segunda-feira, 5 de agosto de 2013

Governos latino-americanos são fundamentais para esquerda dos EUA, diz economista


Para Raul Ojeda, professor da UCLA, integração atual é momento histórico na América Latina


Único representante dos Estados Unidos inscrito em todas as atividades do Foro de São Paulo, Raul Hinojosa-Ojeda vê o atual momento da América Latina como “fundamental na história global”. Com a diminuição dos níveis de pobreza e a realização de reformas tributárias em diversos países, que representam uma nova relação do estado com a economia, o continente acaba por sugerir alternativas a Estados Unidos e Europa, de acordo com o diretor-executivo do Naid (North American Integration & Development Center, da University of California, de Los Angeles, EUA).

Vitor Sion/Opera Mundi

Ojeda defende o aumento do incentivo das universidades ao intercâmbio entre alunos de diferentes países 


Economista e PH D em ciência política pela Universidade de Chicago, o acadêmico nascido no México também argumenta que o sindicalismo e os imigrantes sempre estiveram como agentes da esquerda norte-americana. Leia a entrevista abaixo.

Opera Mundi: Você foi o único norte-americano inscrito em todas as atividades do Foro de São Paulo desde o curso de formação política. Qual é o seu sentimento em relação a isso?
Raul Hinojosa-Ojeda: Um dos objetivos do Foro de São Paulo é chegar à esquerda norte-americana. Eu participei de um evento do Foro de São Paulo em Nova York, há dois meses, antecipando o XIX Encontro do Foro, e compareceu muita gente dos grupos de imigrantes latinos, em especial salvadorenhos, venezuelanos e mexicanos. Isso aconteceu dentro de um grande sindicato, o SEIU (Service Employees International Union), que tem grande história de luta.

Leia mais: Opinião - A mão que balança o berço da violência

Há uma coisa muito importante que a esquerda latino-americana precisa entender: a esquerda e o movimento trabalhista nos Estados Unidos sempre foram liderados, de alguma maneira, por imigrantes. E agora há uma nova diáspora, latino-americana, que está tendo um papel chave até mesmo dentro do Partido Democrata. Vivemos uma oportunidade de fazer aliança com os imigrantes latinos nos Estados Unidos, que são os mais agredidos em termos de falta de direitos no país. Eles representam 55 milhões de pessoas. Os latinos nos Estados Unidos produzem mais que o PIB [Produto Interno Bruto] da maioria dos países da região. Então eles podem ser uma ponte entre aqueles que estão favoráveis a uma mudança migratória nos Estados Unidos e a América Latina.

A população norte-americana está se dando conta que viveu uma década de guerras no Oriente Médio. Os Estados Unidos não tiveram, nesse período, foco na América Latina. E isso foi algo bom, porque, neste contexto, foi possível desenvolver e consolidar a esquerda por aqui.

OM: Como você vê o atual momento da integração sul e latino-americana, dentro dessa perspectiva da região ter ficado, ao menos dez anos, longe do foco prioritário da política externa dos EUA?
RHO: Vivemos na América Latina um momento de importância global histórica. Não há nenhuma outra região no mundo que esteja passando por tantas mudanças em economia, política e estrutura social da população. Em um contexto democrático, a esquerda tem capacidade de ganhar eleições e implementar políticas públicas que produzem crescimento econômico e redução dos níveis de pobreza. Ainda que exista muita desigualdade, é importantíssimo como modelo, principalmente por ser em um contexto posterior ao do Consenso de Washington.

Leia mais: Por que alguém gosta do Foro de São Paulo?

Apesar do grande interesse no modelo chinês, é muito importante que se consolide aqui a esquerda, as múltiplas esquerdas. A nova esquerda do mundo está surgindo aqui. E é interessante refletir que os objetivos de política pública para os próximos anos, não só a redução da pobreza, mas também as mudanças tributárias, redefinindo o papel do estado na economia, estão sendo pensados com muito êxito aqui. É um tema que Estados Unidos e Europa também estão lidando. Mas é necessário assegurar que a capacidade da esquerda atuar se consolide.

Leia mais: Esquerda mexicana está dividida sobre pacto com Peña Nieto

A situação do Brasil agora, com a população nas ruas, é um grande desafio. Desafio mundial, porque acontece a mesma coisa na Turquia, na Rússia, em todo o Oriente Médio. São movimentos massivos populares que estão empurrando os limites que o capitalismo definiu para a representação democrática. A grande pergunta para o PT e para toda a América latina é como aprofundar a participação desses movimentos dentro do processo de democratização. Não vai ser fácil, mas acho que é fundamental para a história mundial que os governos de esquerda latino-americanos tenham êxito. 



OM: E sobre as próximas eleições na região, como no Chile, onde há importantes lideranças no movimento estudantil? O que você espera?
RHO: Vejo o Chile com grande interesse. Lá também houve manifestações nas ruas, especialmente de jovens, que questionaram o governo atual [de Sebastián Piñera] e deram força ao ressurgimento da candidatura de Michelle Bachelet. Vai ser muito importante ver como o Partido Comunista e o Partido Socialista se aliarão no Chile.

O que vai acontecer com o Brasil em 2014 também é uma questão importante. Já há um partido no poder por três mandatos. Não se pode perder o vínculo e a liderança que o PT pode exercer nos movimentos populares.

OM: Como acadêmico, qual a sua opinião sobre a universidade na América Latina, na Europa e nos Estados Unidos?
RHO: A UCLA, onde trabalho, é a maior e mais rica universidade pública dos Estados Unidos. Há um nível acadêmico muito alto e pode servir como um tipo de modelo de excelência na educação pública. As universidades devem ser o ponto chave de investimento, para introduzir mais estudantes das camadas sociais que foram historicamente excluídas. Há muita gente que quer entrar no sistema universitário no Brasil, no México e nos Estados Unidos, por exemplo.

Leia mais: Divisão no Mercosul sobre acordo comercial com UE fica explícita no Foro de SP

Ao nível mundial, as universidades têm que ser os pontos chave também de inovação. Ser o elo de transformação da inovação tecnológica em serviço de um mundo sustentável e equitativo. E ao mesmo tempo manter o espaço de autonomia e liberdade, de aprofundamento do pensamento crítico.

Mantenho contato com acadêmicos de todo o mundo. Hoje em dia, muitos dos meus estudantes vêm da China e da Índia. É necessário mais integração entre os jovens de diferentes universidades. Os intercâmbios de estudantes e de jovens devem ser mais apoiados pelas universidades.  

Nenhum comentário:

Postar um comentário