto Villar, fundador em 1973 da versão local do Esquadrão da Morte, a clandestina Triple A, ou Aliança Anticomunista Argentina, acusada de quase 2 mil mortes em dez anos de crimes.
Quase dois anos antes da formalização da Condor, os seis países da região fizeram uma reunião secreta em Buenos Aires, em fevereiro de 1974. O ‘I Seminário de Polícia sobre a Luta Antisubversiva no Cone Sul’ reunia os chefes da Polícia Federal, alguns deles oficiais do Exército — casos do Brasil, Argentina e Paraguai. Acertaram “novas formas de colaboração transnacional para confrontar a ameaça subversiva”, conforme o general Miguel Angel Iñiguez, chefe da Polícia Federal argentina, anunciando a decisão final de operações conjuntas “contra inimigos políticos em qualquer dos países associados”.
A preocupação anticomunista se aguçou com a revolução castrista em Cuba e entrou na pauta dos quartéis do continente, que se reuniam regularmente na Conferencia dos Exércitos Americanos (CEA). No 10º encontro, realizado em Caracas uma semana antes do golpe de Pinochet em 1973, o general brasileiro Breno Borges Fortes propôs “ampliar a troca de experiências ou informações” na guerra ao comunismo.
Em 1976, na Nicarágua do ditador Somoza, disse o chefe da delegação argentina na CEA:
— A guerra ideológica não respeita fronteiras — avisou o general Roberto Viola, que carregava no sobrenome a crença de quem não reconhece limites no combate à subversão. Quatro anos antes, este desbordamento da violência ficou evidente no Uruguai.
Em fevereiro de 1972, os guerrilheiros Tupamaros sequestraram um fotógrafo em Montevidéu. Nelson Bardessio era mais do que isso: era também policial, segurança e motorista do americano William Cantrell, o homem da CIA no Uruguai. O policial revelou ser membro do Esquadrão da Morte que agia dentro da DNII, Dirección Nacional de Información y Inteligencia, a central de polícia abastecida pela CIA de Cantrell com equipamento de tortura.
As ordens do ministro do Interior, Santiago de Brum Carbajal, eram repassadas ao esquadrão pelo vice-ministro Armando Acosta y Lara. Bardessio revelou que o próprio secretário pessoal do presidente Pacheco Areco, Carlos Piran, conseguiu junto à SIDE (a Secretaria de Inteligência do Estado argentino) a gelinita explosiva com que o Esquadrão da Morte praticou quatro atentados em Montevidéu. O motorista da CIA contou que ele fizera parte de uma equipe de cinco policiais treinados pela SIDE em Buenos Aires em “atividades antiterroristas” e “técnicas de vigilância”. Outros dois agentes, disse Bardessio, foram enviados ao Brasil para exercitar “operações de Esquadrão da Morte”.
Os futuros quadros da Condor começaram a se formar nesta geleia geral que misturava gelinita com militares, policiais, agentes secretos, torturadores e terroristas paramilitares. Ali mesmo em Montevidéu, três anos depois, a Condor começou a sair do ovo. Em outubro de 1975, nos salões exclusivos do hotel Carrasco, reuniu-se a 11ª CEA, a conferência dos Exércitos. Num encontro prévio, os chefes dos serviços secretos do continente ouviram a proposta de seu camarada chileno, um certo coronel Manuel Contreras, chefe da Dirección Nacional de Inteligência (DINA), a polícia política de Pinochet, para a criação de “um programa repressivo transnacional”.
A proposta foi aprovada, e Contreras não perdeu tempo. Despachou o vice-diretor da DINA, o coronel da Força Aérea Mário Jahn, direto de Montevidéu para Assunção, onde entregou ao general Francisco Brítez, chefe da repressão do Governo Stroessner, o convite para uma reunião “absolutamente secreta” em Santiago do Chile para o mês seguinte, novembro.
O nº 2 da DINA, antes de voltar para casa, fez uma segunda escala, um pouco acima no mapa: Brasília. Aqui, entregou o convite e a agenda de dez páginas da pomposa ‘Iª Reunión de Trabajo de Inteligencia Nacional’ a um fraterno amigo de Contreras: o general João Baptista Figueiredo, o chefe do Serviço Nacional de Informações (SNI) do Governo Geisel.
As duas ditaduras tinham muito em comum. O palácio La Moneda ainda fumegava com as bombas de sete ataques da Força Aérea quando o embaixador brasileiro Antônio Cândido Câmara Canto adentrou a Escola Militar de Santiago no instante em que o quarteto da Junta Militar prestava juramento como novo centro de poder.
– Ainda estávamos disparando quando chegou o embaixador e nos comunicou o reconhecimento – registrou o próprio Pinochet, assombrado com a ligeireza que tornou o Brasil o primeiro governo do planeta a estabelecer vínculos formais com a nova ordem.
Dissimulados, os Estados Unidos de Nixon e Kissinger esperaram baixar a poeira das bombas e só reconheceram a ditadura Pinochet treze dias depois do Brasil. O espaço aéreo chileno ainda estava fechado, horas depois do golpe, quando quatro aviões militares brasileiros pousaram na base de Santiago, oficialmente levando apenas remédios e mantimentos.
No Brasil, o apoio encoberto ao golpe foi imediato. Um acordo, articulado no Governo Médici (1969-1974) e executado no Governo Geisel (1974-1979), garantiu fuzis e munição para a repressão interna no Chile, como revelou no domingo (1/julho) a repórter Júnia Gama, de O Globo, com base em documentos inéditos do extinto EMFA (Estado-Maior das Forças Armadas). Um ofício de 17 de janeiro de 1975 revela a ordem secreta do EMFA para raspar o logotipo da República nos fuzis tipo FAL para não permitir a identificação da cumplicidade brasileira nas armas produzidas na fábrica do Exército em Itajubá, Minas Gerais.
O próprio Manuel Contreras afiara suas garras no Brasil. Um interlocutor do coronel, o americano Robert Scherrer, chefe do escritório do FBI em Buenos Aires, diz que o chileno foi treinado em Brasília. O golpe mal completara um mês quando um economista brasileiro da CEPAL foi incorporado aos dez mil prisioneiros reunidos no Estádio Nacional de Santiago. José Serra, ex-presidente da União Nacional dos Estudantes, chegou a ouvir gente fazendo interrogatório em português. Os agentes do SNI foram ao Chile depois do golpe para obter informações de esquerdistas brasileiros, enquanto oficiais chilenos vinham ao Brasil para treinamento na Escola Nacional de Informações, a ESNI – que serviu de inspiração a Contreras na formatação de sua DINA.
Entre os 24 mil documentos da Inteligência americana sobre o Chile, desclassificados no Governo Clinton, existe um memorando secreto que o general Vernon Walters, o vice-diretor da CIA, mandou em julho de 1975 ao assessor de Segurança Nacional do presidente Ford, Brent Scowcroft. Ele retransmitia o apelo que Pinochet, inusitadamente aflito pelo risco de isolamento internacional, mandava para a Casa Branca. No item 3 da nota, Walters mostrava a intimidade brasileira com Pinochet: “Os chilenos sabem que não conseguem obter ajuda direta por causa da oposição do Congresso [americano]. Querem saber se há algum modo de conseguir essa ajuda indiretamente, via Espanha, Taiwan, Brasil ou República da Coréia”.
O general americano nem precisou lembrar. Mas os quatro países, por coincidência, eram ferozes ditaduras anticomunistas.
Dois meses depois, em setembro de 1975, Pinochet e o vice-diretor da DINA, coronel aviador Mario Jahn, discutiram a expansão internacional da repressão chilena. O coronel era o homem encarregado por Contreras de pilotar as incursões além-fronteiras da Condor, desafio que sempre demandava gastos maiores. Na conversa na sala de jantar do general, presenciada por um civil amigo de Pinochet, Jahn explicou:
– Os americanos estão ajudando por meio do Brasil. Este é o momento de se mover, avançar e levar a luta para o nível mundial – propôs o coronel a Pinochet, informado de que treinamento da CIA era fornecido por meio do Brasil. Brasília era definida, na conversa, como o “canal de treinamento” de técnicas de interrogatório e tortura para os agentes da DINA.
Um memorando de 15 de setembro de 1975 de Contreras a Pinochet pede um reforço de US$ 600 mil no orçamento daquele ano da DINA. No item 1 da nota, o coronel justifica ao general: “Aumento do pessoal da DINA ligado às missões diplomáticas do Chile. Um total de dez pessoas: 2 no Peru, 2 no Brasil, 2 na Argentina, 1 na Venezuela, 1 na Costa Rica, 1 na Bélgica e 1 na Itália.”
Em 1999, o jornal O Globo deu outra pista segura sobre a presença da DINA em solo brasileiro. Ele revelou uma destinação adicional ao pedido de verbas feito por Contreras a Pinochet em 1975: o custeio dos oficiais da DINA que, a cada dois meses, faziam um curso de seis semanas no Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS) do Exército brasileiro, em Manaus, no coração da maior floresta tropical do mundo.
Durante algum tempo, um de seus principais instrutores foi o adido militar da embaixada da França em Brasília entre 1973 e 1975. O general Paul Aussaresses, especialista em inteligência, era veterano de duas épicas derrotas francesas em guerras coloniais: a da Indochina (1946-1954) e a da Argélia (1954-1962). Foi herói na Segunda Guerra Mundial, saltando de paraquedas na Normandia para fazer a ligação entre a Resistência francesa e as tropas aliadas do Dia D. Foi vilão no fronte argelino, como mestre da tortura aplicada pelas tropas paraquedistas do general Jacques Massu. Graças a Aussaresses, a França introduziu no seu vocabulário uma deformação paraestatal que só condenava nos outros povos: os macabros ‘esquadrões da morte’.
Quase duas décadas antes do jornalista Vladimir Herzog aparecer “suicidado” no porão do DOI-CODI em São Paulo, Aussaresses mandou “suicidar” em Argel um dos líderes da Frente de Liberação Nacional (FLN), o argelino Larbi Ben M’Hidi, que apareceu enforcado na prisão após um interrogatório pesado, em 1957. Na sequência, outro suicídio: o influente advogado Ali Boumendjel “atirou-se” do sexto andar do prédio onde estava preso. Em 2000, o general reconheceu que nenhum se suicidara. Ambos foram mortos pela tortura executada sob suas ordens. Mas Aussaresses não se arrependia:
– A tortura é um mal menor, mas necessário, que deve ser usado para evitar o mal maior do terrorismo.
O mesmo argumento consolador foi usado pelo general Ernesto Geisel no depoimento que prestou ao CPDOC da Fundação Getúlio Vargas, ao dizer:
— Acho que a tortura em certos casos torna-se necessária, para obter confissões. (…) Não justifico a tortura, mas reconheço que há circunstâncias em que o indivíduo é impelido a praticar a tortura, para obter determinadas confissões e, assim, evitar um mal maior — explicou Geisel.
Apesar da tolerância, o ditador brasileiro ainda simulava espanto com a ousadia da repressão de Pinochet. Em setembro de 1974, uma bomba da DINA explodiu em Buenos Aires o carro do ex-comandante do Exército chileno, Carlos Pratts, matando o general legalista e sua mulher. Quatro meses depois, quando Figueiredo sugeriu uma aproximação entre o SNI e a DINA, Geisel vetou:
— Eles que venham aqui ver a ESNI – disse o presidente, segundo anotação de 10 de janeiro de 1975 do secretário particular Heitor Ferreira, revelada pelo jornalista Elio Gaspari. Exatamente uma semana depois, o EMFA do general Geisel mandaria raspar o logotipo das armas que seu hipócrita governo fornecia clandestinamente à ditadura chilena.
Os chilenos, apesar do fingimento de Geisel, já frequentavam a Escola Nacional de Informações do SNI em Brasília desde o ano anterior, logo após a criação da DINA. O que Geisel não queria, realmente, era misturar suas tropas de repressão com as de Pinochet. Além disso, havia um erro de origem no convite de Contreras a Figueiredo para a reunião no Chile. Por definição, o SNI era um órgão de informação do presidente da República. Assim, o SNI não era o braço operacional no combate à luta armada. A missão em Santiago, por dever de ofício, cabia ao Centro de Informações do Exército.
Era o CIE que guerreava o que o SNI informava.
Esta era a lógica – e Figueiredo repassou o encargo a quem de direito, o general Confúcio Danton de Paula Avelino, o chefe do CIE, com uma recomendação especial de Geisel: reduzir a presença brasileira em Santiago. Em vez de três, como pedia Contreras, o Brasil mandaria apenas dois militares – um coronel e um major, com ordens estritas para escutar mais do que falar.
O Brasil não tinha muitas ideias para uma ação coletiva, mas queria preservar as ações bilaterais, caso a caso, quando ações repressivas fossem necessárias. Uma última recomendação de Figueiredo, repassando a ordem de Geisel: reduzir a participação brasileira à condição de observador, sem autorização para firmar nenhum documento.
Na manhã ensolarada de 25 de novembro de 1975, uma terça-feira, os dois brasileiros se juntaram a outros treze militares disfarçados de terno e gravata que ocuparam o grande salão da mansão da Alameda O’Higgins onde funcionava a Academia de Guerra do Exército, na capital chilena. A voz aguda de Pinochet ocupou um pedaço da sessão de hora e meia da abertura. Depois, Contreras assumiu o controle, pronunciando seu mantra favorito: “A subversão não reconhece fronteiras nem países”.
A repressão que assombrava o Cone Sul desde a década anterior agora tinha uma organização, um código e um método — e a loucura de sempre. A operação clandestina ganhou o nome de Condor, o abutre típico dos Andes, que agora abria suas asas sobre os povos e os países da região sem fronteiras para um terror de Estado sem limites. A velha e informal prática da troca de informações e de prisioneiros entre ditaduras camaradas tinha agora uma grife que ninguém ainda conhecia pelo nome, mas já temiam pelo terror contagiante de quem perdia parentes e companheiros, desaparecidos na treva e na noite sem fim.
A ata de fundação desse clube com licença para matar foi assinada pelos representantes de cinco dos seis países fundadores. O capitão argentino Jorge Demetrio Casas (diretor de operações do Serviço de Inteligência do Estado, SIDE), o coronel uruguaio José Fons (subdiretor do Serviço de Inteligência de Defensa, SID), o coronel paraguaio Benito Guanes Serrano (chefe do Departamento de Inteligência do EMFA), o major boliviano Carlos Mena Burgos (do Serviço de Inteligência do Estado, SIE), além do anfitrião, o coronel chileno Manoel Contreras. Os dois brasileiros dissimulados que lá estavam aprovaram tudo, mas não assinaram nada, cumprindo a ordem de Geisel de presença restrita à condição de ‘observadores’.
Até os documentos desclassificados da CIA, portanto, não conseguiam quebrar o anonimato planejado pela hipocrisia brasileira. Achei estranha esta lacuna e, durante dois anos, enquanto finalizava meu livro sobre a Operação Condor, procurei identificar a dupla enviada por Brasília. Não localizei documentos, mas os relatos de veteranos da ditadura e da comunidade de informações acabaram decifrando o mistério.
Estes são os nomes dos brasileiros ‘observadores’ que fundaram a Condor:
Flávio de Marco e Thaumaturgo Sotero Vaz.
Dois militares, dois agentes do Centro de Informações do Exército (CIE).
Dois veteranos do combate nas selvas do Araguaia (1972-1974), o maior e mais longo foco guerrilheiro do país, onde 70 combatentes comunistas de linha maoísta foram esmagados por um contingente militar que chegou a oito mil homens.
O coronel De Marco e o major Thaumaturgo estavam lá, na frente de batalha.
Quando De Marco chegou ao Araguaia, outubro de 1973, ainda resistiam 56 guerrilheiros. Quando o coronel foi embora, um ano depois, não restavam mais do que dez combatentes. Suas sepulturas nunca foram encontradas. A falta de investigação do governo sobre a violência no Araguaia levou à condenação do Brasil, em 2010, pela Corte Interamericana de Direitos Humanos da OEA.
O major Thaumaturgo, oficial paraquedista com curso de guerra na selva na Escola das Américas, no Canal do Panamá, comandava os ‘boinas pretas’ do Destacamento das Forças Especiais do Rio Janeiro, quando foi enviado ao Araguaia em 1972 com um pelotão de 36 homens. Em 1984, já coronel, Thaumaturgo assumiu o comando em Manaus do CIGS, o centro de guerra na selva onde treinaram os agentes da DINA do coronel Contreras, seu anfitrião na fundação da Condor uma década antes.
De Marco e Thaumaturgo estavam em Santiago por delegação expressa de Geisel e seu sucessor na presidência. Quando o coronel Figueiredo comandava no Rio o Regimento de Cavalaria de Guarda, De Marco servia ao seu lado. O general Figueiredo o levou com ele ao assumir a chefia do SNI e, quatro anos após fundar a Condor, De Marco subiu a rampa do poder com o presidente Figueiredo, na condição de diretor administrativo do Palácio do Planalto. O major Thaumaturgo foi cadete na academia militar do general Danilo Venturini, que dirigiu a ESNI, a escola frequentada por Contreras e seus rapazes da DINA, antes de assumir a chefia do Gabinete Militar no Governo Figueiredo.
Os brasileiros da Condor estavam, portanto, entre amigos.
Os observadores e seus chefes integravam uma irmandade.
A irmandade da Condor.
Um abutre carniceiro que via longe. Em 1979, quando a Condor ainda voava alto, um agente da CIA repetiu no Senado dos Estados Unidos uma frase do coronel Contreras:
— Iremos até a Austrália, se necessário, para pegar nossos inimigos.
Em novembro de 1978, a Condor foi até Porto Alegre para pegar seus inimigos.
É a capital brasileira do Cone Sul, no Estado que faz fronteira com a Argentina e o Uruguai. A repressão uruguaia localizou na cidade dois ativistas da esquerda ‘requeridos’ pela ditadura: Lilian Celiberti e Universindo Rodriguez Diaz. Atravessar a fronteira seca do Rio Grande do Sul parecia ser ainda mais simples do que cruzar o Rio da Prata para sequestrar opositores em Buenos Aires.
— Brasil todavia no es Argentina! — advertiu o coronel Calixto de Armas, o homem mais poderoso da repressão, chefe do Departamento II do Comando Geral do Exército, responsável pelas ações do braço operacional da Condor uruguaia, a secreta Compañia de Contrainformaciones. O coronel pairava acima das quatro Divisões de Exército do Uruguai e acima até do Organismo Coordenador de Operações Antisubversivas, o temido OCOA, a versão local do DOI-CODI. O coronel só recebia ordens de dois homens: seu chefe imediato, o general Manuel J. Nuñez, chefe do Estado-Maior, e do comandante-geral do Exército, general Gregório ‘Goyo’ Álvarez.
De Armas procurou um velho parceiro da irmandade da Condor no Brasil: o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra, o homem que no Governo Médici formou a máquina de tortura do DOI-CODI da rua Tutoia, em São Paulo, e que no Governo Geisel foi chefe em Brasília do Setor de Operações do CIE, o serviço secreto do Exército. Quando fez o contato, em novembro, De Armas encontrou o camarada de repressão comandando há dez meses um quartel de artilharia em São Leopoldo, nas cercanias da capital gaúcha. A partir das instruções de Ustra, a cadeia de comando acionada na operação de Porto Alegre mostra que a loucura da Condor tinha método e hierarquia.
O Departamento II do coronel De Armas contatou desde Montevidéu o Estado-Maior do III Exército em Porto Alegre, pedindo passe livre da Condor para os homens da Compañia de Contrainformaciones. O CIE gaúcho repassou o pedido ao chefe do CIE em Brasília, general Edison Boscacci Guedes. O coronel uruguaio foi autorizado, então, a pilotar a Condor em solo gaúcho em parceria com o DOPS, a polícia política comandada pelo nome mais famoso da repressão no sul, o delegado Pedro Seelig, que desbaratou a esquerda armada na região.
Comunicando-se pelo sistema codificado criado pela CIA para a DINA do coronel Contreras, a Condortel 3 (base Uruguai) entrou em linha com a Condortel 6 (base Brasil). Na primeira semana, a cúpula da Compañia uruguaia circulou em Porto Alegre: o comandante, major Carlos Alberto Rossel, seu subcomandante, major José Walter Bassani, e o capitão Eduardo Ramos, chefe da seção técnica. Na segunda semana, foram rendidos pelo chefe da seção administrativa, capitão Glauco Yannone. Na manhã de domingo, 12 de novembro, prenderam Lilian Celiberti na Rodoviária de Porto Alegre. O capitão Yannone e o delegado Seelig estavam lá, pela fraterna camaradagem da Condor. Universindo foi preso horas depois, com os dois filhos de Lilian — Camilo, de 8, e Francesca, de 3 anos.
Lilian e Universindo foram despidos e duramente torturados na sede do DOPS gaúcho.
O delegado Seelig observava, o capitão Yannone espancava.
O casal e as crianças foram levados pela polícia brasileira para o Chuí, na fronteira, onde os militares aplicaram novas torturas. Esperta, Lilian insinuou um encontro em Porto Alegre com o alvo principal da Condor uruguaia — Hugo Cores, o líder do PVP, o partido clandestino do qual faziam parte Lilian e Universindo. Lilian foi trazida de volta à capital gaúcha pelo chefe do setor de operações da Compañia, o capitão Eduardo Ferro, que armou uma ratonera para capturar sua presa no apartamento da uruguaia, na rua Botafogo.
Mas foi o capitão que caiu na ratonera de Hugo Cores.
Clandestino em São Paulo, e alertado pelo silêncio de seus companheiros, Hugo Cores deu um telefonema anônimo para a sucursal da revista Veja em Porto Alegre, denunciando o desaparecimento. Quando os homens armados de Ferro e Seelig ocultos no apartamento abriram a porta, com pistolas em punho, na tarde chuvosa de 17 de novembro de 1978, não surpreenderam o esperado Hugo Cores. Na verdade, foram surpreendidos pela presença inesperada de um repórter e um fotógrafo, que ficaram ainda mais surpresos com as pistolas apontadas para suas cabeças.
Conto tudo isso porque eu era o repórter, ao lado do fotógrafo JB Scalco.
Eu olhei no olho da Condor.
Encarei a escuridão sem fim do cano da pistola entre meus olhos.
Meu amigo Scalco morreu do coração cinco anos depois, aos 32 anos.
Tenho, assim, o privilégio nada honroso de ser o único repórter do Cone Sul a sobreviver às garras da Condor.
Assumi então o desafio de contar essa história e identificar seus responsáveis, na série de reportagens que produzi ao longo de dois anos na revista Veja e no livro que publiquei, 30 anos depois do sequestro.
A inesperada aparição de dois jornalistas, algo inédito no território da Condor, obrigou os chefes uruguaios e brasileiros a abortarem a operação de Porto Alegre, voltando às pressas a Montevidéu. Dessa vez, portanto, a praxe de sangue da Condor não se cumpriria: os sequestrados sobreviveram, apesar das torturas, e não puderam ser simplesmente ‘desaparecidos’.
A denúncia do sequestro dos uruguaios em Porto Alegre virou um escândalo internacional, que mobilizou a imprensa, os partidos, os advogados, as entidades de direitos humanos.
O sequestro de Universindo, Lilian e as duas crianças é uma das 81 ações reabertas na Justiça pelo presidente José Pepe Mujica contra crimes de tortura, desaparecimento forçado e sequestro nos anos da ditadura (1973-85). No próximo dia 16 de julho, segunda-feira, estarei no tribunal da calle Missiones, em Montevidéu, depondo como testemunha do sequestro a pedido da juíza Mariana Motta. Foi ela que, em fevereiro de 2011, condenou o ex-presidente Juan María Bordaberry a 30 anos de prisão por liderar o golpe de Estado de 1973 que dissolveu o Congresso e a democracia do país. Bordaberry morreu no ano passado, aos 83 anos.
O fiasco da rua Botafogo expôs ao ridículo as ditaduras do Uruguai e do Brasil, no contexto de uma operação repressiva que nunca dava errado, que nunca deixava sobreviventes.
Em 1978, a Condor deixara para trás, vivos, quatro sequestrados e duas testemunhas para contarem como era a Condor, como agia a Condor.
Como avisara o coronel Calixto de Armas, Brasil todavia no era Argentina!.
Afinal, por que fracassou a Condor em Porto Alegre?
Por duas razões principais, que desconcertaram simultaneamente brasileiros e uruguaios por detalhes que não eram comuns em seus países.
As crianças desordenaram a rotina de eficiência do delegado Seelig e seus agentes do DOPS. Ao contrário dos uruguaios, que roubavam os bebês de suas vítimas para entregá-los às famílias de seus algozes, a repressão brasileira não registra o desaparecimento de crianças, muito menos sua presença nas ações de busca e captura de guerrilheiros.
Os jornalistas abalaram a disciplina militar do capitão Ferro e seus parceiros da Compañia de Contrainformaciones. Ao contrário dos brasileiros, mais acostumados à insistente cobertura de uma imprensa mais incômoda sobre os excessos do regime, apesar da censura, a repressão uruguaia não concebia a presença inoportuna de jornalistas no seu local de trabalho clandestino.
De um lado e outro da fronteira, a Condor piscou, sem esconder a visível hesitação que impediu o assassinato que antes tudo resolvia, tudo desaparecia, tudo apagava.
No crepúsculo de seu governo, um mês após o sequestro de Porto Alegre, o general Geisel ordenou que o general Figueiredo, que assumiria a presidência em março de 1979, resolvesse o fiasco da Condor. Foi enviado ao sul o novo chefe do SNI, general Octávio Aguiar de Medeiros, que fracassou outra vez, na frustrada tentativa de simular uma explicação para o sumiço dos uruguaios.
Assim, num único episódio da Condor, envolveram-se sem sucesso os três generais mais influentes da ditadura brasileira tentando juntar as penas da Condor depenada em Porto Alegre.
Em uma entrevista que fiz em 1993 com o autor do telefonema anônimo, Hugo Cores, ele me dizia: “Todos os uruguaios sequestrados no exterior, algo em torno de 180, estão desaparecidos até hoje. Os únicos que estão vivos são Lilian, as crianças e Universindo. O sequestro de Porto Alegre foi o único realizado no Brasil e o último praticado pelo Uruguai. Depois dele, nunca mais houve outro”, festejava o líder do PVP.
A Condor voou com intensidade entre 1975 e 1980. E matou intensamente antes, durante e depois, com o método e a loucura das ondas sucessivas de governos militares que afogaram a democracia e a razão durante quase um século de arbítrio no Cone Sul. Nos cinco maiores países da região, foram exatos 92 anos somados de ditaduras que eram de um e eram de todos nós: Paraguai (1954-89), Brasil (1964-85), Chile (1973-90), Uruguai (1973-85) e Argentina (1976-83).
Nos tempos da Condor desatinada, a força matava pessoas e palavras, mas também inventava um novo léxico para tentar traduzir sua violência. No Chile da Condor emergiu uma nova palavra no dicionário da repressão, coalhado de presos e mortos. Surgiu a figura intermediária e angustiante do “desaparecido” – que quase sempre era uma coisa e outra, preso ou morto, sequência e consequência um do outro, e que tinha sobre eles a vantagem de isentar o Estado de explicações e justificativas.
Um “desaparecido” era uma dúvida, quem sabe um equívoco, talvez uma fatalidade, sempre um mistério que não incriminava ninguém e absolvia a todos – com exceção dos familiares da vítima, condenados ao desespero, subjugados pelo luto iminente, esmagados pela dor incessante. Um “desaparecido” só levantava suspeitas e mais perguntas, sem a garantia de certezas ou possíveis respostas. O “desaparecido” disseminava o medo. Do medo brotava o terror – e novas palavras.
O dicionário de terror da Condor fabricava uma expressão ainda mais assustadora, mais aflita: os no-nombrados, os N.N., cadáveres sem nome, sem cara, sem história, exumados no ninho da Condor por regimes de força sem coragem, sem caráter, sem futuro, sem passado. As pessoas com nomes desapareciam separadamente e, de repente, emergiam do solo covas coletivas apinhadas de mortos sem nome. No auge de seu poder, em 1979, o general argentino Jorge Videla fez uma contorcida exegese do que seria esta estranha criação dos regimes onde voava a Condor:
— O que é um desaparecido? Como tal, o desaparecido é uma incógnita… Enquanto desaparecido, não pode ter nenhum tratamento especial: é uma incógnita, é um desaparecido, não tem identidade. Não está nem morto, nem vivo. Está desaparecido… — consolava o general da mais sangrenta ditadura do Cone Sul.
Os tiranos que caçam os opositores da tirania começam subvertendo o idioma e o sentido lógico das coisas. Carimbam como ‘subversivo’ ao resistente que ousa desafiar a opressão. Combatem o ‘terrorista’ indefeso e manietado com o aparato pesado do terror de Estado. Pregam a defesa da lei pela ação ilegal e clandestina de seus agentes. Alegam defender a democracia impondo o arbítrio. Chamam de ‘ditabranda’ o que não passa de ditadura. Revogam Constituições para aplicar Atos Institucionais. Impõem a insegurança dos cidadãos em nome da Segurança Nacional. Torturam e matam invocando a paz e a tranquilidade. Fabricam ‘suicídios’ ou ‘atropelamentos’ quando os presos cometem o desatino de morrer sob tortura em suas masmorras. Concedem autoanistia para perdoar seus crimes imperdoáveis. Clamam pelo esquecimento para abafar a impunidade. E condenam como revanchismo o que não passa de memória.
No paraíso da Condor, os generais e seus serviçais conseguiram subverter o significado de duas das palavras mais valiosas da civilização: dignidade e liberdade.
Dignidad, no Chile da Condor, era o nome de uma colônia agrícola, 335 km ao sul de Santiago, criada por um ex-enfermeiro da Luftwaffe nazista. Era frequentada por Pinochet e pelo coronel Contreras. Era um centro de torturas e de treinamento para interrogatórios da DINA.
Libertad, no Uruguai da Condor, 5o km a oeste de Montevidéu, era o maior presídio político do país. Abrigava 600 presos políticos. Desde junho de 1980, um deles atendia pelo nome de Universindo Rodriguez Díaz, o uruguaio sequestrado em Porto Alegre.
Dignidad virou sinônimo de tortura no Chile da Condor.
Libertad virou endereço de presídio no Uruguai da Condor.
Quando veio o golpe de 11 de setembro no Chile, um dos primeiros presos foi um general da Força Aérea, Alberto Bachelet. Ficou preso seis meses no Cárcere Público de Santiago, mas o coração não resistiu às torturas, nele e em velhos camaradas. Morreu de infarto em março de 1974, um mês antes de completar 51 anos. Foi poupado de uma forte emoção da história, 32 anos depois, quando o mesmo Partido Socialista derrubado à bala por Pinochet voltou ao poder pelo voto em 2006 elegendo como presidente uma médica pediatra de 56 anos – a filha de Alberto, Michelle Bachelet.
Em janeiro de 1975, dez meses antes do nascimento da Condor, Michelle e sua mãe foram presas e levadas vendadas para Villa Grimaldi, um famoso centro clandestino da DINA em Santiago. Lá, aos 24 anos, Michelle foi torturada.
É de Michelle Bachelet esta frase que nos inspira e consola:
— Só as feridas lavadas cicatrizam.
Passados tantos anos de tanto horror, este encontro de hoje, aqui em Brasília, na capital do país que é um envergonhado sócio fundador da Condor, mostra que começamos a lavar nossas feridas com esta forte manifestação da memória coletiva.
Todos, aqui, temos uma só mensagem a quem fez e a quem tenta esquecer tudo aquilo:
Nós sabemos, nós lembramos, nós contamos.

Luiz Cláudio Cunha, jornalista, é autor de Operação
Condor: o Sequestro dos Uruguaios (ed. L&PM, 2008)
cunha.luizclaudio@gmail.com

10 cosas que debes saber sobre Peña Nieto

10 cosas que debes saber sobre Peña Nieto

Otramérica


Quizá ya lo sabes, pero quizá no. Si quieres conocer al nuevo presidente de los mexicanos disfruta este resumen del perfil de Enrique Peña Nieto elaborado por el periodista Ignacio Rodríguez Reyna, director de la revista emeequis, para el libro "Los suspirantes 2012", coordinado por Jorge Zepeda Patterson.
1 / Formación académica
Cursó del primero al cuarto año de primaria en el Colegio Plancarte de Atlacomulco, Estado de México, escuela católica atendida por las monjas de la orden Hijas de María Inmaculada de Guadalupe, congregación que forma líderes cristianos “para la transformación evangélica de la sociedad”.
Cuando la familia de Enrique se trasladó a vivir Toluca, el niño fue inscrito en la Primaria Anexa a la Normal, donde cursó quinto y sexto grados. Al terminar la educación elemental, sus padres decidieron enviarlo al extranjero, así que Enrique tomó sus maletas y viajó a Alfred, Maine, en Estados Unidos, para cursar el primer año de secundaria en la Denis Hall School, un internado privado dirigido por sacerdotes y exclusivo para varones.
En 1979, cuando contaba con 13 años de edad, Enrique volvió a México, donde continuó su formación académica en el Colegio Argos, en Metepec. Tres años después ingresó al Instituto Paideia de Toluca, donde concluyó el bachillerato.
Cursó estudios superiores de derecho entre 1985 y 1988 en la Universidad Panamericana, la institución educativa del Opus Dei. El ex gobernador del Estado de México cuenta con grado de maestría en Administración de Empresas por el Tecnológico de Monterrey.
2/ Orígenes políticos
En el Estado de México existen nombres que definen la idea del cacicazgo político. Uno de ellos es el de Severiano Peña, un hombre impulsivo que gobernó cinco veces el municipio de Acambay. Este habitante del México inmediatamente posrevolucionario es el bisabuelo paterno de Peña Nieto.
De Acambay salieron los Peña hacia el vecino Atlacomulco, donde el abuelo Arturo Peña Arcos se casó con Dolores del Mazo Vélez, hermana de Alfredo, cabeza de una de las familias que integran las venas del “grupo Atlacomulco” y padre de Alfredo del Mazo González, quien también ocupó el despacho de gobernador y es tío de Peña Nieto.
Otro tío del presidente electo, hermano de su padre, es Arturo Peña del Mazo, quien preside la Fundación Isidro, nombre de un cacique mexiquense al que se atribuye, precisamente, la fundación del ambicioso y bien consolidado grupo político de Atlacomulco. Del lado materno, el linaje del ex gobernador mexiquense también está relacionado con el poder.
Su abuelo Enrique Nieto Montiel fue un hombre sin recursos económicos pero con el buen tino de matrimoniarse con Ofelia Sánchez Colín, hermana de Salvador, entonces gobernador del estado y marcado por el signo de Atlacomulco. A los años, su cuñado convirtió a Salvador en alcalde de Atlacomulco, cargo que abandonó perseguido por acusaciones de desvío de recursos. Fue el segundo apellido de Enrique Peña Montiel el que terminaría de definir la estirpe política de la que desciende Peña Nieto.
Su tío Arturo Montiel Rojas lo precedió e impulsó de varias formas, dos de éstas fundamentales: como gobernador del Estado de México y como aspirante mexiquense a la Presidencia de la República.
Cuenta la leyenda —repetida una y otra vez por los propios políticos mexiquenses— que en los años cuarenta una agorera atlacomulquense predijo, como si ese destino fuera inevitable, que uno nacido en Atlacomulco habría de gobernar la nación.
3/ Su maestro, sus amigos
Enrique Peña Nieto no sólo dedicó la tesis de licenciatura a sus padres. Aparece, de manera destacada, Arturo Montiel “por su ejemplo, tenacidad y trabajo”.
Montiel convirtió a su joven sobrino y paisano Enrique en su preferido. Décadas atrás, lo hizo responsable de cargar con su maletín y sus secretos. De aprender de sus tácticas y estrategias. Fuera de un estrecho círculo, nadie sabe en qué momento y cómo fue que las trayectorias políticas de estos dos personajes se engarzaron de manera que, a partir de ahí, estarían enlazadas al menos durante los siguientes 20 años.
Enrique transitó por cargos menores hasta que Arturo, ya gobernador, lo hizo subsecretario de Gobierno y luego secretario de Administración. Desde ahí, sostienen sus críticos, no había manera de que no se enterara de los desvíos del erario y los negocios ilícitos atribuidos a Montiel y la familia más cercana de éste.
El tío Arturo dispuso que Enrique fuera diputado local e, inmediatamente después, que presidiera la Cámara de Diputados. Finalmente, que lo sucediera en el despacho de gobernador. Montiel Rojas intentó, por supuesto, ser el destinatario de aquella supuesta profecía de la adivina de Atlacomulco, pero las abrumadoras evidencias de enriquecimiento ilícito lo hicieron pedazos, por más que su sucesor, pariente y pupilo hiciera todo para eximirlo de evidentes actos de corrupción.
Desde su gubernatura, Peña Nieto consolidó una poderosa alianza con Televisa y TV Azteca, las dos televisoras que acaparan la señal abierta de televisión en México y a las que, según los detractores del político, se debe en buena medida el regreso del PRI a Los Pinos.
Pero la preferencia por el priista está lejos de ser gratuita. El periodista Jenaro Villamil ha estimado el monto de “3 mil 500 millones de pesos en contratos confidenciales entre el gobierno mexiquense y los consorcios televisivos para aumentar el rating de Peña Nieto”.
Otras figuras que se proyectan en el rápido ascenso de Enrique Peña son el ex presidente Carlos Salinas de Gortari y la presidenta vitalicia del sindicato magisterial, Elba Esther Gordillo.
4/ Sus héroes nacionales
Peña Nieto obtuvo el grado de licenciatura con la presentación de la tesis titulada “El presidencialismo mexicano y Álvaro Obregón”. En el texto deja ver su admiración por el general de Sonora, a quien llama “el soldado por excelencia de la Revolución”. En buena parte de las 200 páginas de su análisis, destaca las aportaciones de este jefe militar y lo llena de elogios que muestran la fascinación por su personaje histórico favorito: “uno de los estrategas típicos de nuestra historia patria”; “uno de sus estadistas más audaces e inteligentes”, que posee “excepcionales facultades militares” y es, en síntesis, un “general mártir e invicto”.
La tesis del mexiquense hace un repaso pormenorizado de las andanzas políticas y guerreras del general revolucionario, con particular énfasis en su influencia en la Constitución de 1917, proceso en el que Peña Nieto juzga que hizo importantes contribuciones.
5/ Ideas religiosas
Enrique y sus tres hermanos fueron educados en un entorno católico muy conservador, tanto en la casa como en la escuela. La religión era alentada por ambos padres, pero principalmente por don Enrique Peña del Mazo, quien, como hombre fervoroso, acudía cada viernes a la misa matutina de la iglesia de Santa María de Guadalupe, una hermosa parroquia colonial cuya construcción data del siglo XVI.
Ya instalada la familia en la capital mexiquense, Enrique asistía por las tardes al estricto grupo Familia Educada en la Fe, en el que recibía catequesis.
Muchos años después, siendo ya gobernador del Estado de México, viudo de su primera esposa, Mónica Pretelini, y bien apuntalado en su ruta hacia Los Pinos, Peña Nieto o sus representantes cabildearon con suficiente efectividad en El Vaticano —nunca nadie ha explicado a cambio de qué— para que la Iglesia católica anulara el anterior matrimonio de la actriz Angélica Rivera. Así, La Gaviota caminó al altar religioso vestida de blanco, de la mano de su exitoso y galante prometido, tal como hiciera en sus anteriores telenovelas. Las imágenes del enlace fueron profusamente difundidas en las revistas del corazón.
6 / Lecturas y autores favoritos
El próximo presidente de México es autor de un libro y dudoso lector de tres. La pifia que dimensionó su biblioteca particular ocurrió en Guadalajara, durante la presentación de México, la gran esperanza, libro que escribió y presentó en la Feria Internacional del Libro de Guadalajara a principios de diciembre de 2011.
“¿Cuáles son sus tres libros favoritos?”, le cuestionó un corresponsal al entonces precandidato presidencial del PRI, a quien la sonrisa se le desdibujó como si hubiera recibido un gancho al hígado. Sudó. La silla parecía diminuta debajo de él.
“Pues he leído varios, desde novelas, que me gustaron en lo particular. Difícilmente me acuerdo del título de los libros. La Biblia es uno. La Biblia en algún momento de mi vida y algunos pasajes bíblicos. No me leí toda la Biblia, pero sí algunas partes. Sin duda, en alguna etapa de (mi) vida, fue importante, sobre todo en la adolescencia”, dijo un vacilante Peña Nieto.
“Leería algo que seguramente mi vocación por la política alentaba este espíritu. La silla del águila, de Krauze (en realidad es obra de Carlos Fuentes). Y hay otro libro de él mismo que quiero recordar el nombre sobre caudillos, (pero) no recuerdo el título exacto”.
7 / Las mujeres
Al otro extremo de las mujeres asesinadas impunemente en el Estado de México, están las que han compartido sentimientos con Enrique Peña Nieto. Su primer matrimonio, con Mónica Pretelini, madre de los tres hijos del político, transcurrió en medio de las infidelidades de él y la participación de ella en la campaña por la gubernatura... en calidad de presidenta del club de fans de su marido.
Tras la pronunciada depresión de Mónica, sobrevino su sorpresiva muerte a comienzos de 2007, en circunstancias tales que se generaron sospechas e insinuaciones sobre la supuesta responsabilidad del gobernador en el deceso.
Lo cierto es que mientras estuvo casado con Mónica, Peña Nieto sostuvo al menos otras dos relaciones, de las cuales resultaron dos hijos más, uno de ellos muerto de cáncer durante su primer año de vida. La madre del otro niño ha acusado al presidente electo de no cumplir con sus responsabilidades paternas.
8 / Los escándalos
• San Salvador Atenco
El 3 de mayo de 2006 la policía acudió tolete en mano a San Salvador Atenco tras una gresca en el vecino municipio de Texcoco, donde se impidió que ocho floristas se reinstalaran. Los comerciantes pidieron auxilio al Frente de Pueblos en Defensa de la Tierra, organización social que frenó la construcción del aeropuerto en tierras expropiadas a los campesinos de Atenco durante el anterior gobierno de Arturo Montiel. Tras el choque con policías federales y estatales, los “macheteros” se atrincheraron en Atenco y, durante la reyerta, golpearon a varios policías.
Peña Nieto ordenó a su fuerza pública romper el sitio a como diera lugar. Los granaderos recuperaron el lugar y detuvieron 211 personas “para el restablecimiento del Estado de derecho”. En el camino, también provocaron la muerte de dos jóvenes.
Y abusaron sexualmente y violaron a mujeres. Y torturaron a varios pobladores y activistas, algunos de ellos menores de edad. Y robaron a decenas de vecinos. Y detuvieron a personas inocentes, a las que catearon sus casas sin la orden de un juez.
La Suprema Corte de Justicia de la Nación investigó y resolvió que sí hubo graves violaciones a los derechos humanos.
Peña Nieto asumió la responsabilidad en la orden de ingreso a Atenco pero, como en todos los casos de pronunciamientos contra los gobernadores priistas —Ulises Ruiz, de Oaxaca, por ejemplo— ni el mexiquense ni cualquier otro funcionario, siquiera de mediano nivel, enfrentó consecuencia política alguna. En contraparte, el líder del Frente de Pueblos, Ignacio del Valle, fue sentenciado a 60 años de prisión que aún purga.
• La niña Paulette
La justicia mexiquense, incluida la que se imparte en los tribunales, con frecuencia se asemeja a una extraña telenovela de humor negro. Como ocurre con los espectadores de los culebrones televisivos, el ciudadano es tratado como si careciera de una mínima inteligencia.
Ese fue el caso de la niña Paulette Gebara Farah, muerta “accidentalmente”, según la conclusión oficial, en el espacio existente entre el colchón y el borde de madera de su cama, en marzo de 2010, dentro de la recámara que ocupaba en un lujoso departamento situado en la zona de Interlomas, Huixquilucan.
En medio del escándalo político y mediático, la fiscalía del Estado de México envió un equipo de peritos disfrazados con trajes especiales, como si se tratara de zona radiactiva, a una escena del crimen que para entonces ya había sido alterada por una multitud de personajes que ingresaron a la recámara de la menor sin control alguno.
Los propios policías hicieron uso del baño y todas las huellas digitales se mezclaron; varias personas durmieron en la misma cama donde siempre estuvo —según la versión oficial— el cuerpo de la niña, y aun así nadie se percató de que había manchas de orina en las sábanas.
Las trabajadoras domésticas habían realizado el tendido de la cama. En la televisión se mostraron fotografías del “antes” y del “después” de que se encontrara el cadáver, se habló de homicidio y hasta se hizo una rueda de prensa con una psicóloga que hablaba de la conducta de la madre de la menor. Los perros entrenados no percibieron la presencia de la niña, algo increíble, pues todos los cadáveres entran en descomposición en un par de días. En la conclusión final se dejó de lado un detalle que se había mencionado antes: que el cuerpo de la menor estaba dentro de una bolsa de plástico. Se habló de asfixia inducida; en un video subido a YouTube, uno de los forenses que halla el cadáver de Paulette exclama: “la madrearon”.
Hubo mil y una pistas que, contra toda lógica, fueron borradas al dictaminar que la muerte había sucedido de forma “accidental”.
9 / El feminicidio
El coro no cesa: “¡Enrique, bombón, te quiero en mi colchón!”. En medio el griterío, sólo para algunas, las más afortunadas, llegan las fotografías en color sepia de Peña Nieto con esa mirada que ignora la cámara, que se pierde en el horizonte. Y ellas caen rendidas.
La escena se ha repetido en cientos de apariciones públicas del priista. Pero existe otra secuencia que se repite en el Estado de México, una y otra vez, sin final feliz: son las mujeres golpeadas, violadas o vejadas hasta la muerte.
Las muertas mexiquenses son más, muchas más, que las de Ciudad Juárez.
No sólo son mayores los números de la tragedia. Cadáver por cadáver, las mujeres de algunos municipios mexiquenses tienen más razones para temer por sus vidas que las de aquel municipio fronterizo del norte, famoso por hospedar a “la ciudad más violenta del continente”.
Ahí están las cifras. En el Estado de México, la Secretaría de Salud federal registró la muerte por agresiones de 2 mil 673 mujeres entre 2000 y 2009.
En ese periodo, no sólo en Juárez sino en todo el estado de Chihuahua se cometieron 843 homicidios de mujeres.
En 107 de los 125 municipios las estadísticas oficiales y federales muestran que la tasa de feminicidio durante la última década está por encima del nivel nacional, que es de 2.4 mujeres por cada 100 mil mujeres residentes en el país. Y en una docena de municipios mexiquenses, el índice es superior al de Juárez, que es de 6.4 asesinatos.
10/ Placeres y gustos mundanos
La imagen que hoy conocemos de Peña Nieto se fue forjando cuidadosamente desde pequeño. De su infancia dejó el recuerdo de ser una persona preocupada por cómo viste, por su peinado, su higiene personal, el cuidado extremo del estado de su ropa. Una mujer que entabló amistad con Socorro Nieto, la madre del presidente electo, describe una escena protagonizada por el niño Enrique: “Yo le decía a Soco que él era su obra de arte. Ella siempre traía como muñequito a Quique. Le ponía pantaloncitos con tirantes, como su papá, y siempre usó el copetito, si acaso más parado en las fiestas”.
Se sabe que le gusta la música del grupo pop ochentero ABBA y las baladas románticas de Celine Dion. Mata por unas quesadillas; usa relojes Victorinox Swiss Army; su ciudad preferida es París; le agrada beber tequila, vodka o whisky; usa loción Carolina Herrera y productos Clinique para el cuidado de la piel, en particular el rostro, y entre sus películas favoritas se encuentra Un ángel enamorado.
Con los años, ha cultivado el buen vestir. La vitrina del 420 de Rodeo Drive, en Beverly Hills, es el escaparate de Casa Bijan, firma muy exclusiva para caballeros y considerada la tienda más cara del mundo en su tipo.
Bijan viste a los príncipes de Gales, Guillermo y Carlos; al rey Juan Carlos de España, y al empresario mexicano Carlos Slim. La frecuencia de con que clientes tan connotados visitan la sede de esta marca en Los Ángeles es celebrada con la exhibición de relojes de pared en que aparecen el nombre de cada uno, su país de origen y la bandera de éste. Y el magnate de las telecomunicaciones no es el único mexicano homenajeado por la boutique: también lo ha sido el nuevo presidente de México.
Fuente: http://otramerica.com/personajes/10-cosas-que-debes-saber-sobre-pena-nieto/2132