RÚSSIA, EM BUSCA DE SEU ESPAÇO NO NOVO CONTEXTO INTERNACIONAL
GEOGRAFIA
Importância histórica da Rússia no
século XX, implantação de um sistema socialista real e URSS e contexto inédito
na história.
ÍNDICE
1.
1. RESUMO
2.
2. INTRODUÇÃO
3.
3. MARCO TEÓRICO
1.
3.1 RÚSSIA, OCIDENTAL, ORIENTAL OU ÚNICA?
2.
3.2 O REALISMO
3.
3.3 TEORIAS DA GEOPOLÍTICA CLÁSSICA
1.
3.3.1 Teoria do Poder Marítimo
2.
3.3.2 Teoria do poder Terrestre
3.
3.3.3 A teoria das Pan-Regiões
4.
3.4 O EURASIANISMO: OS OCIDENTALISTAS, OS EXPANSIONISTAS E O NEOEURASIANISMO
NA ATUAL CONJECTURA RUSSA
1.
3.4.1 Os ocidentalistas
2.
3.4.2 Os eurasianistas
4.
4. DA URSS À RÚSSIA
1.
4.1 DA CAÓTICA RÚSSIA DE YELTSIN À RÚSSIA DE PUTIN
2.
4.2 DA RÚSSIA DE PUTIN, A RECONSTRUÇÃO DO ESTADO RUSSO
5.
5. DA MOVIMENTAÇÃO RUSSA NO SUL DO CAÚCASO E UCRÂNIA
1.
5.1 DO SUL DO CÁUCASO
2.
5.2 DAS CRISES NA UCRÂNIA
3.
5.3 DA MOVIMENTAÇÂO EM OUTRAS REGIÕES
6.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
7.
7. REFERÊNCIAS
1. RESUMO
Após o fim da URSS e o seu
desmembramento em quinze repúblicas, a Federação Russa surge em meio a grandes
problemas econômicos. Seu PIB e sua produção caiu cerca de 50%, o desemprego
chegou a atingir 25%, o que gerou uma grande desmoralização russa internacionalmente.
Mesmo herdeira do assento permanente no conselho de segurança da ONU e um
grande arsenal nuclear, a Rússia perdeu seu status de grande potência. A partir
desse contexto, o século XXI surge com grandes desafios à Rússia. Moscou agora
precisa não somente se ajustar no novo contexto internacional, mas também,
remontar sua própria identidade. Quando Putin chegou ao poder deu uma nova
dinâmica à Rússia, promoveu melhorias internas e externas e trouxe o País de
volta ao tabuleiro das Relações Internacionais. além da promoção econômica,
impulsionou também o orgulho nacional, trazendo símbolos dos tempos de glórias
como a bandeira vermelha para as forças armadas (sem a foice e o martelo), hino
e datas comemorativas da antiga URSS. Hoje verifica-se um crescente
protagonismo russo no cenário internacional, buscando estar presente em todas
as esferas econômicas, técnico-cientifica, cultural, política e militar. Na
política externa Moscou busca uma ampliação de sua área de influência, em
especial, na Eurásia. Por outro lado, o Ocidente percebendo a debilidade russa
na década de 1990, começou a avançar na antiga zona de influência soviética
através da União Europeia e principalmente da OTAN. Quando termina a Guerra
Fria, a Otan tinha somente dezessete membros, duas décadas depois passa a ter
vinte e oito membros, desses vinte e oito, doze da antiga zona de influência
soviética. A partir de 2004 com a nova rodada de expansão da OTAN e da UE, após
as revoluções coloridas, em que dois países, de grande importância para Moscou,
demostraram interesses em fazer parte das alianças ocidentais, a Rússia reage a
estes eventos, invadindo a Ossétia do Sul e Abecásia na Guerra da Geórgia em
2008 e com a anexação da Crimeia em 2014, o que será abordado neste trabalho.
Palavras-chaves: Rússia, geopolítica, Guerra da Geórgia, Ucrânia.
RESUMEN
Después del fin de la Unión de
Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS) y su disgregación en quince
repúblicas, la Federación Rusa surge en medio de grandes problemas económicos.
Su PIB y su producción cayó cerca del 50%, el desempleo alcanzó el 25%, lo que
generó una gran desmoralización rusa internacionalmente. Mismo que sea el
heredero del asiento permanente en el consejo de seguridad de la Organización
de Naciones Unidas (ONU) y de un gran arsenal nuclear, Rusia perdió su estatus
de gran potencia. A partir de ese contexto, el siglo XXI surge con grandes
desafíos para Rusia. Moscú ahora no sólo tiene que adaptarse al nuevo contexto
internacional, sino también a remontar su propia identidad. Cuando Vladimir
Putin llegó al poder dio una nueva dinámica a Rusia, promovió mejoras internas
y externas y trajo al país de vuelta al tablero de las Relaciones
Internacionales, además de la promoción económica, impulsó también el orgullo
nacional, trayendo símbolos de los tiempos de gloria como la bandera roja para
las fuerzas armadas (sin la hoz y el martillo), himno y fechas conmemorativas
de la antigua URSS. Hoy se verifica un creciente protagonismo ruso en el
escenario internacional, buscando estar presente en todas las esferas
económicas, técnico-científicas, culturales, políticas y militares. En la
política exterior Moscú busca una ampliación de su área de influencia, en
especial, en Eurasia. Por otro lado, Occidente percibiendo la debilidad rusa en
la década de 1990, empezó a avanzar en la antigua zona de influencia soviética
a través de la Unión Europea (UE) y principalmente de la Organización del
Tratado del Atlántico Norte (OTAN). Cuando termina la Guerra Fría, la OTAN
tenía sólo diecisiete miembros, dos décadas después pasa a tener veintiocho
miembros, de esos veintiocho, doce de la antigua zona de influencia soviética.
A partir de 2004 con la nueva ronda de expansión de la OTAN y la UE, tras las
revoluciones de colores, en las que dos países, de gran importancia para Moscú,
demostraron intereses en formar parte de las alianzas occidentales, Rusia
reacciona ante estos acontecimientos, invadiendo Osetia del Sur y Abjasia en la
Guerra de Georgia en 2008 y con la anexión de Crimea en 2014, lo que será
abordado en este trabajo.
Palabras-claves: Rusia, geopolítica, Guerra de Osetia del Sur,
Ucrania.
2. INTRODUÇÃO
A Rússia teve importância histórica no
contexto do século XX, participou nas duas Grandes Guerras Mundiais, na segunda
foi fundamental para a derrota da Alemanha. Em seu território realizou-se a
primeira experiência da implantação de um sistema socialista real e depois como
URSS foi, junto dos Estados Unidos, uma superpotência, contexto inédito na
história.
Após a queda da União das Repúblicas
Socialistas Soviéticas, a URSS e sua desfragmentação em quinze repúblicas, a
Federação Russa surge com uma crise intensa no comando de Boris Yeltsin. A
Rússia, na década de 1990 passa por grandes dificuldades econômicas, gerando
uma crescente desmoralização russa no cenário internacional.
Com as reformas neoliberais implementadas
por Yeltsin os problemas se agravaram, e a aceitação Ocidental, que o país
tanto buscava, foi revertida em uma tentativa de contê-lo.
Quando Putin chegou ao poder em 1999
deu uma nova dinâmica à Rússia, promoveu melhorias internas e externas e trouxe
a Rússia de volta ao tabuleiro das Relações Internacionais. A Rússia procura
ter seu espaço de influência respeitado pelo Ocidente, e o Ocidente tenta
contê-la pelo receio de sua ameaça.
Com esse ressurgimento, Moscou volta ao
cenário internacional com sua política externa hoje mais confrontante com o
Ocidente, que através da Organização do Tratado do Atlântico Norte, a OTAN e
junto com a União Europeia, UE, busca introduzir os antigos satélites
soviéticos em sua zona de influência e a Rússia tenta consolidar sua influência
por meio de organizações como a Comunidade dos Estados Independentes, (CEI),
União Econômica Eurasiana, UEE, e na parte asiática com a Organização para
Cooperação de Xangai, OCX.
Quando terminou a Guerra Fria, houve o
acordo de unificação alemã e da dissolução do Pacto de Varsóvia sem oposição
russa, mas com duas condições: a Alemanha Oriental não iria se militarizar e a
OTAN não traria os países do Pacto de Varsóvia à sua zona de influência. O que
não aconteceu. A OTAN tinha somente dezessete membros, duas décadas depois
passa a ter vinte e oito membros, desses vinte e oito, doze da antiga zona de
influência soviética.
Partindo desse contexto, surge como
problemática as intervenções russas em países soberanos, como no caso da
Geórgia e Ucrânia. Nesse sentido, quais as razões históricas e os motivos
atuais que fizeram com que a Rússia ferisse a soberania de países vizinhos?
Este trabalho parte da hipótese de que a Rússia vem buscando ter de volta o
controle de sua antiga zona de influência, que com o aumento da influência da
OTAN e UE, na Europa Oriental, utilizou a força como instrumento para
racionalizar sua política na região. Dessa forma, a Rússia apenas estaria
reagindo as expansões Ocidentais.
A partir de 2004 com a nova rodada de
expansão da OTAN e da UE, após as revoluções coloridas, em que dois países de
fundamental importância para Moscou, demostraram interesses em fazer parte das
alianças Ocidentais, a Rússia reage a estes eventos, invadindo a Ossétia do Sul
e Abecásia na Guerra da Geórgia em 2008 e com a anexação da Crimeia em 2014. A
tentativa de incorporação da Ucrânia à zona Ocidental não poderia ser aceita
pela Rússia. A Ucrânia é um dos países mais importante para a segurança russa,
talvez o principal quando se trata da região europeia.
O objetivo geral da pesquisa é analisar
a política externa russa neste início de século XXI, e buscar entender o porquê
do uso da força em países como a Geórgia e Ucrânia e entender os interesses
russos no chamado exterior próximo. Em termos objetivos e específicos,
pretende-se:
a.
Identificar a importância da presença
russa na Ossétia do Sul e Abecásia
na Geórgia;
b.
Identificar os motivos da anexação da
Crimeia ao território russo;
c.
apontar a importância da geopolítica na
política externa russa.
Neste trabalho se usará a metodologia
de pesquisa exploratória, com levantamentos bibliográficos, para se ter, dessa
forma, maior proximidade com o objeto de estudo e uma visão mais ampla
aproximada da realidade pesquisada. No segundo capítulo se abordará as duas
principais correntes teóricas que estabelecem a condução da política externa
russa. No terceiro capítulo se abordará um pouco do contexto histórico da URSS,
os motivos de sua desfragmentação em 15 estados e o surgimento da Federação
Russa, com o desígnio de entender melhor as aspirações e as debilidades do país
no momento atual. No quarto capítulo será abordado a questão da movimentação
russa na Geórgia e Ucrânia, explicando assim, os pretextos e desejos russos no
seu exterior próximo. No capítulo final, se buscará explicar as perguntas
levantadas acima com o levantamento do estudo de caso.
3. MARCO TEÓRICO
Este capítulo irá abordar os conceitos
teóricos que se entende ser os melhores para compreender a conjectura russa no
atual cenário internacional. Nesse sentido se fará um resumo das correntes
teóricas, o Realismo e da Geopolítica, o Eurasianismo. A primeira parte deste
capítulo se abordará o pensamento russo em relação à sua identidade e como a
busca por essa identidade se espelha na sua política externa também.
3.1. RÚSSIA, OCIDENTAL, ORIENTAL OU ÚNICA?
A Rússia é o maior país do globo em
termos geográficos, é banhada por três oceanos: o Atlântico, o Ártico e o
Pacífico. Um quarto de seu território está localizado na Europa, a outra parte
na Ásia. faz fronteiras com diversos países como: Finlândia, Polônia os países
Bálticos, Belarus, hoje denominado Bielorrússia, Ucrânia, também com os países
do Cáucaso, Cazaquistão, Mongólia, China, Coreia do Norte, e fronteiras
marítimas com Japão, Suécia e EUA (MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E CIÊNCIA DA
FEDERAÇÃO RUSSA, 2013). Mas afinal de contas,
a Rússia é
Ocidental, Oriental ou única?
Pedro, o Grande (1672-1725) em suas
viagens à Europa julgou o país atrasado em relação ao Ocidente, dessa forma
anunciou seu objetivo de cortar os laços do povo com seus costumes asiáticos e
ensinar como os ocidentais cristãos europeus viviam. Seguindo essa ideia, foi
lançado uma série de decretos que faria com que a Rússia passasse a adotar
cortes de cabelos ocidentais, buscaria conhecimentos tecnológicos nos moldes
europeus e etc. (KISSINGER, 2015).
Antes desse período a Rússia tinha mais
influência do lado oriental, das invasões mongóis, em que estes tinham o
controle econômico russo, mas não a influência cultural ou religiosa. também
havia a influência de Bizâncio, essa sim com peso cultural, e depois do fim do
cerco mongol, economicamente. Com as novas mudanças, Pedro, o Grande, abriu
caminho para o mar no sul do país, no mar negro, onde tomou territórios dos
turcos, e posteriormente, dos suecos no mar báltico. Dessa forma, criou uma
marinha e um porto na cidade de São Petersburgo, uma cidade criada por Pedro em
homenagem a são Pedro, mas de forma indireta, a si mesmo (SEGRILLO, 2012).
Catarina, a Grande (1762-1796), também
fez parte dessa iniciativa de transformar a Rússia em um país totalmente
europeu. Esta julgou necessário lembrar a seus súditos de que a “Rússia é um
Estado europeu” (Catarina II apud Kissinger, 2015, p. 61).
Depois de Pedro, o Grande e Catarina
II, a Grande, até 1815, a Rússia segue embalada em seu período de modernização.
na Guerra napoleônica e no congresso de Viena, a Rússia de Alexandre I
(1801-1825) teve um peso importante neste momento, e assim, há um certo
acomodamento em relação ao então desenvolvimento. O andamento da revolução
industrial na Europa deu um embalo à modernização ocidental, mas a Rússia não
seguiu o mesmo modelo, e somente na Guerra da Crimeia, no ano de 1853 a 1856,
se percebeu que o país uma vez mais está atrasado, principalmente no quesito bélico,
o que leva o país a buscar uma nova modernização. No período de Alexandre II, o
Czar “Libertador” (1855-1881) se tem sua Reforma emancipadora, no que o curso
de seu governo foi mais liberal e menos repressor, a Rússia sai de seu sistema
semifeudalista, com a abolição da servidão, e passa para um sistema próximo ao
capitalismo, com trabalho assalariado (SEGRILLO, 2012).
No século XIX, alguns pensadores se
institucionalizaram como Ocidentalistas,
enquanto outros, insistiam que a Rússia era um país único, diferente do
Ocidente, e deveria seguir seu próprio caminho, os eslavófilos. E por volta do primeiro quarto do século
XX, um novo pensamento, transverso, apareceu entre os emigrados russos, o de
que o país era tanto europeu como asiático, os mesmos diziam que os russos
estavam por formar uma grande etnia eurasiana, estes se denominaram os eurasianos (SEGRILLO, 2011).
Com o desmantelamento da URSS e a
chegada de Yeltsin, se tem a busca de um alinhamento direto com o Ocidente. Não
só o então Presidente, mas quase toda a classe dirigente do país entendia que o
único caminho para o desenvolvimento seria o alinhamento direto com o Ocidente
(PECEQUILO, 2012).
Dessa forma Andrei Kozirev assume a
pasta dos Negócios Estrangeiros no início de 1992, seguindo com uma política de
aproximação com o Ocidente, em que ele definia a Rússia como aliada natural da
Europa (FREIRE, 2009).
Com o descaso ocidental frente as
crises na Rússia, assim, se buscaram uma reformulação deste pensamento em 1993.
Dessa forma, a vizinhança próxima tornouse foco da política externa russa,
tendência que se mantém até hoje (FREIRE, 2009).
Em 1995, Levgeni Primakov assumiu o
Ministério dos Negócios Estrangeiros, este entendia que “a Rússia não tem
inimigos permanentes, mas tem interesses permanentes” também seguindo a linha
de descontentamento em relação ao ocidente, principalmente em relação ao avanço
da OTAN, Organização do Tratado do Atlântico Norte, percebendo esta como
inimiga e contrarias aos interesses russos (FREIRE, 2009). Mesmo que Primakov
tenha ficado pouco tempo na Chancelaria suas ideias seguiram na política russa
e foram mais intensas no governo Putin (AMAL, 2017). Primakov também é visto
com forte pensamento geopolítico Eurasianista, que será aprofundado adiante.
Segundo Segrillo (2011), Putin seria um
ocidentalista moderado. porque depois dos anos 2000 o país não estava mais
inabilitado economicamente, não necessitava mais um alinhamento direto com o
Ocidente, como Yeltsin tentou. Destarte, Putin é moderado por vir depois de
Yeltsin, seguir algumas políticas de alinhamento com Ocidente, mas com o país
melhor economicamente, e com sua história de grande potência (período czarista)
e superpotência (período soviético) é notável a buscar seus próprios
interesses.
O mesmo o define ocidental moderado por
questões políticas no sentindo de que Putin sabe que a população russa se
mantém em um meio termo, nem extrema ocidentalista, nem
extrema eslavófila, assim ele permanece pragmático na questão.
Outro ponto que o autor menciona, é a de que Putin é um gosudarstvennik (defensor de um Estado forte).
Dessa forma, quando este bate de frente com o Ocidente, apenas está defendendo
os interesses russos. Quando o ocidente tende a cooperar e a ser menos
confrontador, a Rússia tende a cooperar, quando o Ocidente tende a confrontar,
os aspectos estatistas, especialmente de Putin, faz com que a Rússia parta para
seus interesses nacionais, e assim o confronto com o Ocidente, afinal de
contas, a Rússia não é antiocidental, somente defende seus interesses.
Medvedev, por outro lado, estaria em um meio termo, não tão ocidentalista como
Yeltsin, nem tão moderado como Putin (SEGRILLO, 2011).
3.2. O REALISMO
O Realismo Político é umas das
principais teorias das Relações Internacionais, e tem como cerne de seu estudo
a questão do poder e do conflito, portanto, enxergando o mundo de forma
anárquica, onde não há um poder coercitivo para controlar o sistema, destarte,
os estados são independentes para fazer o que quiserem (PECEQUILO, 2012).
Os teóricos realistas, surgem após o
fracasso dos idealistas modernos no entre guerras, e buscam por meio de
clássicos da política e filosofia, como O Príncipe, de Maquiavel, e O Leviatã,
de Tomas Hobbes formularem uma leitura realista das Relações Internacionais,
produzindo o campo de estudo e a teoria realista, os primeiros modelos de
entendimento por intermédio de fatos reais, em especial do internacional
(PINTO, 2016).
Dois dos autores mais importantes do
século XX são Edward Hallet Caar, que através de sua obra Vinte anos de crise,
produziu uma dura crítica ao idealismo, e Hans Morgenthau com sua obra A
política entre as nações: a luta pelo poder e pela paz, ocorrendo assim uma
superação ao idealismo (PINTO, 2016).
O realismo parte da ideia de que os
estados são atores racionais. No cenário de anarquia do sistema internacional,
o Estado, sendo o principal ator, motivado pela preocupação de sua
sobrevivência, busca um equilibro de poder, agindo, dessa forma, por meios de
ações estratégicas (SILVA, 2010).
Para Pecequilo (2012) o equilíbrio de
poder surge das ideias do Cardeal Richelieu, do que ele chamou de raison d’état, o conceito
Razão de Estado, que estabelece que os interesses do Estado devem ser buscados
racionalmente, ou seja, visando um cálculo de custos e benefícios, sendo
julgado exclusivamente como critérios políticos, visando o incremento do poder
nacional. No governo de Bismark foram chamadas de realpolitik. Dessa forma:
“Na Alemanha unificada de Bismarck
(1815/1898), as práticas do equilíbrio de poder e a ação baseada em
considerações racionais visando o interesse do Estado passam a ser definidas
como Realpolitik” (PECEQUILO, 2012, p. 30).
Para Lacerda (2006) significa que:
Ele rege as relações entre as
potências, estipulando que todas devem ter mais ou menos a mesma quantidade de
poder, umas em relação às outras, de modo que se mantenha uma relativa
paridade, que exista um certo equilíbrio entre todas (LACERDA, 2006, p. 62).
Para os neorrealistas o conceito de
equilíbrio de poder é:
Nota-se, então, que diferente do que
coloca o realismo clássico, Waltz percebe que a política internacional é
definida pelos constrangimentos estruturais. A estrutura do sistema faz com as
ações gerem resultados inesperados. Por mais que os Estados não desejem viver
em um ambiente hostil, eles precisam resguardar seus interesses. Se um Estado
agir diferente, ele arcará sozinho com os prejuízos e isso não trará mudanças
estruturais. A questão central da contribuição de Waltz, então, é que num
ambiente anárquico, onde impera a autoajuda, os Estados tendem a buscar um
equilíbrio de poder. Para sobreviver, os Estados contam com esforços internos,
que podem ser traduzidos como o incremento das capacidades, e esforços
externos, através da formação de alianças [...] A teoria do equilíbrio de
poder, dessa forma, busca explicar um resultado que pode ser percebido no
sistema: a formação de balanças de poder. Não se trata de discutir se o
equilíbrio, uma vez alcançado, é mantido ou não. O ponto relevante é perceber
que, uma vez que o equilíbrio tenha sido alterado, ele será restaurado de uma
forma ou de outra. Isso ocorre porque o sistema estimula os Estados a buscarem
segurança, induzindo ao equilíbrio. A principal preocupação dos Estados é,
então, manter sua posição dentro do sistema, garantindo assim a sobrevivência
(DUARTE, 2011 apud REIS, 2015, p. 19).
Na década de 1970 surge o Neorrealismo,
porquanto as ideias realistas já eram contrarias às evidências empíricas na
nova realidade (período da bipolaridade da Guerra Fria). Dessa forma, sofrendo
muitas críticas dos liberais e globalistas. Nesse sentido surgem novos autores
buscando atualizar o pensamento realista, principalmente no aspecto econômico.
Os principais autores do Neorrealismo são, Robert Keohane e Joseph Nye
(LACERDA, 2006).
Para este artigo, os conceitos de Nye
sobre o poder brando, soft power e poder duro, o hard power são de
maior importância. Estes conceitos têm base da distinção entre a baixa e alta
política, ou low and high politics, emergido
no cenário europeu. Para Pecequilo:
A distinção entre a baixa e a alta
política (low and high politics) também emerge no cenário europeu, identificando
as esferas da economia e da cultura (low) e da diplomacia, do poder e da
guerra (high). No período contemporâneo, estas classificações são
intercambiáveis com as perspectivas do poder brando e duro, podendo ser
percebida a variação em seu peso ao longo dos séculos. Para a consolidação do
Estado, o poder duro estava no núcleo das preocupações, mas com a evolução de
suas dinâmicas e a maior complexidade do cenário, o brando ganhou espaço,
superando a condição secundária da baixa política (reconhecendo a
multidimensionalidade do poder) (PECEQUILO, 2012).
Dougherty e Pfaltzgraff enfatizam os
seis principais componentes compartilhados pelas visões realistas:
[...] (1) o sistema internacional é
baseado no Estado-Nação como seu atorchave (2) a política internacional é
essencialmente conflituosa, uma luta por poder em um ambiente anárquico no qual
estes Estados inevitavelmente dependem de suas próprias capacidades para
garantir sua sobrevivência (3) os Estados existem em uma condição de igualdade
de soberania, porém detêm diferentes capacidades e possibilidades (4) os
Estados são os atores principais e a política doméstica pode ser separada da
política externa (5) os
Estados são atores racionais, cujo
processo de tomada de decisão é
sustentado em escolhas que levem à
maximização de seu interesse nacional (6) o poder é o conceito mais importante
para explicar e prever o comportamento dos Estados (DOU-GHERTY; PFALTZGRAFF
apud PECEQUILO, 2012, p. 58).
3.3. TEORIAS DA GEOPOLÍTICA CLÁSSICA
No século XIX surge, com as
necessidades da revolução industrial acontecida do século anterior, e a
promoção do colonialismo, e a formação da grande Alemanha Imperial, com a
necessidade de se expandir além de suas fronteiras após a unificação dos
estados germânicos sob a coroa da Prússia, de Bismark, surge então, Friedrich
Ratzel (1844-1904) com a obra Politische Geographie (1897) como o pai da Geopolítica (CHURRO, 2013).
Para Ratzel o Estado é visto como um
organismo que vive, próspera, decai e morre. Nesse sentido, para o autor, o
futuro político do Estado depende de seu espaço e sobretudo, de suas posições
geográficas, que mantêm as relações entre os povos (REIS, 2015).
Nesse pensamento Ratzel afirma:
As fronteiras não são concebidas senão
como a expressão de um movimento orgânico ou inorgânico; as formações estatais
elementares assemelham-se, evidentemente, a um tecido celular: em tudo se
reconhece a semelhança entre as formas de vida que surgem da ligação com o solo
(RATZEL, 1987 apud BRAGA, 2011, p. 147).
Além de Ratzel, há duas outras teses
importantes para a compreensão do pensamento geopolítico clássico, a tese do
poder marítimo do almirante norteamericano Alfred T. Mahan anterior a Ratzel,
de 1890, e a tese do poder terrestre, de Halford Mackinder de 1904.
3.3.1. Teoria do Poder Marítimo
Paul Claval (apud BRAGA, 2011, p. 148)
infere que “os primeiros grandes debates geopolíticos referem-se ao papel do
mar no progresso e na supremacia dos países anglo-saxões” assim, os debates
dados neste contexto histórico eram referentes à expansão dos EUA, período em
que os EUA adquiriram o Alasca, então da Rússia, e entrou em guerras contra a
Espanha por territórios marítimos como: Cuba, Havaí e Filipinas (Braga, 2011).
Seguindo esse pensamento em 1897 Mahan
publica The interest of America in sea power, uma obra em que
ele define as doutrinas que seu país deve seguir, com três aspectos bases para
o desenvolvimento de um país que enseje ser uma potência: econômico, militar e
geopolítico (REIS, 2015).
O Aspecto econômico é baseado na
capacidade de produção e a capacidade comercial, o aspecto militar é baseado na
capacidade da força marítima que para o autor é fundamental para qualquer
Estado que tenha aspiração de ser uma potência, e por fim, no aspecto
geográfico, o autor considera como fundamental questões de posição geográfica,
o espaço territorial, população, a capacidade que o pais tem de expansão
comercial, e um governo com afetos para o domínio do mar (REIS, 2015).
Mahan baseava sua ideia de poder
marítimo em um conceito simples, se o globo é composto por quase 70% de áreas
marítimas, quem tivesse o controle dos mares teria um poder inigualável
(CHURRO, 2013).
3.3.2. Teoria do poder Terrestre
Mackinder, apesar de não usar o termo
geopolítica, pois preferia mais o termo geografia política, é considerado um
dos principais teóricos das teorias globais de poder. Ele tinha uma abordagem
diferente de Mahan, dando mais importância ao poder terrestre em face ao
marítimo (CHURRO, 2013). Em sua teoria apresentada no trabalho The Geographical Pivot of History de 1905, criou os conceitos de Heartland,
o coração da terra e da Ilha Mundial (REIS, 2015).
Mackinder classificou o mundo em duas
regiões geográficas e fundamentais. A primeira delas é a Ilha Mundial, esta
corresponderia à Europa, Ásia e a África, região em que teria ocorrido a
maiorias dos eventos e guerras mais importantes da história. A outra região,
que é o restante do mundo, ele chamou de Ilhas do Exterior. O Heartland, seria
a área pivô, sendo o centro da Ilha Mundial, referente ao território eurasiático
(REIS, 2015).
Para Mackinder, o território
euroasiático, o Heartland, que corresponde ao território Czarista, com riquezas
em diversos recursos, permite ao Estado que controlar essa região ter o
desenvolvimento de um grande poder, nesse sentido o mesmo afirma que “Quem
domina a Europa Oriental controla o Heartland; quem domina o Heartland controla a World Island; quem domina
a World Island controla
o mundo” (MACKINDER, 1919 apud BRAGA, 2011).
Figura 1 – O mundo de Mackinder
Fonte: Universia Enem, 2018. Disponível
em: <http://www.universiaenem.com.br/sistema/faces/pagina/publica/conteudo/textohtml.xhtml?redirect=27663428230511852530356729621>
Acesso em: 12 set. 2018.
3.3.3. A teoria das Pan-Regiões
Segundo o pensamento
de Mackinder, Selon Haushofer também dividiu o mundo em quatro regiões, as
Pan-Regiões, em sua obra de 1931, Geopolitik der PanIdeen, todas elas
autossuficientes em população, recursos e acesso ao Mar (CHURRO, 2013).
O principal objetivo
desta obra era manter um possível equilíbrio entre as grandes potências
mundiais satisfeitas com seus respectivos territórios de domínio, dessa forma:
Esta espécie de “Tratado de Tordesilhas
versão séc. XX” não era, no entanto novidade, na medida em que o próprio
Mackinder já tinha proposto algo semelhante. Na sua base de funcionamento, cada
uma das Pan-Regiões seria dirigida por um Estado mais forte e desenvolvido
económica e militarmente que tinha o dever de garantir o desenvolvimento dos
restantes Estados que estavam na sua órbita (CHURRO, 2013 p. 35).
Estas zonas são: Zona
Anglo-Americana, liderada pelos EUA (e suas possessões no Pacífico), que
compreende as Américas, pelas Ilhas Britânicas, pela Austrália e Nova Zelândia;
Zona Euro-Africana, liderada pelos principais países do que hoje compreende a
União Europeia, Alemanha e França. Corresponde a quase todo o território
Europeu, sem os Países Bálticos, e ainda com todo o continente africano e a
Península Arábica; a Zona Pan-Eurasiana, esta liderada pela Federação Russa,
compreendendo todos os países da Comunidade dos Estados Independentes, a CEI, a
Mongólia, a Península Balcânica, Turquia, Irã, Paquistão, Índia e os outros
países da Ásia Meridional; e a Zona do Pacífico, liderada pela China e que
compreenderia com o extremo oriente da Ásia (Japão, Taiwan e as Coreias) e o Sudeste
Asiático com mais algumas nações da Oceania (SOUSA2012).
Figura 2 – As Pan-Regiões
Fonte: Danilo R. Sousa, 2012.
Disponível
em: <https://www.researchgate.net/figure/Figura-2-O-mundosegundo-os-eurasianistas_fig2_261301541>.
Acesso em: 31 set. 2018.
3.4. O EURASIANISMO: OS OCIDENTALISTAS, OS EXPANSIONISTAS E O
NEOEURASIANISMO NA ATUAL CONJECTURA RUSSA
Em 1991, com o fim da
União das Repúblicas Socialistas Soviéticas, tem-se um vácuo geopolítico no
espaço de influência da Rússia, assim, o país precisou se reposicionar no
cenário geopolítico, pois os antigos aliados, estavam passando para a
influência geopolítico do Tratado do Atlântico Norte, a OTAN, com exceção da
Bielorrússia e Ucrânia, esta última com receio de uma divisão no país, pois a parte
oriental é muito russificada (SOUSA, 2012).
A Rússia como
herdeira do legado soviético buscou manter ao menos em um mínimo possível, sua
esfera de influência nessa região, com a criação da Comunidade dos Estados
Independentes, a CEI, em 1992 e com a chegada de Putin, com a União Econômica
Eurasiana em 2000 (VISENTINE, 2015). No âmbito desse pensamento, durante os
anos 1990 surgem duas correntes de pensamentos, os ocidentalistas e os
eurasianistas.
3.4.1. Os ocidentalistas
Os ocidentalistas,
formados por acadêmicos de pensamentos idealista-liberal, creem que a Rússia
deve buscar uma maior cooperação com o Ocidente, buscar uma modernização e sua
integração à globalização, ensejando os valores euro-americanos para ter maior
protagonismo no sistema internacional. Este grupo também percebe a aproximação
com os países islâmicos e as antigas repúblicas soviéticas da Ásia Central com
desconfiança e uma grande ameaça à segurança russa. Os mesmos também acreditam
que a Rússia é uma ponte entre o Ocidente e o Oriente.
3.4.2. Os eurasianistas
O Eurasianismo surge
em início do século XX, elaborado por um grupo de intelectuais exilados que
viam a Revolução Russa como uma transição necessária para modernizar um país
atrasado, e depois desta revolução voltariam a ser um Estado tradicionalista,
confessional e acima de tudo, nacionalista. Não acreditavam na Rússia como
Ocidental, mas juntos com os cristãos ortodoxos, os eslavos, romanos e gregos,
e com os muçulmanos, formariam a Eurásia, um espaço euroasiático (FLORETIN, 2014).
Esse pensamento
político parte da ideia de Mackinder, com a ideia do Heartland, de que quem
domina o Heartland domina o mundo, especialmente se controla a Ucrânia, (por
sua importância geográfica citada em capítulo seguinte deste trabalho)
(FLORETIN, 2014). O mesmo também afirma que a geopolítica vive de um confronto
de potências terrestres os continentalistas e as potências marítimas, as
atlanstistas (SOUSA, 2012).
Esse movimento pode
ser explicado também na questão identitária russa do Pan-eslavismo, citado
acima, que sempre esteve presente no povo russo, nesse sentido, seria o
“destino manifesto” da Rússia, recuperar os territórios que fizeram parte da
URSS e os do Império Russo (SILVA, 2010).
Estas ideias perderam
força nos anos de 1930, mas hoje a Escola Eurasianista tem como seu principal
instrutor Aleksander Dugin, professor da Universidade Estatal de Moscou e o
Instituidor do Movimento Eurásia, uma estrutura que defende as tradições
culturais russas em contraposição aos valores ocidentais manifestados na
globalização.
Dentro da corrente
política eurasianista há duas subdivisões, uma delas são os realistas, estes
notadamente compostos pelos antigos membros intelectuais do PCUS, Partido
Comunista da União Soviética. Acreditam no poder como instrumento para a busca
de controle e equilíbrio, em detrimento da cooperação internacional, nesse
sentido, creem que a Rússia deve continuar desenvolvendo seu poderio militar e
nuclear, para assim, equilibrar a balança de poder internacional contra o
Ocidente.
Para Teixeira:
Esta corrente de pensamento percebia o
ambiente externo hostil aos interesses russos e que a dissolução da URSS foi
consequência das ações premeditadas e bem planejadas pelo mundo ocidental
(TEIXEIRA, 2008 apud SOUSA, 2012).
Para Silva, (2010), o
pensamento realista russo é dividido entre defensivo e ofensivo. Defensivo pois
sabe da sua debilidade em enfrentar os EUA sozinho, e ofensivo contra a
periferia, como no caso da Geórgia, onde agiu com força pois se tinha em conta
a fragilidade do país e a não intervenção do Ocidente. Nesse sentido, se pode
conjecturar a ação da Rússia na Crimeia neste mesmo pensamento.
A outra subdivisão da
corrente eurasianista são os eurasianistas expansionistas, ou revolucionários,
que representam os ultranacionalistas de extrema direita. Da mesma forma que os
realistas defendem a competição e a expansão e as relações de poder no cenário
internacional, eles acreditam que a Rússia necessita de mecanismos para se
reafirmar no sistema caótico internacional, sendo que sua reafirmação é
determinante para sua segurança.
O nome mais
importante para a corrente eurasianista é Aleksander Dugin, cujo pensamento é
bem alinhado com a política externa russa.
Quando Putin assume o
poder, Alexander Dugin percebeu a materialização do Eurasianismo em Putin. Nas
mobilizações de 2008, os militantes do movimento eurasiático foram às ruas em
apoio à Putin. Em 2007, Dugin foi expulso da Ucrânia por fomentar a separação
entre os cidadãos russos no país, foi o primeiro a anunciar que a Rússia
interviria na Ossétia do Sul, o que rapidamente aconteceu. Dessa forma, se
percebe um alinhamento da política externa do governo russo com o teórico. A
CEE tem forte fundamento nestas ideias (FLORETIN, 2014).
O neoeurasianismo,
como é chamado hoje o movimento que teve suas estruturas ensejadas no início do
século XIX, é um projeto estratégico, geopolítico e de integração econômica do
norte do espaço eurasiano. Dessa forma, se busca na nova Rússia, a construção de
um Estado multiétnico e multireligioso, se vê a necessidade de promover
alianças externas e reforçar o estabelecimento dos eixos geopolíticos
estratégicos, como os de Berlim-Moscou, Moscou-Teerã e Moscou- Pequim (SOUSA,
2012).
O neoeurasianismo
nega o sistema globalizado e o sistema universal do Atlanticismo, visam
proteger, segundo Dugin, a diversidade dos valores russos e os do mundo. Assim,
o neoeurasianismo nega um universalismo dos valores democráticos e do
liberalismo, advogando uma ideia do mundo multipolar (SOUSA, 2012).
Aleksandr Dugin, em
sua Teoria do Mundo multipolar, traz a globalização como uma imposição do
paradigma atlântico. Para ele a globalização é unilateral, e pretende
universalizar o pensamento de uma das civilizações afim de destruir as demais
civilizações, os seus valores. Nesta teoria, se apresenta também as
civilizações divididas em quatro zonas geográficas, as mesmas citadas acima, as
zonas das Pansregiões (REIS, 2015).
Nesse sentido, em
2001, a Rússia funda em conjunto com a China e os quatro países da Ásia Central
(Cazaquistão, Uzbequistão, Quirguistão e Tadjiquistão) a Organização para
Cooperação de Xangai, que é uma reestruturação da organização Os Cinco de
Xangai, de 1996. Desde sua criação tem expandido sua relevância regional para
se tornar foco de considerável importância no jogo geopolítico da eurásia
(VISENTINE, 2015).
Para Sousa:
[...]é evidente que a Rússia está
diante de uma nova realidade geopolítica. Seus antigos aliados e pensamentos
ideológicos da era comunista, já não existem mais, e em seu entorno estratégico
há uma nova configuração de poder geopolítico, com a atração de atores externos
e reavivamento de animosidades. A Organização de Cooperação de Shangai talvez
seja o grande constructo institucional dessa realidade, uma forma de Moscou
buscar sua reafirmação como potência nessa nova conjuntura. O Eurasianismo
emerge em uma Nova Rússia em um momento de ressurgimento geopolítico, econômico
e estratégico, e provavelmente é a corrente teórica-geopolítica mais presente
em sua conduta política externa. As influências de autores geopolíticos e
realistas na construção do pensamento russo é notável, e o Eurasianismo os
canalizou em suas proposições. Se a Rússia voltará a ter o peso geopolítico que
tinha a antiga superpotência soviética ainda é incerto, porém, os mecanismos
criados nos mandatos de Putin e Medvedev contribuíram e muito para retornar o
protagonismo do “gigante russo” ao cenário internacional (SOUSA, 2012).
Dessa forma, se
percebe a influência deste pensamento político na nova política russa na virada
do século. Primeiramente a tentativa de se alinhar e de buscar uma integração
com o Ocidente, no início da década de 1990. Tendo a não aceitação que buscava,
já da metade dos anos de 1990, com Primakov se tem uma busca por uma política
mais eurasianista, que foi intensificada no governo Putin.
Em uma visão
realista, dentro ainda do pensamento geopolítico se tem um realismo assertivo,
em momentos usando o soft power, em outros o hard power. O soft nos
âmbitos dos órgãos como a CEI, UEE e OCX, em que a Rússia busca manter uma
influência de forma mais branda, ou em momentos em que o soft power não foi
suficiente, se teve o uso da força, como no caso da Geórgia e Ucrânia (FREIRE,
2008).
4. DA URSS À RÚSSIA
A URSS, depois da
Segunda Guerra Mundial junto dos Estados Unidos, alcançou o status de
superpotência, fato inédito na história das Relações Internacionais. Todavia,
nas décadas dos anos de 1960 e 1970, a URSS começou a se desestabilizar levando
ao seu fim em 1991. O capítulo está focado nessa dimensão.
No período entre
guerras, e sobretudo na década de 1930 época da grande depressão no Ocidente, o
crescimento da economia soviética esteve mais elevado que a de todos os outros
países, menor apenas que a do Japão. Prontamente, nos quinze anos depois da
Segunda Guerra, as economias de todo o campo socialista cresciam mais rápido
que as do Ocidente (HOBSBAWAN, 1995). Com relação aos EUA, nas décadas de 1930
a 1950, a URSS estava crescendo três vezes mais rápido (SEGRILLO, 2012).
Tabela 1 – Taxas de Crescimento Econômico Anual da URSS
Fonte: Segrillo, 2012, p. 235.
Esse bom momento da
URSS fez com que muitos acreditassem fielmente na superação do sistema
socialista frente ao capitalismo. Líderes soviéticos, citando caso análogo,
como Nikita Kruschev, acreditava veemente que isso seria possível. Levando em
consideração os crescimentos elevados até então, o socialismo iria superar o
capitalismo em produção em um futuro próximo (HOBSBAWAN, 1995).
Todavia, a partir de
1960 já se percebia o declínio econômico da URSS. Nos anos 1950, o crescimento
estava em torno de 5,7%. Nos anos 1960 se reduziu a 5,2%, caiu para 3,7% nos
anos de 1970, e de 1980 a 1985 chegou ao nível médio de 2% (VERGOA, 2005).
Para Hobsbawan (1995)
o início do desmoronamento político da URSS, começou com a morte de Stalin em
1953, mais precisamente em 1956, no XX Congresso do Partido Comunista da União
Soviética (PCUS). Por motivos de ataques à era stalinista e mais ainda ao
próprio Stalin, por parte da alta cúpula do Partido Comunista.
No XX Congresso do
PCUS, Nikita Kruschev (1953-1964), então Secretário do partido, fez um discurso
onde denunciou as violências, os expurgos e todas as atrocidades cometidas por
Stalin. O objetivo seria uma tentativa de deixar de cultuar a imagem de Stalin
(SEGRILLO, 2012).
Dessa forma, com estas
atitudes, no fim da década de 1950 a China rompe relações com a URSS, pois a
China agora questionava a liderança da URSS no movimento comunista
internacional (HOBSBAWAN, 1995). Tais atitude fizeram com que a China visse a
URSS saindo do revolucionário pensamento Socialista.
Em meio a estas
dificuldades políticas, os efeitos na parte europeia, que era dominada pela
URSS, foram logo sentidos. Na Polônia houve uma mudança para uma liderança
comunista reformista, o que foi aceito pela URSS. E houve uma revolução na
Hungria. Liderada por Imre Nagy, outro comunista reformista, o qual anunciou o
fim do sistema uni-partidarista e tirou a Hungria do Pacto de Varsóvia, o qual
não poderia ser aceito pela URSS. Destarte, em novembro de 1956, a revolução
foi reprimida pelos soviéticos (HOBSBAWAN, 1995).
Também neste mesmo
contexto, a Iugoslávia de Tito, até a Primavera de Praga, optara por
neutralidade, enquanto a Albânia saia da zona de influência da URSS e passaria
para a da China (SEGRILLO, 2012).
Para Hobsbawan, outra desvantagem do
sistema:
[...]e que acabou por afunda-lo, era
sua Inflexibilidade. Estava engendrado para o crescimento constante na produção
de bens cujo caráter e qualidade haviam sido predeterminados, mas não tinha
qualquer mecanismo interno para variar quantidade (a não ser para cima) e
qualidade, nem para inovar (HOBSBAWAN, 1995, p. 375).
O principal problema
era que havia muito excesso da centralização, e que se completava com falta de
estímulo para a criatividade individual, decerto se buscava somente cumprir os
protocolos. Nesse contexto, com Leonid Brezhnev (1964-1982), em 1965, se tem
reformas bem radicais não muito conhecidas, são as Reformas de Kosygin, pois
foram levadas a cabo pelo primeiro ministro Aleksei Kosygin (SEGRILLO, 2012).
Nestas reformas se
tinha como objetivo dar autonomia às empresas para que estas desenvolvessem
novas maneiras de produção mais criativas. Para forçar uma melhor quantidade do
produto vendido, se mediria a quantidade de produto vendido, não a que foi
produzido (antes a preocupação era somente em produzir e estocar), assim teria
que se produzir melhor o produto para que este fosse vendido e não estocado
como uma peça de má qualidade (SEGRILLO, 2012).
Nas palavras de Vengoa:
[…]una reforma administrativa que
otorgaba mayor cobertura de acción e independencia a las empresas, la
disminución de los índices ejecutivos a partir del plan, la reforma de los
precios y la aplicación de nuevos criterios de performance en
la realización de la producción, los cuales contemplaban la introducción
del beneficio en el funcionamiento de la economia soviética
(VENGOA, 2005, p. 168).
O problema encontrado
nesta reforma foi que, como o regime era baseado num poder central forte, muito
burocrático, houve implicações quando condutores locais começavam a querer
implementar ideias que tinham como boas, mas não eram aceitas pelos
planejadores centrais (SEGRILLO, 2012).
Para Hobsbawan
(1995), um dos fatores em relação à administração soviética que se tem que
levar em conta é a questão da burocracia. Já no período de Stalin, se tinha
muitas dificuldades neste sentido, onde este tinha que lutar para “superar o
labirinto burocrático e sua habilidade em esquivar-se da maioria dos controles
e ordens do governo” (LEWIN,1991 p, 17 apud HOBSBAWAN, 1995, p. 374). Para o
autor, depois de Stalin e Kruschev, não havia mais nada que pudesse parar a
estagnação.
Segundo Vengoa
(2005), as magnitudes das relações intra-burocráticas eram tão grandes que não
seria exagero dizer que o partido já não detinha e nem realizava o poder nesta
área. Dessa forma, a reforma, mesmo com seu início eficiente, se esvaia cada
vez mais, até seu fim no início da década de 1970.
Nesse sentido se pode
entender porque em agosto de 1983, com uma resolução oficial, Yuri Andropov
(1982-1984), o sucessor de Brezhnev, tentou reconstruir o poder do partido em
relação às burocracias. Onde o mesmo afirma:
Las asambleas electorales del Partido
obedecen a un escenario establecido de antemano, sin debates serios y francos.
Las profesiones de fe de los candidatos están listas para la publicación; toda
iniciativa o crítica es ahogada. De ahora en adelante, nada de eso será
tolerado (ANDROPOV apud VENGOA, 2005 p. 179).
Entretanto, com a
morte Andropov e com a chegada de Constantin Chernienko (1984-1985) foi uma
tentativa falida de reverter a situação.
Ademais, a estas
questões políticas e da forma de condução da produção da URSS, outro fator que
pôde ter tido um grande peso, foi a corrida armamentista em toda a Guerra Fria
contra os EUA.
Após a primeira
explosão da bomba atômica da URSS em 1949 começou uma corrida tecnológica pelas
armas mais avançadas. Depois deste evento, se levou a cabo as guerras quentes
localizadas na periferia do globo, ou como chamado, o terceiro mundo, apoiadas
pelas duas superpotências. No fim dos anos 1960 fora adotada a Doutrina
Brezhnev, que afirmava que a instabilidade política em um país socialista seria
considerada uma instabilidade política na própria URSS, justificando assim uma
intervenção militar (MEDEIROS, 2011).
O ano de 1979 pode
ser considerado vital para a virada de rumo da Guerra Fria. Dois fatores
importantes, a Revolução Iraniana e a invasão da URSS no Afeganistão, faz com
que os EUA intensifiquem o conflito com os soviéticos (MEDEIROS, 2011). O Irã
agora sairia da zona de influência norte-americana e passaria a aproximar-se da
URSS. Vale ressaltar a crise dos reféns americanos em Teerã. O Oriente Médio na
década seguinte seria uma região instável, com as guerras Irã-Iraque e Guerra
Civil no Líbano. Assim os EUA, tentam intervir na região.
Reagan também usou da
Intervenção da URSS no Afeganistão como forma de desgaste contra o Exército
Vermelho, construindo uma diplomacia juntando os Muçulmanos ao pensamento
Ocidental contra a intervenção. E no seu segundo mandato apoiou aos
guerrilheiros com armamentos. O Afeganistão se transformou no Vietnã Soviético.
Dessa forma, estas políticas custaram bilhões à URSS, enfraquecendo assim sua
economia (MEDEIROS, 2011).
Para Kissinger
(2015), Reagan foi de importância fundamental no fim da Guerra Fria. Pois ele
liderou os EUA numa corrida armamentista em que a URSS não poderia competir,
tomando como base programas parados no congresso, o que veio a ser chamado de
Iniciativa de Defesa Estratégica. Comumente conhecido como o programa das
Guerras nas Estrelas.
Os gastos com
armamentos na URSS aumentavam de ano em ano de 1964 a 1984 em média de 4% a 5%.
O que levou a uma situação insustentável, e em início dos anos 1980, 25% dos
gastos públicos eram relacionados à defesa (VENGOA, 2005).
Em meio a estas
situações, em 1985, chega ao poder Mikhail Gorbachev (1985-1991). Uma jovem
liderança comparada aos seus anteriores. Gorbachev tentou alterar a situação
crítica da URSS com suas reformas muito bem conhecidas, a Perestroika,
Reestruturação, e a Glasnost, Transparência.
Na Perestroika, o
objetivo principal não fugia muito as políticas feitas no período de Brezhnev.
Assim, também a Perestroika tentava dar mais autonomia as empresas estatais no
planejamento central, ajudando assim, na difusão mais rápida de novas
tecnologias e dos padrões de consumo (MEDEIROS, 2011).
Nas palavras de
Gorbachev, as necessidades da Perestroika se davam devido:
O país começou a perder impulso. Os
insucessos econômicos eram mais frequentes, as dificuldades começaram a se
acumular e deteriorar, e os problemas não solucionados multiplicaram-se [...]
formou uma espécie de freio que afetou o desenvolvimento
socioeconômico. E tudo isso aconteceu numa época em que a revolução cientifica
e tecnológica abria novos horizontes para o progresso econômico (GORBACHEV,
1987, p. 17).
E seu objetivo principal era:
A reforma tem como base a ampliação
considerável da independência das empresas e associações, sua transição para o
sistema de total autocomputação, de custos e autofinanciamento e a concessão de
todos os direitos apropriados aos coletivos de trabalho. De agora em diante eles
serão totalmente responsáveis por uma administração eficiente e resultados
finais. Os lucros dos coletivos, ou seja, das unidades de trabalho, serão
diretamente proporcionais à sua eficiência. [...] Liberaremos a administração
central das empresas, e ela poderá concentrar-se nos processos chave para
determinar a estratégia do crescimento econômico [...] A finalidade desta
reforma é garantir [...] a transição de um sistema de direção excessivamente
centralizado e dependente de ordens superiores para um sistema democrático
baseado na combinação de centralismo demográfico e autogestão (GORBACHEV, 1987,
p. 34-35).
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A Glasnost por outro
lado, visava diminuir a censura e a repressão política. Nessa nova conjectura a
opinião pública pôde se politizar, tomando dessa forma, o conhecimento
necessário dos males que atacavam a sociedade, igualmente, tiveram ciência dos
altos níveis de corrupção do partido (VENGOA, 2005).
Seguindo essa linha,
Gorbachev libertou presos políticos, deu liberdade à imprensa, deu liberdade
para eleições no legislativo, além do mais, pela primeira vez, permitiu que
outros partidos políticos concorressem à eleição. O povo aceitou bem a abertura
democrática, mas por outro lado, as reformas para introduzir a economia de
mercado tardaram a surtir efeito. Com isso, houve o aumento de preço,
racionamento, grandes filas, o que gerou uma grande rejeição a Gorbachev (MAX SEITZ, 2016).
Dessa forma, alguns
membros do partido fizeram críticas mais duras as reformas, onde enfatizavam
que as reformas não traziam melhorias econômicas e que estava pondo em risco
todo o sistema, destarte, seria melhor parar com as reformas. Houve uma divisão
de dois grandes grupos, de um lado os mais liberais e de outro os mais
conservadores.
Em 1990 Boris Yeltsin
foi eleito Primeiro Ministro da República Soviética Federada Socialista Russa.
Anunciou resistência à Perestroika, e que a mesma seria combatida popularmente.
Em março de 1991 em referendum, foi dado autonomia às demais repúblicas
(MEDEIROS, 2011).
Em agosto de 1991,
descontentes com todas as reformas de Gorbachev, e os rumos que a URSS seguia,
os linhas duras do partido tentaram forçar um golpe. No dia 19 deste mês, a
polícia da KGB (polícia secreta da URSS) cercou a casa de Gorbachev, enquanto
seu vice, Gennady Yanayev, anunciou seu afastamento decretando assim estado de
emergência (FIM... 1991).
O golpe de Estado, no
entanto, ajudou a acelerar o processo, pois fracassou, e quando Gorbachev volta
ao poder, há um novo herói, Boris Yeltsin, que desde o início organizara os
movimentos de resistência popular. “Foi o começo do fim do comunismo na União
Soviética e, talvez, da própria União Soviética. Hoje uma bandeira russa
tremulava no Kremlim pela primeira vez desde 1917” disse Pedro Bial, em sua
cobertura diretamente do Kremlim, já preludiando o Fim da URSS (FIM... 1991).
Em 8 de dezembro de
1991, a Rússia, a Ucrânia e a Bielo-Rússia, que juntas correspondiam a 70% da
população soviética e por grande parte da riqueza do país, anunciaram a criação
da Comunidade dos Estados Independentes (CEI). Com a aprovação pelo parlamento
russo à adesão à CEI, em 12 de dezembro daquele mesmo ano, seria questão de
tempo, Gorbachev anunciar sua renúncia (FIM... 1991).
Com isso então, se
tem as negociações do fim da URSS. No dia 26 de dezembro de 1991, um dia depois
de Gorbachev renunciar, se dá por extinta a URSS em uma votação por membros do
parlamento soviético.
4.1. DA CAÓTICA RÚSSIA DE YELTSIN À RÚSSIA DE PUTIN
A Rússia perdeu seu
papel de potência. No decorrer dos anos 1990 em meio a esse caos, o país entrou
em dificuldades internas no comando de Boris Yeltsin. A desfragmentação da
URSS, dividindo-se em quinze repúblicas: as do Báltico, Lituânia, Letônia e
Estônia, as eslavas, Ucrânia, Moldávia e Belarus, as do Cáucaso e Ásia Central,
Armênia, Geórgia, Azerbaijão, Turcomenistão, Cazaquistão, Uzbequistão,
Tadjiquistão, Quirquistão e a Rússia. Deixou uma situação bem delicada na
economia da Rússia, destarte, seu PIB e sua produção caiu cerca de 50%, e com
privatizações criminosas, onde o governo era impossibilitado de arrecadar
impostos, gerando assim uma crescente desmoralização russa tanto interna como
externamente (VISENTINI, 2015).
Yeltsin com sua visão
mais ocidental referente à Rússia, busca através de seus economistas
pró-ocidentais uma reforma neoliberal conhecida mais como “terapia de choque”,
que seria a implantação de um capitalismo moderno como houve também no Chile.
Contudo a terapia somente agravou as condições socioeconômicas do País:
hiperinflação, desemprego (que chegou a atingir 25% da população economicamente
ativa), depressão (o PIB chegou a recuar mais de 40%, atingindo em 1992 – 19,2
% de crescimento negativo) (PECEQUILO, 2012).
Toda a administração
de Yeltsin passou por grandes problemas, dessa forma, com a Rússia fraca,
perdeu o apoio do Ocidente e o mesmo tentou isolá-la, apoiando formalmente a
autonomia de países como: Geórgia, Ucrânia, Azerbaijão e Moldávia, que criam o
GUAM em 1997 e a introdução de países antes na zona de influência soviética em
blocos ocidentais como OTAN e UE (PECEQUILO 2012).
Um dos momentos mais
sensíveis de sua administração ocorre com a tentativa de autonomia Chechena.
Desde 1991 a Chechênia busca sua independência, e em 1994 se dá início a Guerra
da Chechênia que dura até 1996. Esta situação fica em aberto para Putin
resolver na segunda guerra em 1999-2000. Com toda essa instabilidade, em
31/12/1999, Yeltsin renuncia em troca de imunidade com relação as acusações
sobre seu governo. Já bem doente e sem força no Governo (VISENTINI, 2015).
Tabela 2 – Crescimento Anual do PIB da Rússia
Fonte: Segrillo, 2012, p. 124.
4.2. DA RÚSSIA DE PUTIN, A RECONSTRUÇÃO DO ESTADO RUSSO
Chega ao poder alguém
que era pouco conhecido no meio político, Vladmir Putin, que era da KGB,
polícia secreta da antiga URSS. Seu cargo político antes fora o de prefeito de
São Petersburgo. Ainda em 1999 foi indicado por Yeltsin para Primeiro Ministro
em agosto. Segundo Visentini (2015), por ele não ser um nome político muito
conhecido, ficou mais fácil sua aceitação em meio aos oligarcas criminosos, que
não o temiam tanto.
Estes oligarcas eram
formados por três grupos: os gerentes das empresas estatais, que com a
privatização em massa, assumiram o controle dos órgãos patrimoniais; os
banqueiros privados, os que serviam de intermediários para os grandes
empréstimos neste período, e os gangsteres, que prosperaram com o colapso do
atual momento. Todos estes tinham como semelhança a dependência dos recursos do
Estado russo e a recusa de fazerem investimentos na Rússia (SIMES, 1999 apud
VENGOA, 2005). Nesse momento a concentração de renda era incrível. Na Rússia
neste período havia 17 bilionários, grande parte, com recursos do setor
enérgico do país.
Ao chegar ao poder,
Putin demostrou dinamismo, força e muita habilidade. Ele conseguiu melhorar a
situação econômica do País. Fez um acordo com os oligarcas, desde que eles não
se metessem na política, ele não se meteria nos negócios destes. Buscou também
apoio da igreja ortodoxa, (VISENTINI, 2015), e procurou nacionalizar as
empresas importantes, como a Gazprom e a deixou nas mãos de Medvedev, aliado de
confiança (PECEQUILO, 2012).
Segundo Pecequilo:
O ano de 1999 pode ser considerado
decisivo na recente história da Rússia, uma vez que rompeu, por meio da chegada
de Putin ao poder, o ciclo de profunda decadência social, política, militar e
econômica do país em meio ao avanço ocidental às fronteiras nacionais e de confrontação
com seus grupos separatistas internos. Apesar das limitações concretas à
projeção de poder russo em seu primeiro mandato 1999 a 2003, Putin inicia sua
ofensiva a partir da reconstrução das bases do poder e orgulho nacionais
(bandeira e hino), amparado por um discurso de autonomia e pragmatismo no campo
externo (PECEQUILO, 2012, p. 118).
Não só a questão
econômica da Rússia estava desequilibrada, todavia, sua população também sofria
muito com toda essa situação, sendo marginalizada e muito abalada com a sua
perda de identidade no cenário doméstico. E coube a Putin, tentar recuperar a
abalada autoestima da sociedade no âmbito interno, com o estabelecimento nas
ruas e nas instituições. Putin além de trazer de volta a bandeira da URSS (sem
o martelo e a foice), trouxe também alguns projetos sociais para beneficiar os
mais pobres (VISENTINI, 2015).
Quando Putin chega ao
poder, tem-se a busca por uma Rússia mais independente, e destarte, tem-se uma
política mais pragmática, em que tem como objetivo a busca de presença nas
áreas de antiga influência soviética, e que vai de desencontro com os
interesses da OTAN e da UE. Nesse sentido, Putin busca mais autonomia, já que
segundo Visentini (2015) a Rússia ainda tenta uma inserção no Ocidente, mas
como este não à aceita, se busca uma autonômia para poder melhor barganhar com
o Ocidente. E no caso da UE, tem o gás, que a mesma é totalmente dependente da
Rússia em seu abastecimento.
A Rússia é uma das
maiores exportadoras de recursos energéticos a nível mundial, por outro lado, a
União Europeia, carece muito deste recurso, principalmente os países do norte e
do centro europeu, sendo assim, a Rússia é a principal e mais importante
fornecedora do recurso à UE (PEREIRA, 2017).
Nos últimos anos a
relações entre a União Europeia e a Rússia têm sido delicadas, por conta das
intervenções russas na Geórgia e na Ucrânia, o que será melhor indagado mais
adiante do trabalho.
A política externa
russa após a chegada de Putin tem três fases: de 1999/2001, 2001/2003 e 2003 em
diante. A primeira fase consiste no citado anteriormente, o ano de transição no
Kremlin, seguida também pela guerra do Kosovo (1999/2000), a primeira onda de
expansão da OTAN, e a segunda guerra da Chechênia (1999/2000). Na questão do
Kosovo, a Rússia mantém seu apoio a Sérvia, indo de desencontro com a primeira
ação conjunta da OTAN e os EUA. A Rússia ainda não reconhece Kosovo como um
Estado independente, após o reconhecimento deste pelos EUA em 2008. A segunda
guerra na Chechênia também fora vista com maus olhos ao Ocidente, até o 11/09
(PECEQUILO, 2012). A segunda fase começa com o 11/09.
Após o atentado,
Putin ligou para Bush filho para prestar apoio à GWT (Guerra Global Contra o
Terrorismo), como uma forma também de legitimar suas ações na Chechênia e
conter o avanço islâmico, assim como buscar um relacionamento com os EUA com um
perfil de grande potência, dando apoio aos EUA para entrada no Afeganistão.
Esta cooperação resultou em um acordo entre Rússia e EUA e um encontro em 2002
de Putin e Bush. Mesmo nesse sentido harmonioso os EUA buscam aumentar sua
presença na Eurásia, nas áreas de antiga influência da URSS acelerando seu
projeto de conquista deste espaço. Neste período também há uma segunda onda de
expansão da OTAN (2002), que fora formalizada na Cúpula de Praga e questão do
projeto do escudo antimísseis. Como a Rússia ainda estava frágil não tinha
chances de tentar reverter esta situação (PECEQUILO, 2012).
Nesse contexto, os
EUA abandonaram o Tradado de Mísseis Antibalísticos de 1972 para poder seguir com
o projeto de escudo antimísseis. Com isso houve um novo acordo diplomático em
2002, colocado pela mídia, mais uma vez, como o fim definitivo da Guerra Fria.
Neste acordo, os EUA buscavam reaproximar a Rússia ao Ocidente, e tentar mudar
sua postura com relação a esta situação, criando assim um conselho consultivo
OTAN-Rússia. Já a Rússia procurava tornar menos densa a crescente agressividade
e militarização dos EUA na região, uma visão bem pragmática de Putin, e uma
forma de ambos ganhar tempo (VISENTINI, 2015).
A terceira fase da
política externa russa começa com a invasão ao Iraque em 2003. Nesta fase a
Rússia da maior prioridade à sua política regional e global. No âmbito regional
a Rússia intensifica suas respostas em relação as políticas americanas na Ásia
central, firmando acordos bi e multilaterais com sua antiga zona de influência,
fechando bases dos EUA na região. A última sendo fechada em 2009 no
Quirguistão.
Neste período também
condenou qualquer intervenção do Ocidente com as acusações de reversão de
práticas autoritárias tida por sua política, onde alegaram facilitações para
aliados chegarem ao poder nas chamadas Revoluções Coloridas, onde candidatos
Pró-ocidentais tiveram apoio na Ucrânia em 2003, assim, chamada laranja, rosa
na Geórgia em 2004 e Tulipa no Quirguistão em 2005 (PECEQUILO, 2012).
Por conta destas
deteriorações das relações russas com estes países, desencadearam-se fortes
repressões russas na Geórgia, e mais recente na Ucrânia. Onde a Rússia tomou
parte de seus territórios, na Geórgia com a guerra na Ossétia do Sul, e na
Ucrânia com a anexação da Criméia.
Com essa nova
reestruturação russa no cenário internacional, começaram a surgir alguns
conflitos de interesses com o Ocidente. Em relação a União Europeia, a questão
chave era a incorporação de países da antiga zona de influência soviética e a
tentativa de incorporação de novas, como no caso da Ucrânia. Também se tem a
movimentação da adesão de novos membros na OTAN desta mesma região. Na parte da
Ásia a Rússia também tenta conter o avanço dos EUA na região, assim foi criada
a OCX, organização de Cooperação para Xangai.
Nesse sentido a
Rússia busca um sistema internacional multipolar (em relação ao unipolar
estadunidense), e não enxerga o sistema como uma possível hegemonia dos EUA.
Justamente porque não teria condições de um conflito de interesses diretamente
com o mesmo, ainda a Rússia se reerguendo, não é mais uma potência como nos
tempos da grande URSS, onde poderia rivalizar diretamente com os EUA
(VISENTINI, 2015).
Mesmo como membro do
Conselho de Segurança da ONU e um arsenal nuclear, é de se reconhecer que hoje
a Rússia é tida nas Relações Internacionais como sendo uma potência de médio
porte com uma possível ascensão no jogo das Relações internacionais. As Guerras
na Geórgia, na Ucrânia e na Síria, depois da reestruturação russa, trazem de
volta o interesse russo em manter sua liderança na região, não aceitando perder
espaço para o Ocidente.
5. DA MOVIMENTAÇÃO RUSSA NO SUL DO
CAÚCASO E UCRÂNIA
5.1. DO SUL DO CÁUCASO
Como visto
anteriormente, o Ocidente tentou conter a Rússia no período pósGuerra Fria, e
buscou incorporar as ex-repúblicas soviéticas em suas zonas de influência, como
as do Cáucaso, ingressando-as na OTAN e, ou na UE. Destarte, quando a Rússia se
reergueu, voltou ao cenário internacional, buscou conservar sua presença nas
áreas de influência da antiga URSS.
No início do século
XXI, a UE em seu processo de alargamento para 10 novos estados, incluiu:
Estônia, Letônia e Lituânia, Polônia, Romênia e a Bulgária. Todas antigas zonas
de influência russa. A UE tem o interesse de aumentar sua presença no Mar Negro
e interesses do desenvolvimento de uma política europeia no Leste, dessa forma,
minando os interesses russo no Mar Negro e Cáucaso (FREIRE, 2008).
A partir de 2003
houve três revoluções eleitorais na região, mais especificamente na Geórgia, a
Revolução das Rosas, na Ucrânia, Revolução Laranja e no Quirguistão, Revolução
das Tulipas. Todos estes movimentos, consistiram na tentativa de contestar os
governos vigentes. Em todos os casos, as derrotas da oposição foram tidas como
fraudulentas durante os processos eleitorais seguidas de manifestações
populares, com o apoio Ocidental (ORTEGA, 2009).
Estas revoluções
tiveram influência direta dos EUA e da UE, e não somente no apoio a ONGs. Os
EUA enviaram representantes do governo para falarem diretamente com os
presidentes então em exercícios, na busca de enfatizarem a importância de
eleições livres. A Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE),
enviou observadores aos três Estados, em que prontamente denunciaram fraudes
(ORTEGA, 2009).
A Rússia em
contrapartida, denunciou as revoluções coloridas como formas de substituir os
presidentes por aliados Ocidentais, em que estes poderiam discutir suas adesões
para entrarem na UE e OTAN (FREIRE, 2008).
Em 2007, na
Conferência de Segurança de Munique, Putin fez duras críticas a situação e
consequências advindas:
De acordo com os documentos fundadores,
na esfera humanitárias OSCE visa assistir países membros na implementação de
normas internacionais de direitos humanos, a pedido destes. […] contudo, isto
não significa interferência nos assuntos internos de outros países, e em
particular a imposição de um regime que determine como estes Estados devem
viver e desenvolver-se. É óbvio que tal interferência não promove de modo algum
o desenvolvimento democrático dos Estados. Pelo contrário, torna-os dependentes
e, como consequência, política e economicamente instáveis (PUTIN, 2007 apud
FREIRE, 2008, p 96).
Dessa forma surgem
novos problemas russos na região. Para Freire (2008), a principal dificuldade
na antiga região de influência russa surge quando se tem as integrações dos
mercados energéticos ao Ocidente, por exemplo a conclusão do oleoduto,
Baku-Tbilisi-Ceyhan, BTC, inaugurado em 2006.
A Geórgia, mesmo não
tendo petróleo é peça chave na geopolítica da região. Esse oleoduto pode levar
o petróleo de Baku, Azerbaijão, região do Mar Cáspio até um porto em Ceyhan,
localizada na Turquia, que passa primeiro por Tbilisi na Geórgia. É o segundo
maior oleoduto do mundo e tem a capacidade de bombear 1,2 milhões de Barris de
petróleo por dia (NICK AMIES, 2008).
A União Europeia é a
principal beneficiadora do oleoduto, e o principal intuito de sua construção
foi o de tornar o Ocidente independente das exportações russas, até porque a
Rússia já ameaçou cortar as exportações ao Ocidente em alguns momentos, tanto
enquanto URSS como agora sendo a República da Rússia (NICK AMIES, 2008).
A Geórgia depois de
sua independência, passou por grandes problemas políticos com o governo
ultranacionalista de Zviad Gamsakhurdia, o qual negava direito às minorias
étnicas. Estas constituíam três repúblicas autônomas: Adjara, Abecásia e a
Ossétia do Sul, esta última, importante à Rússia que ao norte, travava uma
guerra contra a Chechênia. A situação foi estabilizada no governo de Eduard
Shevardnadze (1995-2003), todavia com as revoluções coloridas e Shevardnadze
sendo substituído por Mikhail Saakashvili, surgiram novos problemas, pois ele
endureceu sua posição em relação as repúblicas autônomas (VISENTINI, 2015).
Para Saakashvili a
unificação definitiva do país era prioridade, seu lema de campanha era “Geórgia
Unida”. Em seu discurso proferido em 2004 disse:
Eu gostaria de
enfatizar que nem a Geórgia nem seu presidente vão tolerar a desintegração do
país. Portanto, nós oferecemos negociações imediatas para nossos amigos
abkhazes e ossetas. Nós estamos prontos para discutir qualquer modelo de
Estado, levando em consideração seus interesses, para a promoção de seu futuro
desenvolvimento (ORTEGA, 2009, p.27). O governo passou a ter uma postura mais
dura com relação as repúblicas autônomas e chegou a invadir a Adjara em 2004.
Este também buscou maior parceria com a OTAN e EU (VISENTINI, 2015).
Figura 3 – Mapa Geórgia
Fonte: Indistinct Union, 2018.
Disponível em: . Acesso em: 13 set. 2018.
A Abcásia e a Ossétia
do Sul na época da União Soviética eram regiões autônomas que eram submetidas à
Geórgia naquela época. Com as desestabilizações no início da década de 1990 na
URSS, as regiões entraram em conflitos com as autoridades de Tbilisi ainda
enquanto URSS. Depois do fim da URSS e até 2008, momento da Guerra, haviam missões
internacionais, da ONU e da OCSE, e pacificadores russos na Ossétia do Sul, que
aí estabeleceria bases militares e embaixadas (PILAR BONET, 2018).
A Ossétia do Sul
sempre teve fortes laços com os russos, já no século XIX, os ossétas foram uma
das poucas tribos da zona do Cáucaso que se aliaram ao então império russo
(RODRIGO FERNÁNDEZ, 2008). E é uma região com muitos nacionais russos.
A Guerra na Geórgia,
Guerra da Ossétia do Sul ou Guerra dos 5 Dias, conflito russo-georgiano em
agosto de 2008, começou quando tropas georgianas invadiram de surpresa a
capital Tsequinváli, da Ossétia do Sul, região que de fato era separada da
Geórgia. Com a ajuda russa, que rapidamente tomou conta da situação, as tropas
georgianas foram rapidamente rechaçadas do território, onde a Rússia
rapidamente chegou quase à Capital georgiana Tbilisi (RODRIGO FERNÁNDEZ, 2008).
A Abecásia aproveitou a movimentação e entrou no conflito. Depois do conflito a
Rússia, reconheceu as duas províncias como estados independentes.
A Rússia aproveitou o
conflito para dar sinais de força e influência. O conflito serviu para
demonstrar o desejo russo de reconhecimento no sistema internacional e para
expressão de suas capacidades nesta nova ordem (FREIRE, 2008). Nesse sentido:
Com esta acção militar, Moscovo
pretende travar o alargamento da NATO fazer recuar a presença ocidental na área
da CEI, e deixar um sinal de aviso às antigas repúblicas quanto ao seu poder,
influência e capacidade de acção [...] a Rússia conseguiu com a intervenção na
Geórgia ganhos em diferentes níveis: a nível local, com o enfraquecimento da
república georgiana, uma dupla vitória face a um apoio ocidental que não se
materializou como Tbilissi esperava; [...]regional, com Moscovo a reafirmar-se
na área e a sublinhar o seu envolvimento em matérias de interesse estratégico;
nível internacional, demonstrando que a política de contenção face ao Ocidente
não é mera retórica (FREIRE, 2008, p.53).
Apesar da CEI não ser
um bloco de muita eficiência, e apenas formalmente fazer sentido, é uma forma
de delimitar o espaço ex-soviético que a Rússia tenta preservar. Dessa forma,
mesmo sem que através da CEI, a Rússia não tenha a capacidade de interromper os
desejos de ex-sátelites, como a Geórgia e a Ucrânia de fazerem parte da OTAN ou
UE, Moscou, com a invasão à Geórgia, pretende mostrar sua oposição ao Ocidente
na CEI, e também dar sinais de que tem força e influência e ainda algum peso
ideológico. Dessa forma, a Rússia remarca sua posição de liderança no espaço do
bloco. Agindo assim como uma forma de demarcação da zona de influência russa
(FREIRE, 2008).
Antes de entrar em um
conflito armado, a Rússia buscou tentar manter sua influência na região com
pressões em relações econômicas e de abastecimento de recursos naturais. A
entrada da Geórgia na CEI foi com pressões dessa forma (FREIRE, 2008).
Na primeira década do
Século XXI, a Rússia, Bielorrússia e Cazaquistão começaram uma parceria para
uma união aduaneira, avançando e criando a UEE (União Econômica Eurasiana). A
intenção é que a UEE seja gradualmente integrada pelos membros das antigas
repúblicas soviéticas, reforçando assim a presença da Rússia nesta região
(VISENTINI, 2015). Ainda com um pensamento da manutenção regional de soft
power.
Contundo, mesmo assim
a Geórgia se mantinha firme no desejo de aliar-se ao Ocidente, e após a
intervenção ocidental na Geórgia na Revolução Colorida, restou à Rússia atuar
de outra maneira, com a força. Em 2008, com a invasão à Geórgia, a Rússia se
mostra com uma nova forma de tentar manter seus interesses, e com um pensamento
político baseado na Real Politik, e deixou à amostra para sua antiga zona de
influência e para o Ocidente, de que quer ser ouvida e ter sua área de
interesse respeitada. Dessa forma, a partir de 2008, a Rússia passa a enxergar
o mundo como multipolar, e tendo participação fundamental no cenário
internacional (FREIRE, 2008).
5.2. DAS CRISES NA UCRÂNIA
O Caso da Ucrânia tem
uma dinâmica mais complexa de entender porque além do o ocorrido nas chamadas
Revoluções coloridas a Ucrânia está bem ligada à Rússia, além do mais, tem uma
posição geoestratégica importante à Rússia. O século IX ao XII, russos
bielorrussos e ucranianos eram um só povo, e somente no domínio mongol da
região que os três começaram a se diferenciar, aponta Segrillo (A HISTÓRIA...
2014).
O começo do grande
império russo se tem na Ucrânia, ou como antes chamada, Rus de Kiev, sendo o
Berço histórico russo na Idade Média. O nome Ucrânia, inclusive, significa
fronteira, que tem sua origem na palavra Krajina, onde também
houve disputas territoriais com poloneses, austríacos e turcos (VISENTINE,
2015).
No século XVIII, no
reinado de Catarina a Grande, a Rússia e a Prússia, hoje Alemanha, invadem a
Polônia pela primeira vez e dividem seu território. Nesse mesmo período a
Rússia passa a dominar o que é hoje a Bielorrússia, Moldávia, os Bálticos e
volta a dominar também a Ucrânia (AMAL, 2017).
Com relação a Ucrânia
há uma divisão, ou um “problema histórico” como cita Visentini (2015), em outro
sentido. Uma parte da Ucrânia esteve há muito tempo sob domínio do Império
Austro-húngaro, portanto, protestante e Ocidental, e outra parte católica
ortodoxa.
Se pode notar que a
questão nacional ucraniana nunca foi bem resolvida, pois o país sempre esteve
em disputas, com os cossacos, poloneses, mongóis, turcos e finalmente pela
Rússia de Catarina, a Grande, em que só teve sua independência em 1991 após o
fim da URSS. Antes, em um curto período no entre guerras mundiais. Outra
questão chave é que no país 1/3 da população é russa e 2/3 tem algum parentesco
com russos ou com a cultura russa (AMAL, 2017).
Pode-se inferir que,
dessa forma, a Ucrânia surge meio que por acidente, entre dois mundos, dividida
em meio a Ocidente e Oriente, dois Povos, russos e ucranianos, e em dois tempos
históricos adversos (VISENTINI, 2015).
Outra questão a ser
mencionada é a importância da Ucrânia para a Rússia. Um motivo é que há a
Grande Planície Europeia, que se encontra desde o litoral ocidental da França
até os Montes Urais na Rússia. Todo esse percurso pode ser facilmente
percorrido sem ter que cruzar fronteiras naturais tais como rios, montanhas ou
desertos, facilitando assim a penetração no território russo. Nos últimos 500
anos a Rússia sofreu várias invasões advindas dessa região. Os poloneses em
1605, os suecos em 1707, os franceses de Napoleão em 1812 e os Alemães na
Primeira Guerra Mundial (AMAL, 2017).
Um outro motivo dessa
grande importância é o acesso ao Mar Negro (DIAS, 2015). Os portos da Rússia
nesta região ficam muito tempo congelados. Dessa forma, o Porto de Sebastopol,
na Península da Crimeia tem importância vital para os interesses russos. Única
saída russa com águas quente todo o ano. Sem contar que a península tem uma
posição estratégica para controle do Mar Negro e saída para o Mediterrâneo pelo
estreito de Bósforo (AMAL, 2017).
Figura 4 – Mapa Crimeia
Fonte: Adaptado de Google Maps, 2018.
Disponível em: https://www.google.com.br/maps/@46.807683,34.6703416,6.01z.
acessado em: 14/11/18.
Como já citado acima,
a Ucrânia também passa pelos efeitos das Revoluções Coloridas. Em 2004, depois
de uma eleição acirrada, Viktor Yanukovych ganhou as eleições com margem de 3%
a mais que o seu concorrente Yushchenco (ORTEGA, 2009).
Da mesma forma que o
Ocidente se envolveu no caso da Geórgia, fizera também na Ucrânia. A OCSE
denunciou que houve falsificação de votos, intimidações de eleitores e o
chamado carrossel, onde se transportava eleitores de um lado ao outro para
votarem várias vezes. ONGs ocidentais também se envolveram nos protestos pós
eleição e novas eleições foram feitas, desta vez com a vitória de Yushchenco, com
52% dos votos (ORTEGA, 2009).
Assim como na
Geórgia, a Rússia primeiro seguiu usando a questão enérgica como forma de
pressão na Ucrânia (FREIRE, 2008).
Em 2010, em novas
eleições, desta vez sem que houvesse críticas, volta ao poder Yanukovych. O
então Presidente desistiu e seguiu uma política de aproximação direta com a
Rússia, o que fez com que em novembro de 2013 houvesse manifestações, dessa vez
os protestos eram para pressionar o Presidente a ter uma maior aproximação com
a União Europeia (DIAS, 2015).
Depois de 3 meses de
conflitos, de dezembro de 2013 a fevereiro de 2014, Yanukovych e seus
opositores assinaram um acordo com intermédio da UE, que visava colocar fim no
conflito (DIAS, 2015).
Figura 5 – Divisão política na Ucrânia
Fonte: Amal, 2017. Disponível em:
<https://www.snh2017.anpuh.org/resources/anais/54/1502670667_ARQUIVO_Artigo.Victor.ANPUH.p
df>. Acesso em: 29 out. 2018. . Acesso em: 29 out. 2018.
Tendo as buscas pelo
acordo de paz, a polícia saiu das ruas, mas os manifestantes não. Até então, na
Praça Maidan, local ícone da guerra, já havia morrido mais de 100 pessoas. Com
a invasão dos manifestantes nos prédios do Governo, Yanukovych foi a exilio
para Moscou, temendo sua vida (AMAL, 2017).
Dessa forma, a
percepção russa, assim como na Geórgia, era de que o Ocidente queria promover
reformas em Kiev contrárias aos negócios russos e agenciar a aproximação
ucraniana ao Ocidente, Moscou buscou agir rapidamente para garantir seus
interesses na região (DIAS, 2015). Como no caso do ponto estratégico, o Porto
de Sebastopol. E reverter as dinâmicas da aproximação da Ucrânia ao Ocidente
para tentar consolidar o País na sua esfera de influência. Onde o apoio aos
movimentos separatistas no sul da Ucrânia e a anexação da Crimeia em 18 de
março de 2014 foram os principais pontos da estratégia russa (DIAS, 2015).
A Rússia usou
questões históricas da Crimeia, região que outrora foi da Rússia, e tem uma
grande população russa para intervir no país. Kruschev enquanto Secretário
Geral do PCUS, deu a Crimeia aos ucranianos, pois o mesmo tinha muita afinidade
com a Ucrânia, e muitos inclusive, achavam que ele era ucraniano, (SEGRILLO,
2012). Para Segrillo o referendo em Kiev foi uma forma de os pró-russos se
manifestarem contra os acontecimentos na praça Maidan. Como visto no mapa
anterior, há uma divisão política muito grande na Ucrânia. De um lado os prós
Ocidente, e do outro os prós russos.
Figura 6 – Divisão de falantes ucranianos e russos na
Ucrânia
Fonte: G1, 2014. Disponível em: .
Acesso em: 31 ago. 2018.
O Ocidente reagiu à
anexação com sanções impostas à Rússia, mas sanções estas que não tiveram
efeito, dessa forma, optou-se por uma aceitação de facto da questão. A União Europeia reagiu mais
intensamente que a Otan, pois para os EUA a Ucrânia é um interesse marginal,
dessa forma, os norte-americanos não têm uma estratégia forte no conflito
(DIAS, 2015).
Em 2008 a Rússia, com
a Guerra na Geórgia, se mostra reerguida de suas dificuldades na década
passada, querendo ser aceita pelo Ocidente por um status de potência. Na Ucrânia, se mostra ainda
com uma visão bem realista do cenário internacional, em que a sua segurança é
uma condição sine qua non para sua
sobrevivência, dessa forma, agiu de forma a manter seu interesse a qualquer
custo em ambos os casos citados (DIAS, 2015).
5.3. DA MOVIMENTAÇÂO EM OUTRAS REGIÕES
A Rússia ultimamente
busca manter sua influência nas regiões da Ásia, como por exemplo na Síria,
onde há uma guerra civil com influência de países importantes, como no caso da
Rússia e dos EUA. Os EUA buscam tirar Bashar Al-Assad do poder enquanto a Rússia
tenta manter seu parceiro e aposta buscar mais relevância no cenário
internacional.
Assim como houve as
Revoluções Coloridas acima citadas nas regiões próximo à Rússia, no Oriente
Médio houve a Primavera Árabe, uma série de revoltas em países árabes que trouxeram
ao poder líderes mais próximos do Ocidente, dessa forma, quando a revolução
chega à Síria, a Rússia reage (G1, 2017).
A Síria após 1971 foi
um país aliado da Rússia na região. Além do mais, há uma base russa em seu
território importante aos interesses moscovitas, a base militar de Tartus, que
é a única unidade militar russa no Mar Mediterrâneo. Assim, a Síria é um país
de extrema importância à Rússia no Mediterrâneo (G1, 2017).
Outro motivo a ser
mencionado é que a Rússia tem receio de que aconteça, caso haja uma mudança de
regime na Síria, o mesmo que aconteceu ao Afeganistão, Iraque e Líbia, onde
após as mudanças de governos houve muita instabilidade nos países e o aumento
significativo de terrorismo, o que a Rússia não vê com bons olhos em sua
redondeza. Dessa forma, a Rússia acredita que tem que haver uma mão de ferro
dominando o país (G1, 2017).
Como já dito
anteriormente, a Rússia fez acordo com a Igreja Ortodoxa, quando Putin chegou
ao poder, em troca de apoio ao governo e benefícios à igreja, dessa forma a
Rússia tem o interesse de cuidar dos cristãos ortodoxos do país, que chegam a
10% da população (ELLEN BARRY, 2012).
Mas o principal
motivo da intervenção russa na Síria em 2015 foi a busca por uma inserção maior
no cenário internacional, nesse caso, no Oriente Médio, buscando assim, ser
potência atuante na região. O objetivo central é conter os EUA em seu avanço na
região (DW.COM, 2018).
Ainda no âmbito da
Ásia, Os EUA há algum tempo tentam impor sua hegemonia. E assim a Rússia e
China criaram a OCX, Organização para Cooperação de Xangai. Esta foi formulada
como uma reação a hegemonia americana na região (RIBEIRO, 2015). A OCX mesmo
que em sua carta de criação esteja escrito que seu objetivo não seja rivalizar
com outras organizações seu intuito é conter a presença americana no âmbito da
OTAN (VISENTINI, 2015).
Em sua carta de
criação a organização afirma não querer rivalizar com nem uma organização ou
país, mas a mesma tem tido reações contrarias ao aos EUA e a OTAN, ficando
assim, nítido sua postura antiocidental e americana. Pode-se notar com mais
clareza esta questão, no pedido enviado aos EUA para que os mesmos retirassem
suas bases militares no Uzbequistão em 2005 (VISENTINI, 2015).
A organização tem
como base manter os interesses da Rússia e da China nesta área, para a Rússia é
uma forma de ter mercado para seu gás, e ter o monopólio deste, onde vê na
China um grande negócio, e a China busca a volta da rota da seda, onde por um
trem, faz suas mercadorias chegar facilmente na Europa (VISENTINI, 2015). Assim
esta organização busca por um lado expulsar os EUA, por outro alcançar mercado,
e fixar os interesses da China e Rússia na região.
6. CONSIDERAÇÕES FINAIS
O tema exposto possui
grande importância para as Relações Internacionais. A Rússia é um país de
fundamental importância para o entendimento dos conflitos na região da Eurásia.
Depois de sua instabilidade na década de 1990, com políticas ultraliberais que
se mostraram fracassadas, surge como um país importante no início deste século,
com seu novo ressurgimento na sua região de influência trouxe questões sobre
sua nova posição regional e internacional, sendo assim, relevante aos
estudantes da área.
A Rússia, depois de
sua instabilidade ressurge no século XXI com novos objetivos de política
externa. Depois de tentar ser aceita pelo Ocidente, mas sendo isolada, e já
forte economicamente, comparada à década de 1990, busca seu reconhecimento no
sistema internacional.
Até 2003, a Rússia
vivia uma política de maior aproximação com o Ocidente, em 2001 por exemplo,
prestou apoio aos EUA na Guerra contra o Terrorismo. Buscava ter seus objetivos
no entorno geográfico apenas de forma mais branda, com pressões econômicas por
exemplo. Vendo que não estava sendo suficiente, passou para o uso da força.
A Guerra na Geórgia
serviu para a Rússia mostrar sua força e influência na região e na CEI, assim
como a anexação da Crimeia serviu para mostrar que ainda tem peso ideológico em
suas antigas zonas de influência.
Dessa forma, a Guerra
na Geórgia pode ser entendida como uma forma de mostrar seu desejo de
reconhecimento internacional de suas políticas, pode-se entender como um aviso
de que quer ser ouvida, respeitada, que quer manter sua influência e que tem
poder bélico para isso, ao menos em seu exterior próximo.
Nesse sentido, a
Crise da Ucrânia e a anexação da Crimeia pode ser entendida como uma
continuidade desta forma de pensamento, e também, pode ser avaliada como um
mecanismo de coerção as tentativas da Ucrânia de se aproximar do Ocidente, onde
a Rússia usou de seu peso ideológico e étnico para atingir seus objetivos.
Dessa forma, estas
atitudes podem ser vistas mais como uma reação a penetração Ocidental na antiga
zona de influência russa, Assim, entende-se que a Guerra na Geórgia e a
anexação da Crimeia não podem ser vistas como uma política expansionista, ou um
neocolonialismo, ou uma continuação da Guerra Fria, como muito se tem falado,
mas apenas uma reação a tentativa do Ocidente de isola-la, ou seja, apenas uma
forma de conter o avanço da OTAN e UE, em uma visão realista, o país busca se
manter vivo frente a este isolamento.
O Objetivo do
trabalho foi alcançado, chegando a conclusão de que a hipótese é verdadeira, a
Rússia reagiu aos avanços Ocidentais para manter sua zona de influência como já
foi inferido acima, além do mais, percebeu-se que a Rússia entende que hoje é
uma potência média, mesmo que tenha um arsenal nuclear não é mais a
superpotência de outrora, entende que seus aliados comunistas já não existem
mais, assim, agora está numa nova realidade em que tem que buscar novas formas
de manter seu peso ideológico que ainda restou dos seus períodos de glorias
quando era a URSS. Há então uma busca de novas formas de manter seus objetivos,
como a consolidação de uma potência em um mundo multipolar, nesse sentido
podemos dizer que a OCX e a CEI são meios da Rússia buscar sua reafirmação, sua
influência e seu peso ideológico nesta nova realidade geopolítica.
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