Artigos, ensaios, pesquisas de interesse geral - política, cultura, sociedade, economia, filosofia, epistemologia - que merecem registro
domingo, 9 de março de 2025
CARTEIS
Há quase 50 ANOS, kurt Mirov, um suíço que vveu no Brasil e depois se fez eleger deputado em seu país, escreveu o clássico "A Ditadura dos Cartéis - Anatomia de um Subdesenvolvimento" (1978), a proposito do que vivenciou como empresário nestas terras. Desde então, se soube que a ditadura dos carteis só fez piorar, e muito, no Brasil, país cuja economia é controlada quase inteiramente por carteis em setores-chave da economia doméstica e nas exportações de produtos primários de caráter estratégico: alimentos, minérios e serviços de geração e distribuição de energia hidrelétrica e, agora, geração de energia verde, eólica e solar. Na contracorrente do que estão a fazer países da África, que se libertam do jugo neocolonial, o Brasil intensifica a sua dependência do antigo jugo COLONIAL, mediante, principalmente, as parcerias PPPs (parceiras público-privadas) apoiadas e em parte FINANCIADAS com dinheiro público via BNDES. Nivaldo Manzano
sábado, 8 de março de 2025
POR QUE A ÁFRICA ESTÁ FORA DO RADAR DO EXCEPCIONALISMO PLANETÁRIO DE DONALD TRUMP (EUA)?
Em uma retomada inexorável da ACUMULAÇÃO DO CAPITAL, na atualização do conceito de Marx por Rosa de Luxemburgo (1871-1919) - processo recorrente que foge à queda tendencial na taxa de lucro mediante fuga para a frente com a apropriação de mais recursos -Trump, em poucos dias, anunciou o que resta do Planeta a ser apropriado pelos EUA - Groenlândia, Canal do Panamá, Golfo do México, Lítio (Argentina, Bolívia e Chile), Palestina, Amazônia (países amazônicos, incluído Brasil de Lula e governos anteriores). Trump não menciona a Europa e a África. A Europa, sem mais recursos a explorar, nada significa praticamente; e a África, por saber que o Continente é o OUTRO DO OUTRO. O Outro, na visão de Trump, é a China, que precisaria ser eliminada do caminho da acumulação do Capital, e o OUTRO DO OUTRO é, como a mulher negra, o outro de sua discriminação, a mulher branca, ou seja, o outro DEPOIS DA CHINA. E como se deve eliminar o inimigo principal por vez, a África ficaria para depois. Eis por que deve ser mantida na penumbra, longe da visão imediata do mapa geopolítico e geoeconômico: a África, associada ao Brics (o Sul-Global) é a resposta definitiva às ambições inexoráveis da acumulação do Capital, ASSIM COMO encenada na atualidade por Trump. A seguir um apanhado do que é a África, colhido em sítios do youtube:
Ao contrário do que ocorre no resto do mundo, a população da África cresce exponencialmente. Esse gigantesco Continente, o terceiro em área territorial, com 30,330 milhões de km2, supera a Rússia (17, mi ki2), Europa (10,53 mi km2) e Estados Unidos (9,8 mi km2). O Continente Africano perde em área total apenas para a Ásia (44,58 mi km2) e Américas (42,50 mi km2).
As projeções indicam que a população da região vai dobrar até 2050, chegando a 2,5 bilhões de pessoas. Na prática, isso significa que em menos de 30 anos um quarto da humanidade poderia ser potencialmente africana.
O crescimento populacional da África ocorre duas vezes mais rápido que o do sul da Ásia e quase três vezes mais do que o da América Latina. O que impulsiona esse crescimento é uma característica peculiar dessa região: na maioria dos países africanos, pelo menos 70% dos habitantes têm menos de 30 anos. Isso contrasta fortemente com a situação no resto do mundo, onde a população envelhece rapidamente. A Europa precisaria repor a sua queda de natalidade com 2 milhões de imigrantes. América Latina e Caribe registram "o envelhecimento populacional mais célere do mundo".
A explosão demográfica da África levou a ONU a concluir que o Continente "vai desempenhar um papel CENTRAL na formação do tamanho e distribuição da população mundial nas próximas décadas"
É fácil entender a correlação positiva estreita entre população e desenvolvimento econômico e social, ao se olhar para a atualidade da China e da Índia. Nivaldo Manzano
sexta-feira, 7 de março de 2025
GUERRA CULTURAL
GUERRA CULTURAL
TEXTO DE Ivanisa Teitelroit Martins
que analisa em profundidade inédita a realidade que vivemos.
“As lógicas discursivas e a guerra cultural
vivo daquilo que o outro não sabe sobre mim. (Peter Handke, Nobel da literatura em 2019), vivo daquilo que nem eu mesmo sei de mim.
A cultura não é um elemento acessório na luta e nos conflitos políticos; ela é o campo onde se constroem as bases da hegemonia. Quem controla a cultura não apenas domina narrativas, mas define os limites do possível, orienta valores e molda a percepção da realidade. Enfrentar a guerra cultural, portanto, exige mais do que reação ou denúncia: é necessário um esforço estratégico e de longo prazo que trate a cultura como o principal território de disputa política. Apenas ao disputar a cultura de forma propositiva e estruturada será possível reverter a hegemonia conservadora e resgatar a capacidade de a cultura funcionar como uma ferramenta crítica, capaz de ampliar os horizontes do debate público e transformar a sociedade.
A guerra cultural não é um desvio da política real, mas uma de suas formas mais sofisticadas de disputa pelo poder. Ela opera no longo prazo, reconfigurando percepções, deslocando termos do debate público e redefinindo o que é socialmente aceitável ou inaceitável. Enquanto a direita utilizou esse mecanismo para consolidar sua influência, a esquerda demorou a reconhecer a cultura como um território central na luta política.
O resultado é um cenário onde o debate público foi capturado por discursos que naturalizam desigualdades, reforçam hierarquias e deslegitimam o pensamento crítico. A guerra cultural não se limita ao enfrentamento direto de ideias políticas; ela transforma valores e comportamentos em campos de batalha permanentes, onde o que está em disputa não é apenas a argumentação, mas os próprios limites do que pode ser imaginado, dito e aceito na sociedade.
Com isso, a política cede à administração de necessidades sociais que não podem modificar o quadro das relações socioeconômicas já existentes e que continuam perseverando.
O hipercapitalismo dissolve a existência humana em uma rede de relações comerciais. Hoje não há mais domínio da vida que não se despoje de um aproveitamento comercial. O hipercapitalismo faz com que todas as relações humanas se tornem relações comerciais. Toma da pessoa sua dignidade e a substitui por valor de mercado. Vivemos em uma sociedade orientada completamente pela produção, pela positividade. Ela suprime a negatividade do outro, do estrangeiro, para acelerar a circulação de produção e de consumo. O que se permite são apenas as diferenças consumíveis. O outro, a quem foi retirada a alteridade, não se pode amar, apenas consumir.
Na hipercomunicação digital tudo se mistura com tudo. Os limites entre o interno e o externo se tornaram cada vez mais permeáveis. Pessoas tornam-se interfaces de um mundo totalmente conectado. Essa desproteção digital é estimulada e explorada por um excesso do discurso do capital.
Um grau maior de informação não cria, sozinho, uma renovação ou modificação sistêmica. A busca pela transparência da “verdade digital” desencadeou um exercício de exame permanente entre o que é verdadeiro e o que é falso. A chamada “verdade digital” constantemente manipulada é um fator que estabiliza o sistema conservador ao invés de questioná-lo. Falta à transparência a negatividade que coloca em questão o sistema político-econômico preexistente, o status quo.
A sociedade da transparência é uma sociedade do positivo. Há transparência quando as coisas ficam transparentes quando se despojam de toda e qualquer negatividade, quando se tornam lisas, niveladas, quando se inserem sem resistência na corrente lisa do capital, da comunicação e da informação. As ações se tornam transparentes quando se subordinam ao processo contável, governável e controlável. As coisas se tornam transparentes quando perdem suas particularidades e se expressam apenas por seu preço. As imagens se tornam transparentes ao se alijarem de toda e qualquer profundidade hermenêutica chegando à perda de sentido.
Há uma fenda aberta no eu que impede que o sistema psíquico concorde e coincida consigo mesmo. Essa fenda se situa no lugar da não transparência e faz com que a transparência do eu seja impossível. Também entre as pessoas há uma fenda aberta. O isso que fica oculto ao eu passa pela fenda psíquica. A iluminação total, a transparência total leva a um tipo de esgotamento do sujeito. O ser humano precisa de esferas em que possa estar em si mesmo sem se preocupar com a opinião dos outros. Apenas a máquina é inteiramente transparente. O psiquismo não é uma máquina. A interioridade, a espontaneidade e a capacidade de gerar acontecimentos são opostas à transparência. O outro é que me questiona, que me arranca de minha interioridade narcísica. Temos a capacidade de ver o outro em sua alteridade se não estivermos inundados pela nossa intimidade. Por outro lado devemos preservar nossa intimidade da sociedade da transparência.
Temos que lidar hoje com uma técnica do poder, o poder smart, que não nega ou oprime nossa liberdade, mas que a esgota. É nisso que consiste a crise atual da liberdade. A avaliação algorítmica de uma pessoa contradiz a ideia da dignidade humana. Nenhuma pessoa deveria ser degradada a um objeto de avaliação. Por outro lado, se forem mantidos mistérios, segredos, estranheza ou outridade serão criados obstáculos que venham a subverter uma comunicação ilimitada, uma hipercomunicação, seus excessos e seus efeitos sobre o sujeito.
A cultura institui o sujeito como humano. Sem o aparato do campo social o sujeito não sobrevive. O sujeito é constituído a partir do campo da linguagem, do simbólico. O sujeito só́ é possível porque entra na ordem social. A constituição do sujeito está atrelada ao campo social o que é uma condição para sua existência.
Para Dessal, psicanalista argentino, o indivíduo pós-moderno é aquele que se vê obrigado a buscar soluções biográficas para problemas sistêmicos. O recurso à biografia torna-se insuficiente diante de uma lógica e de um discurso que hegemonizam uma cultura no contexto nacional e que se mostra em franca expansão no contexto internacional. O recurso à biografia se torna paliativo, sem conseguir se opor à força e a penetração do discurso do capital através da hipercomunicação, tendo como força paradoxalmente solidária o que há de mais temível e que nos espreita dentro de nós mesmos, a pulsão de morte.
Giorgio Agamben, filósofo italiano, ao longo dos anos, adverte que o estado de exceção tende cada vez mais a se tornar o paradigma predominante dos governos na política contemporânea.
Para Bauman que retoma os escritos de Freud o domínio da massa por uma minoria como a imposição coercitiva do trabalho cultural tem sido adotada pela tecnologia cumprindo o papel de neutralizar e anular o pensamento crítico.
Aparelha-se pela coação por transparência que não é um imperativo ético ou político, mas econômico. A superexposição de uma pessoa maximiza a eficiência econômica. Big Data sugere e induz um conhecimento absoluto. Na realidade coincide com o não saber absoluto. É impossível se orientar no Big Data. Uma falha na comunicação nos parece insuportável. Manifesta um vazio que deve ser contornado que compele à compulsividade por mais comunicação, mais informação.
Para a psicanálise, se isso tem efeito sobre o sujeito é devido a não admissão da falta em que o contorno somente poderá ser bordeado pela palavra singular de cada um, permitindo que se retome o pensamento crítico de um a um e coletivamente. A política enquanto esfera da coletividade e da democracia deve recuperar os princípios da solidariedade, justiça e dignidade humana e repelir a hegemonia do capital.
Para Michael Foessel, filósofo francês, a história nos convida a superar os atalhos político-midiáticos que opõem, por exemplo, o liberalismo e o fascismo. A história nos convida a uma leitura mais acurada de nossa época, frequentemente deformada por slogans. A história nos estimula a prestar atenção às diferentes lógicas discursivas.
Deste ponto de vista a força da extrema-direita traduz a gramática da insegurança cultural que causa sofrimentos cuja origem é econômica e social. É urgente repolitizar a questão da extrema-direita no momento em que esta se beneficia ao máximo da ilusão de despolitização característica de uma época supostamente pós-ideológica. No momento em que um sentimento se torna ressentimento coletivo contra estrangeiros e enquanto política de governo americana. O efeito é o surgimento de uma hostilidade crescente a qualquer alteridade.
É importante ter ciência de que a extrema-direita dispõe de um corpo coerente de referências que se baseiam em um imaginário voltado para a desigualdade. A penetração do discurso da extrema-direita no espaço público intelectual e midiático se deve a um certo estágio de nossas economias, mas também a uma infraestrutura material que se apoia em novas tecnologias e no esquecimento da história.
É urgente reconhecer a técnica e a lógica do discurso da extrema-direita, analisar sua base ideológica para repolitizar o discurso, recuperar o protagonismo em defesa da estabilidade e do fortalecimento da democracia, voltar a reconhecer a origem da desigualdade socioeconômica e desenvolver políticas públicas que se voltem à igualdade e à equanimidade. Além de criar condições a todo e qualquer sujeito de viver a alteridade e a diferença no enlaçamento amoroso social contrário à pulsão de morte que inadvertidamente pode se associar à ilusão do discurso do capital, à compulsão à hipercomunicação e ao imperativo econômico da transparência absoluta.”
Ivanisa Teitelroit Martins em
17 de fevereiro de 2025
quinta-feira, 6 de março de 2025
Fernando Pessoa o guardador de rebanhos
O meu olhar é nítido como um girassol.
Tenho o costume de andar pelas estradas
Olhando para a direita e para a esquerda,
E de vez em quando olhando para trás...
E o que vejo a cada momento
É aquilo que nunca antes eu tinha visto,
E eu sei dar por isso muito bem...
Sei ter o pasmo essencial
Que tem uma criança se, ao nascer,
Reparasse que nascera deveras...
Sinto-me nascido a cada momento
Para a eterna novidade do Mundo...
Creio no Mundo como num malmequer,
Porque o vejo. Mas não penso nele
Porque pensar é não compreender...
O Mundo não se fez para pensarmos nele
(Pensar é estar doente dos olhos)
Mas para olharmos para ele e estarmos de acordo…
Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é,
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem sabe porque ama, nem o que é amar...
Amar é a eterna inocência,
E a única inocência é não pensar...
“O Guardador de Rebanhos”, de 08/03/1914, In Poemas de Alberto Caeiro. Fernando Pessoa.
DA COISA E DO PROCESSO
DA COISA E DO PROCESSO
Alvin Toffler (1928 - 2016) , estadunidense, escritor e doutor em letras e ciência, de pendores futuristas, maravilhava-se ante o progresso das ciências, cada vez mais analítica na dissecação da realidade em partes cada vez menores. Ao que a opinião contrária vê nisso um retrocesso, ao impulsionar a tendência da pesquisa científica a saber cada vez mais de cada vez menos. Essa visão de mundo de dividir a realidade em partes de um todo que não se estuda, na observação do Prêmio Nobel de Fisiologia, o francês François Jacob, opõe-se frontalmente à sabedoria da Grécia Clássica (e também da sabedoria oriental), que começa pelo todo, a partir do qual estudam-se os seus desdobramentos, não em partes estanques, mas na sua CONTINUIDADE e na sua DESCONTINUIDADE, ao mesmo tempo. É nesse curto circuito da lógica binária do sim x não, do certo x errado que os gregos antigos enxergavam o DEVIR do Cosmos. Ou seja, há uma continuidade descontínua nas manifestações do Cosmos, dos Titãs aos deuses do Olimpo, destes às divindades menores, aos semideuses, aos heróis míticos, aos homens, aos animais, às plantas e às pedras. De acordo com a mitologia grega, tais manifestações engendram-se umas às outras num ciclo recorrente do nascer e do perecer, assim como ocorre na metamorfose dos insetos de ciclo completo, o da borboleta, por exemplo. Da mitologia os gregos retiraram a inspiração de sua filosofia, segundo o historiador francês Jean-Pièrre Vernant, dentre outros. Tem-se, então, do lado dos gregos o PROCESSO e do lado de Alvin Toffler a COISA, na modernidade dos modelos usuais de pesquisa científica. Entendam-se como "coisa" também os conceitos, coisas mentais, abstrações, que se caracterizam por suas DELIMITAÇÕES distintivas, ao passo que o PROCESSO, sem começo nem fim, não se delimita em segmentos, reais ou conceituais. Assim, por exemplo, a criança, que não é uma coisa, não é divisível na sua transição para a adolescência, à diferença de um queijo, divisível em pedaços. É verdade que a arte macabra que tornou célebre Jack Estripador, o bandido londrino que esquartejava as suas vítimas, ao tratá-las como coisa, perde força nos modelos da pesquisa científica, cada vez mais inclinados a tratar a realidade como processo, ou seja, partindo da consideração do todo. Ao entrar em contato, por leitura, com um novo autor por mim desconhecido, intento saber, em primeiro lugar, como ele trata a realidade, se coisa ou se processo. Identifico, assim, um número pequeno, porém, crescente, de autores voltados à ideia de processo, mais consentânea com o modo como experimento minha existência, um desenrolar de mim mesmo rumo à incompletude, graças à qual entrevejo possibilidades de caráter exponencial de permanecer como sou, diferentemente, ao escandir as modalidades lúdicas de papeis que venha a desempenhar. COISA é com Alvin Toffler e seus amigos da dissecação anatômica da existência. Tudo isso para dizer que me é difícil compartilhar do entusiasmo avassalador pela Inteligência Artificial, uma COISA tecnológica, que assusta mais do que empolga. A IA capta fragmentos de minhas manifestações nas redes informáticas e me devolve na forma de um todo vicário, ajambrado estatisticamente, que pretende me convencer de que sou eu, convertido em COISA. Não seria esse o sentido profético da metáfora da barata em Kafka, ou em Clarice Linspector? Nivaldo Manzano
quarta-feira, 5 de março de 2025
TEMPO ZERO
QUIPROCÓ A PROPÓSITO DO TEMPO ZERO
Em uma postagem no facebook fui chamado à atenção por não precisar o tempo (a data, a época) em que ocorreu o fato. Assim procedi deliberadamente em consonância com o propósito que tinha em vista e, ao que parece, não me fiz entender. Desencadeou-se a partir daí um debate com o interlocutor, pois o que eu tinha em vista implicava associar dois eventos, distantes entre si no tempo LINEAR (tempo do relógio),é verdade, mas com outro intento. Eu me referia à MUDANÇA DE UM CONTEXTO PARA OUTRO CONTEXTO, correspondente aos dois eventos, mudança contextual que não implica DURAÇÃO, Por isso, por convenção, chama-se TEMPO ZERO, noção corrente na engenharia de software, retirada da VISÃO DE PROCESSO, OU CONTEXTUAL, que contrasta com a visão LINEAR da geodésia do tempo, que é o estudo da rotação da Terra, rotação que fundamenta a convenção cultural da medida do tempo linear pelo relógio.///
Há várias noções de tempo, e a disciplina que cuida disso é a ANTROPOLOGIA CULTURAL, que é o estudo da diversidade entre as culturas, e o tempo tem aí o seu papel de caráter DIFERENCIAL. Deixo de lado as várias noções culturais do tempo, para ir direto ao ponto: o TEMPO ZERO. Apenas menciono dois marcos na coleção cultural dos tempos: o tempo da teoria da relatividade de Einstein, que rompe com a visão clássica de um tempo único em todos os lugares; e o tempo do filósofo francês Henry Bergson, que propõe a existência de um tempo único mediante a ideia de DURAÇÃO, num sentido anti-einsteiniano. Tempo zero não tem duração, tampouco é único, embora também não seja diverso. TEMPO ZERO é tempo nenhum e isso não é um paradoxo.///
Para um indígena que jamais tenha sabido da existência de uma arma de fogo, ao vê-la em operação, irá associar por analogia a arma de fogo ao seu arco e flecha. Dar-se conta disso não implica transcurso de tempo algum. Do mesmo modo, praticamos o tempo zero no computador quando, ao toque de um dedo, mudamos de um aplicativo para outro, de um sistema operacional para outro etc. Por que outro? Porque cada aplicativo tem a sua sintaxe, ou seja, os seus componentes e as suas regras de operação, assim como o jogo de xadrez difere do jogo de damas: nesse caso, muda-se o tabuleiro, mudam-se as pedras e as regras que estabelecem o modo como cada uma pode deslocar-se frente às outras. Não transcorre tempo linear algum quando me vem a ideia de mudar do contexto da sala de visita para o contexto do quarto de dormir, ao improvisar o sofá como cama, para um cochilo. O sal é branco no contexto do olhar; amargo no contexto do paladar e cristal no contexto do tato. Isso é dizer que os OBJETOS, os EVENTOS, os FATOS mudam de contexto de acordo com a REFERÊNCIA assumida por mim. E ainda: posso reutilizar soluções anteriores, eventos anteriores, fatos anteriores, retidos na memória, que passam a ser escandidos sob novas referências, um novo contexto. Ou seja, TEMPO ZERO é o TEMPO DA MUDANÇA DE UM CONTEXTO PARA OUTRO CONETEXTO. Nivaldo Manzano
Agronegócio e china
ATÉ QUANDO VAI DURAR A BONANÇA DO AGRONEGÓCIO NO BRASIL?
Um mil toneladas de produção de alimentos por habitante/ano. Essa é a convenção - e toda convenção é fungível - estabelecida por especialistas em segurança alimentar nos anos 1950. A China, segundo informa a Reuters (05.02.2025), elevou a sua previsão de produção para este ano para 700 milhões de toneladas métricas e anuncia a sua meta de elevar a sua produção de 50 milhões toneladas/ano. Isso significa dobrar em QUINZE ANOS o montante da produção prevista para 2025. Caso não ocorram obstáculos climáticos ou de outra natureza, a autossuficiência alimnentar visada pela China deverá ser alcançada dentro de 15 anos, quando, então, hipoteticamente, deverá não mais depender da importação de alimentos. A China tem como meta recuperar 6,7 milhões de hectares de áreas desérticas com pastagens e florestas, até 2025. O objetivo está dentro 14º Plano Quinquenal, que começou em 2021 e termina em 2025. O país tem a maior área desertificada do mundo, com 2,5737 milhões de km2 (quase 1/3 de seu território) e 1,6878 milhão de km2 de áreas de solo arenoso, segundo dados de 2019 da Administração Nacional de Florestas e Pastagens. /// A propósito, Burkina Faso, país da África Ocidental, que acaba de se livrar de meio século sob jugo neocolonial francês, anunciou hoje (05.03.2025) o lançamento de seu novo projeto de produção irrigada de 2 mil hectares, que se incorporam a áreas já em produção de arroz e frutos como tomate (50 t/dia de massa de tomate) e a criação de peixes no sistema tanque-rede (flutuante), com previsão de produção de 300 mil toneladas/ano, ou 830 toneladas/dia. Outros países da África Ocidental, como Mali e Niger, igualmente libertos do jugo francês, propõem-se a realizar projetos semelhantes, todos eles com vistas à autossuficiência alimentar em curto prazo (cinco/dez anos). Dinheiro AGORA não falta: são países ricos em minérios estratégicos, como ouro e urânio, atualmente sob controle nacional e é de sua exportação que obtêm divisas para aquisição de tecnologia. Burkina Faso produz 150 toneladas de ouro por ano e deverá concluir em 12 meses o projeto de sua refinaria./// O neocolonalismo francês deixou como herança nos países que explorou os mais baixos Índices de Desenvolvimento Humano (IDH) do Continente. Uma revolução social associada a movimentos de libertação nacional agita uma vintena de países da África, uma revolução ignorada pela imprensa corporativa ocidental. Em iniciativa pioneira no Ocidente, pelo menos DEZ países africanos proíbem a exportação de matérias-primas vegetais e minerais em estado bruto, obrigando à sua agregação de valor in loco, diferentemente do que faz o Brasil, ainda preso ao esquema colonial. Nivaldo Manzano
Porque parece dificil entender o que pensa o chinês
PORQUE PARECE DIFÍCIL ENTENDER A CABEÇA DE UM CHINÊS
Admirador do que se passa na China, meu filho, em viagem de trabalho ao país, notou com estranheza o espírito fortemente COMPETITIVO que grassa entre os chineses, especialmente entre os jovens. Deu-me, assim, a oportunidade de lhe explicar como na cabeça de um chinês cabe AO MESMO TEMPO o sentido de COMPETIÇÃO e o sentido de SOLIDARIEDADE. Nós, do Ocidente, ainda sujeitos à mentalidade ILUMINISTA (predominância absoluta da RAZÃO, como faculdade soberana sobre as demais, a saber, a intuição, os sentimentos, a ética e a estética)) valorizamos o CONCEITO (abstrações) no lidar com os afazeres humanos, em contraste com a mentalidade ORIENTAL, que valoriza espontaneamente o modo de pensar EM PROCESSO (contexto). O conceito, a que se chega por abstração lógica (e, em geral, também matemática) é de caráter DUALISTA: "é ou não é", sendo que ambas as opções excluem-se mutuamente. Na visão em processso, tem-se "é e também não é", de acordo com o contexto, que tem como referência o ser humano. Assim, ambas as opções conciliam-se mutuamente, de modo SOLIDÁRIO E CONFLITVO. O processo é de caráter MONISTA. De modo que, sem se considerar contraditório, o chinês se enxerga como "individualista" (no dizer ocidental), na defesa e afirmação do próprio interesse, ao mesmo tempo que solidário na defesa e afirmação da COMUNIDADE (solidariedade). Aqui não entra nenhuma consideração que remeta à ideia de oportunismo. Por influxo do ILUMINISMO, de base exclusivamente racional e egotista (ideologia liberal) , fomos privados do sentido constitutivo de COMUNIDADE, porém, ainda muito vivo entre os ameríndios e demais povos que não sofreram a investida da mentalidade eurocentrista. Há dois mil e quinhentos anos, Aristóteles escreveu em seu livro "Ética a Nicômaco" que o maior risco para a democracia é a acumulação de dinheiro em mãos de poucos, do que resulta o afrouxamento dos laços comunitários e daí, a sua ruína. Nivaldo Manzano
terça-feira, 4 de março de 2025
POR QUE LEIO COISAS ASSIM?
POR QUE LEIO COISAS ASSIM?
Nestes tempos ásperos, de grosseria, arrogância, impolidez, incivilidade, desrespeito, rudeza, ignorância empafiosa, encontro oportunidade de catarse (será?) na leitura de biografias de tipos oportunistas, malandros, argentários, bajuladores, ladrões de casaca, golpistas, matreiros, campeões da dissimulação e outras adjetivações elevadas à enésima potência, integrantes da mesma constelação semântica, que se alçaram aos píncaros do prestígio junto às cortes europeias nos séculos XVII e XVIII, tendo sido responsáveis por decisões políticas que mudaram o destino de Estados, em razão de suas habilidades de dar nó em pingo d'água. Refiro-me a Joseph Fouché, por exemplo, que saltou dos jacobinos, na sua amizade com Robespièrre, na Revolução Francesa, ao Diretório e ao Imperio, como escudeiro, conselheiro e chefe de polícia de Napoleão Bonaparte, um mágico da calhordice, natureza de réptil, provavelmente a personalidade pública mais odiada em seu tempo, que mereceu memórias escritas com fel por todos os que experimentaram o dissabor e a repulsa moral de lhe estar próximo nas suas incumbências institucionais. Ao nteressado, sugiro a leitira de "Fouché", por Stefan Zweig, Rio de Janeiro, Nova Fronteira, 1985, livro de sebo, barato. Outra biografia, verdolenga do mesmo fel é a de Nicolas Fouquet, nobre francês, jesuíta, bispo, ministro na Revolução Francesa e no Império Napoleônico, considerado como fundador da polícia política e conhecido como "o judas da Revolução" (Veja-se a página do google de acessos ao seu nome). O terceiro é o cardeal Giulio Mazarino (1602- 1661), tutor de Luis XIV, herdeiro intelectual nas artes diplomáticas do cardeal Richelieu. Mazarino, envolvente, se valeu de sua conversa labiosa para estar junto ao leito da raínha Ana de França, ocasiões em que ela que lhe abria as portas de acesso ao saque financeiro que praticou no convívio dos poderosos que frequentou. As suas peripécias de golpes ladinos encontram limite na imaginação. Mas o que me provocou sincero engulho foi a leitura de seu "Breviário dos políticos", um vademecum, como sugere o título, com recomendações aos principiantes, de um cinismo tal que me fez arrepiar a pele e sustar a leitura a meio caminho, algo que não me ocorrera antes. Reconheço, porém, que há estômagos mais fortes do que o meu. Nivaldo Manzano
PARA O SER HUMANO A NORMA
PARA O SER HUMANO A NORMA É A CAPACIDADE DE MUDAR DE NORMA" (Georges Canguilhem)
Passam-se os anos, e algumas ideias sedimentam-se em mim com a intensidade de um encantamento. Todas elas têm como referência última a existência, que não tem outra referência senão a si mesma. Existir é inventar-se a si mesmo, movido pelo desejo de permanecer no que se é, diferentemente, como diz Espinosa. O filósofo diria que existir é conjugar os verbos e advérbios modais nas suas infinitas flexões. Desejo sair de mim mesmo em busca de outrem, como objeto do desejo, que retorna à minha consciência como exponenciação da variedade dos modos de existir, mediante a representação de novos papeis, um reflexo caleidoscópico de minhas potencialidades, nas quais busco realizar-me, recorrentemente. A felicidade não está no fim da viagem, a última estação. Nessa visão de mundo, o que importa é o MODO de viajar.
Em contraste, as ontologias - todas elas - buscam agarrar-se a um pau de enchente metafísico, inseguras e medrosas de si mesmas. Toda ontologia, assim como a Bíblia, desdobra-se numa narrativa, com começo, meio e fim. E para tanto impõe-se uma visão do tempo como transcurso entre o antes e o depois. Para nós, ocidentais, a aferição costumeira do tempo é a do relógio mecânico (agora digital), que faz do tempo algo à disposição do ser humano à maneira de um taxi estacionado no ponto, à espera de percorrer um caminho que se estende à sua frente, antes de se anunciar para onde pretende ir. Tanto esse sentimento é premente na atualidade, que se fala em TRAJETÓRIA de vida, uma metáfora retirada da Física, que descreve o deslocamento de um corpo, se consciente, rumo a um objetivo determinado. Não há ideologia que não comece por submeter à sua forja a noção de tempo. Assim, Platão, em sua República, contrapondo-se ao tempo cíclico do mito, inaugura no Ocidente o tempo LINEAR. Com Platão, somos advertidos de que é preciso chegar a algum lugar determinado, não se admitindo mais que o caminho se faça ao caminhar, como escreve o poeta espanhol Antonio Machado, possivelmente inspirado na sabedoria do Tao. Que lugar é esse de Platão? Sabem-no os filósofos, que ele elegeu para conduzir a cidade (Estado). Assim, com o tempo linear, caberá a uns mandar e aos demais obedecer. O tempo linear é o do progresso automático, da ontologia, do messianismo, da utopia, que tem aqui a função de gerar, alimentar e manter o estado de salivação feérica em que se debate a vítima, em resposta à expectativa de uma existência que se frustra, porque lhe é oferecida em migalhas, fragmentos de uma experiência que se quer plena a cada instante. Trata-se de uma ontologia associada ao monoteísmo, que se converte em modelo na Mecânica newtoniana, sob a égide do deslocamento, uma ontologia que é tambem uma ÉTICA, a ÉTICA DO DEVER SER, que se impõe indistintamente à maçã de Newton e ao ser humano. A opção de "liberdade" assim oferecida a ambos é a mesma: dizer sim à lei da gravidade, como se para o ser humano a norma não consistisse na capacidade de mudar de norma, para sintonizar-se com o seu contexto, em estado de mudança. Por não admitir o tempo como vivência interior, assim como ocorre em outras culturas, como no Oriente ou entre os ameríndios, o tempo linear impõe-se na sua pretensão objetivista de modo autoritário e excludente. E esse é o tempo que prevalece na atualidade, o tempo do status quo, o tempo dos meritocratas que crescem à custa de puxar para cima os próprios cabelos, o tempo do mercado autorregulável, o tempo do Capital. /// A questão sobre outras modalidades do tempo, além do tempo linear, fica para uma outra postagem. Nivaldo Manzano
segunda-feira, 3 de março de 2025
trumpismo o fim do ocidente meu
O "FIM DO OCIDENTE" PRECEDE DE MUITO O TRUMPISMO
São insuficientes as avaliações que indigitam Donald Trump como coveiro do "mundo ocidental" ,entendido no calendário cultural, na sua interface axiológica (ciência dos valores humanos) como ILUMINISMO, da vertente racionalista de kant, o mundo ocidental, que há pouco menos de meio milênio se auto proclama depositário da herança compartilhada como democracia, estado de direito, direitos humanos inalienáveis, o direito à segurança física e social, direito internacional e uma ordem multilateral baseada em regras, sob a batuta dos Estados Unidos. Mas isso não é de agora, observa Guilherme Duval (https://www.socialeurope.eu/the-end-of-the-west-and-europes-future ). É preciso reconhecer que "na prática" prossegue ele, "o Ocidente frequentemente se desviou desses ideais. Os estados europeus se comportaram vergonhosamente em relação às suas colônias e a seus habitantes durante as guerras de independência, enquanto os EUA durante a Guerra Fria prontamente apoiaram ditaduras brutais para combater a URSS, desde a derrubada de Mohammad Mossadegh no Irã até Salvador Allende no Chile. A era pós-Guerra Fria não foi melhor, como demonstrado pela desastrosa invasão do Iraque". Seria necessário atentar "para as mudanças geopolíticas e da dinâmica geoeconômica subjacente, em relação às quais a presidência de Trump marca uma aceleração decisiva e provavelmente irreversível dessa tendência". E prossigamos ainda com Duval, que sinaliza "o retorno de Donald Trump ao poder nos EUA como o fim do Ocidente — a aliança entre a Europa Ocidental e os EUA, forjada nas duas guerras mundiais do século XX e solidificada durante a Guerra Fria. A queda do Muro de Berlim já havia enfraquecido esse vínculo... Os EUA vêm mudando seu foco para a Ásia e a China há anos. Essa tendência começou sob Barack Obama, que iniciou uma retirada de fato da Europa e suas regiões vizinhas...O forte apoio do governo Biden à Ucrânia desacelerou esse desligamento, mas havia pouca dúvida de que a trajetória continuaria". E ainda mais um pouco da argumentação de Durval: "Os EUA, outrora campeões do multilateralismo, não esperaram que Trump minasse as instituições globais. Washington há muito tempo criticava e desfinanciava as Nações Unidas, a UNESCO e a Organização Mundial do Comércio. Recusou-se a ratificar o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, rejeitou a sua jurisdição e recusou-se a apoiar o Protocolo de Kyoto — atrasando os esforços globais para combater as mudanças climáticas em pelo menos vinte e cinco anos. A doutrina "America First" é anterior a Trump". E por aí vai o diagnóstico de seu trumpismo.
De minha parte, sem a pretensão de ser original (longe disso), na avaliação do trumpismo recorro a uma interface da geopolítica e da geoeconomia, muito pouco evocada na atualidade, que é a da axiologia, e isso me leva às origens do pensamento ocidental, assumidas como valor de face da herança da Grécia Clássica e seus pensadores, supostamente responsáveis por inaugurar a reflexão autônoma no Ocidente, dissociada do mito. Na verdade, trata-se de uma CONTRAFAÇÃO do pensamento grego, que consiste num caricatural REDUCIONISMO, ao eleger a RAZÃO como valor supremo da reflexão humana, em prejuízo dos demais valores, quais sejam, além da razão, a intuição, a ética, a estética e os sentimentos. A HIERARQUIZAÇÃO dos valores jamais constou da sabedoria grega, assim como de TODA e qualquer visão de mundo na história da cultura e da civilização. Trata-se de uma autêntica jabuticaba eurocentrista, responsável pela arrogância suicida que veio a dar no "fim do Ocidente". Os valores humanos são distintos uns dos outros, porém, não se separam e são EQUIVALENTES na axiologia: Quem seria capaz de hierarquizá-los? Com que autoridade? Nivaldo Manzano
Trumpismo o fim do ocidente
O "FIM DO OCIDENTE" PRECEDE DE MUITO O TRUMPISMO
São infundadas as avaliações que indigitam Donald Trump como coveiro do "mundo ocidental",entendido no calendário cultural, na sua interface axiológica (ciência dos valores humanos) como ILUMINISMO, da vertente racionalista de kant, o mundo ocidental, que há pouco menos de meio milênio se auto proclama depositário da herança compartilhada como democracia, estado de direito, direitos humanos inalienáveis, o direito à segurança física e social, direito internacional e uma ordem multilateral baseada em regras, sob a batuta dos Estados Unidos. Mas isso não é de agora, observa Guilherme Duval (https://www.socialeurope.eu/the-end-of-the-west-and-europes-future ). É preciso reconhecer que "na prrática" prossegue ele, "o Ocidente frequentemente se desviou desses ideais. Os estados europeus se comportaram vergonhosamente em relação às suas colônias e a seus habitantes durante as guerras de independência, enquanto os EUA durante a Guerra Fria prontamente apoiaram ditaduras brutais para combater a URSS, desde a derrubada de Mohammad Mossadegh no Irã até Salvador Allende no Chile. A era pós-Guerra Fria não foi melhor, como demonstrado pela desastrosa invasão do Iraque". Seria necessário atentar "para as mudanças geopolíticas e da dinâmica geoeconômica subjacente, em relação às quais a presidência de Trump marca uma aceleração decisiva e provavelmente irreversível dessa tendência".E prossigamos ainda com Duval, que sinaliza "o retorno de Donald Trump ao poder nos EUA como o fim do Ocidente — a aliança entre a Europa Ocidental e os EUA, forjada nas duas guerras mundiais do século XX e solidificada durante a Guerra Fria. A queda do Muro de Berlim já havia enfraquecido esse vínculo... Os EUA vêm mudando seu foco para a Ásia e a China há anos. Essa tendência começou sob Barack Obama, que iniciou uma retirada de fato da Europa e suas regiões vizinhas...O forte apoio do governo Biden à Ucrânia desacelerou esse desligamento, mas havia pouca dúvida de que a trajetória continuaria". E ainda mais um pouco da argumentação de Durval: "Os EUA, outrora campeões do multilateralismo, não esperaram que Trump minasse as instituições globais. Washington há muito tempo criticava e desfinanciava as Nações Unidas, a UNESCO e a Organização Mundial do Comércio. Recusou-se a ratificar o Estatuto do Tribunal Penal Internacional, rejeitou a sua jurisdição e recusou-se a apoiar o Protocolo de Kyoto — atrasando os esforços globais para combater as mudanças climáticas em pelo menos vinte e cinco anos. A doutrina "America First" é anterior a Trump". E por aí vai o diagnóstico de seu trumpismo.
De minha parte, sem a pretensão de ser original (longe disso), na avaliação do trumpismo recorro a uma interface da geopolítica e da geoeconomia, muito pouco evocada na atualidade, que é a da axiologia, e isso me leva às origens do pensamento ocidental, assumidas como valor de face da herança da Grécia Clássica e seus pensadores, supostamente responsáveis, por inaugurar a reflexão autônoma no Ocidente, dissociada do mito. Na verdade, trata-se de uma CONTRAFAÇÃO do pensamento grego, que consiste num caricatural REDUCIONIOSMO, ao eleger a RAZÃO como valor supremo da reflexão humana, em prejuízo dos demais valores, quais sejam, além da razão, a intuição, a ética, a estética e os sentimentos.A HIERARQUIZAÇÃO dos valores jamais constou da sabedoria grega, assim como de TODA e qualquer visão de mundo na história da cultura e da civilização. Trata-se de uma autêntica jabuticaba eurocentrista, responsável pela arrogância suicida que veio a dar no "fim do Ocidente". Os valores humanos são distintos uns dos outros, porém, não se separam e são EQUIVALENTES na axiologia: Quem seria capaz de hierrquizá-los? Com que autoridade? NIvaldo Manzano
domingo, 2 de março de 2025
A REALIDADE NÃO SE ENTREGA NEM DEIXA DE SE ENTREGAR
A REALIDADE NÃO SE ENTREGA NEM DEIXA DE SE ENTREGAR
O OBJETIVISMO do mundo da mercadoria, o mundo do capital, reduz as interações humanas a valor de troca, desprovido, por definição, de subjetividade, ou dinheiro. Os dicionaristas, em que pese o seu mérito, insistem por profissão em definir as coisas na sua suposta objetividade; e aí fracassam, não por culpa sua, mas por causa das palavras, que se supõe sejam um espelho da realidade, como se a realidade fosse translúcida. Se não estou certo, responda-me, então: Quantos fios de cabelo são necessários desprender-se do couro cabeludo para que se possa considerar alguém como careca? Quantos acenos de indirefernça são necessários para esfriar uma paixão? Quantos atos de rebeldia são necessários para estigmatizar uma criança como rebelde? Quantos apelos da realidade são necessários para despertar alguém para a consciência de si mesmo? ASSUME-SE, e é isso o que confessam para si mesmos, envergonhados do embuste, no dicionário, os verbos, os advérbios, os substantivos, os adjetivos. Extrai-se o seu significado da MÉDIA, já que a realidade, mais ou menos virgem, não se entrega de uma vez nem deixa de se entregar. Quando a realidade se rende, enfim, às investidas abstrativas do sujeito, ela não o faz com despojamento absoluto. Ao contrário do que nos induzem as definições no dicionário, a realidade não é uma figura geométrica, e sim um saco de farinha: nunca desprende toda farinha, por mais que o agitemos. Lembra a metáfora do mistério
divino a que Santo Agostinho recorre em suas CONFISSÕES, da criança na praia, que intentava com a sua canequinha encher de água um buraco na areia, no intento de esgotar o mar.//
Uma palavra fora de contexto pode deixar-se seduzir e crer-se dotada de vocação universalista, assim como faz a moral do Bem e do Mal e a filosofia de Emmanuel Kant, o desbravador da ideologia liberal, que contaminou de pestilência objetivista os séculos da ciência sem sujeito, invocando, ao mesmo tempo, a subjetividade na apreensão do tempo e do espaço, com os seus chamados A PRIORI. Eis o BINARISMO do sujeito x objeto, que acredita em poder operar de modo unívoco, como uma FUNÇÃO, na sua pretensão de mover o mundo, como a alavanca de Arquimedes, sem se deixar mover. /// Esse é o mercado liberal, que supostamente regula a si mesmo, subordinando a comunidade às suas leis, diversamente do que pensaram os pais do liberalismo, Adam Smith e John Stuart Mill, para quem são as leis da sociedade que regulam o mercado. O mercado liberal, sem sujeito, lembra o aprendiz de feiticeiro, da lenda de Goethe, que deixa o mecanismo mover-se a si mesmo, provocando caos. Aprendizes de feiticeiro são na atualidade a Inteligência Artificial, o algoritmo e praticamente todos os ismos, que movem as pessoas infundindo-lhes a ilusão de que elas se movem por vontade própria. /// No dia em que as palavras contiverem o pleno significado do que pretendem significar, a INCERTEZA terá sido banida do mundo e, juntamente com ela, a dimensão humana da humanidade. A INCERTEZA é intrínseca à existência e é o móvel da melhoria contínua, na busca da EXCELÊNCIA, jamais plena, assim como ocorre aos contendores nos desportos, que no cotejo com o adversário se medem na emulação de si mesmos, com vistas a embates futuros. A busca da excelência, que tem como limite o ilimitado, é o desafio humano de sua benfazeja incompletude. Aristóteles foi quem introduziu na sua FILOSOFIA PRAGMÁTICA, como pioneiro no Ocidente a noção de excelência, em lugar da certeza absoluta, cabível, segundo ele, somente no contexto da lógica e da matemática, não, porém no contexto do comportamento, ou ação. Nivaldo Manzano (achegas de um ensaio de minha autoria, no forno)
sábado, 1 de março de 2025
Objetivismo meu para alex
A questão posta por mim, que você chama de filosófica, remete a uma diferença entre dois modos de pensar - duas visões de mundo, talvez. Não me sinto preso a uma visão OBJETIVISTA da realidade, o que não quer dizer que seja SUBJETIVISTA. Não enxergo a realidade como dicotômica, o certo x errado, o sim x não, o lógico x ilógico (Há também o não lógico), um lugar para cada coisa e uma coisa para cada lugar. Diferentemente de mim e dos não objtetivisgtas pensa Bertradd Russeell, por exemplo, com a sua teoria dos conjuntos. Na teoria dos conjuntos só se admitem com foro de realidade OBJETOS, conceitos,que se definem por suas delimitações, propriedades supostamente intrínsecas, como o são de fato os objetos mentais, as abstrações, os conceitos. De um conceito pode dizr-se: "Uma coisa é uma coisa e não é outra coisa, ao mesmo tempo". Minha visão de mundo reconhece a bibliotecaría como gestora da biblioteca, ao contrário de Bertrand Russell, com o seu conhecido "paradoxo da biblioteca", que não enxerga a bibliotecária porque ela não é DEFINJÍVEL, delimitável, como o é o coneito de uma COISA, como um livro. Assim, Russell só enxerga livros na biblioteca de sua teoria dos conjujntos, da qual exclui a bibliotecária. Um mundo fantasmagórico como o da lenda do aprendiz de feiticeiro, de Goethe. Essa patologia do senso comum acomente todo aquele que entende como realildade somente o que pode ser DEFINIDO OBJETIVAMENTE. identifica a realidade como um conjunto de propriedades da lógica e da matemática, sem mais, um mundo admissível somente mediante as lentes da geometria analítica, das equações diferenciais etc. Assim, por implicação, não pode admitir o SUJEITO o PONTO GEOMÉTRICO, a EXISTÊNCIA e outras ocorrências mentais, que não se EXPLICITAM como um OBJETO, porque não se definem, não são portadores de propriedades intrínsecas.
Uma visão de mundo não OBJETIVISTA aplica-se também aos FATOS, que são SUPORTES de significados, de atribuições de sentido, que variam de acordo com o CONTEXTO em que os enxergamos.No contexto da cozinha, uma faca presta-se a cortar carne e legumes; frente à ameaça de alguém, a faca converte-se em arma de defesa pessoal. O sal é branco para os olhos, amargo para o paladar e cristal para o tato. O sal é o contexto que diz o que ele é para quem dele se serve.
Assim é também a evocação de um evento histórico. Os objetivistas descreven o evento histórico como fato MENSURÁVEL pelo tempo e pelo espaço, à moda do relógio de ponteiros, na sua SUCESSÃO temporal e espacial, na sua contiguidade, no seu paralelismo, uma propriedade dos objetos, mas não da mente. Esse é o equivoco de chamar de DESCOBERTA científica o que não passa de um RECONEHCIMENTO, algo que estava lá à espera de ser apreeendido num novo contexto em que o enxergue o cientista. Até recentemente, o tomate constava da cesta de frutos e legumes da cozinha; hoje, encontra-se também na farmácia como licopeno, um carotenoide indispensável numa dieta alimentar sausável.
Estou confiante em que não existe temporalidade ALGUMA na mudança de um contexto para outro. Um novo contexto não se caracteriza por um deslocamento físico (espacial ou temporal); é uma MUDANÇA DE ESTADO para um outro estado, contexto, um processo de transição entre estados nos quais se exerga a realidade. Para um indígena que não tenha entrado em contato com uma arma de fogo, ele a reconhece sem TRANSCURSO DE TEMPO ALGUM como algo equivalente à sua flecha.
Concluo: a transposição SEM DATA da declaração do bispo eu a assumo como uma mudança de contexto, de então para hoje, como realidades EQUIVALENTES quanto à intolerância crescente no comportamento político. Torna-se desnecessário para quem enxerga a realidade em contexto, como é o meu caso, aludir a datas, que devem, sim, ser mencionadas no caso de quem se dispuser a fazê-lo, ao preço de atribuir um ÚNICO SIGIFICADO ao evento do bispo frente aos parlamentares. Não é o meu caso. Posso?
A REMOÇÃO RADICAL DAS FAKE NEWS É UMA ILUSÃO EQUIVALENTE À ERRADICAÇÃO DA MÁ FÉ NO CONTEXTO HUMANO
Ferve no Ocidente o debate sobre como limitar o poderio das Bic Techs na indução do controle das mentes, a mais terrível arma jamais
Alex Branco Para além das "torpezas das ações da direita" a evocação do passado está sujeita a uma recorrente disputa de narrativas na qual prevalece a de quem MANDA, como ocorre no diálogo entre Humpty Dumpty e Alice, num contexto de hierarquia entre os interlocutores. Toda comparação - e a evocação do passado é uma comparação - é falha, como diz o provérbio latino "Omnis comparatio mancat". Não é possível remover a má fé num contexto de exercício da liberdade, se não mediante o recurso de aduções de lado a lado. No limite da porfia vence o contendor que aduz o maior número de indícios convergentes em defesa de sua versão; e a autenticidade de tais indícios depende do grau de credibilidade e confiabilidade que se atribui a um e a outro. A cadeia de convergências é na prática ilimitada - e é por isso que o juiz sempre traz associada à sua competência algo da sabedoria peremptória de Salomão. Dito de outro modo: A Inteligência artificial - a máquina - jamais será capaz de emitir um juízo OBJETIVAMENTE justo. Felizmente, é a INCERTEZA do juízo humano que salva a nossa comum humanidade. A propósito, vale a leitura do sociólogo e filósofo polonês Zygmunt Bauman, sobre a AMBIGUIDADE, irremovível do juízo humano.
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